11 maio 2018

o que tu queres sei eu

Quando Marcelo Caetano assumiu o poder, em 1968, o pai de uma amiga minha perguntou-lhe se ia fazer alguma coisa contra a corrupção e os interesses instalados no aparelho do Estado. Ele respondeu que não era louco.

Cinquenta anos mais tarde, Portugal continua a debater-se com problemas graves da corrupção (no texto "A ponta do iceberg", Luís Aguiar-Conraria dá alguns exemplos) que cresce e ganha força ao abrigo de uma estranha bruma onde todas as pistas se perdem (o caso dos submarinos é exemplar: a contraparte alemã já foi descoberta, julgada, condenada, e já cumpriu a pena; por seu lado, a contraparte portuguesa hã? o que foi? havia alguma coisa? "nãããã, deve ser boato para atacar o nosso partido, que o que eles querem sei eu!").

Vivemos, assim, num clima de suspeição sobre tudo e todos que permite largar insinuações  indiscriminadamente, sem haver nunca certezas nem conclusões quer sobre a culpa quer sobre a inocência. Será da ordem natural das coisas, ou será estratégia? É justamente este clima de suspeitas generalizadas sem provas - muitas vezes, sem haver sequer indícios - que permite por um lado desvalorizar a informação disponível, a pretexto de ser manobra dos outros para desacreditar os nossos, e por outro lado desculpar o comportamento menos ético de uns porque, "como é do conhecimento geral, todos fazem o mesmo, e muito pior".
Em suma: um clima de suspeição que envenena as relações sociais e a confiança no sistema político e no Estado de Direito, e destrói qualquer possibilidade de apelar à ética nas escolhas pessoais que afectam a coisa comum.

Recentemente, a acusação de Manuel Pinho ter recebido avenças do GES enquanto era ministro acabou por trazer de novo à baila a questão Sócrates. O PS mudou de discurso, demarcando-se de Sócrates com mais clareza: do "à justiça o que é da justiça e à política o que é da política" passou-se ao "caso a justiça confirme, é uma vergonha para a política". 

É neste contexto que aparece um texto de Fernanda Câncio, "A tragédia de Sócrates", que leva o debate para o plano da ética. Diz algo tão simples como isto: independentemente do que o sistema de justiça venha a apurar, o que já todos sabemos sobre o modo como Sócrates mentiu é de tal ordem que é imperioso que o PS se demarque dele.

Parece a história do ovo de Colombo - simples e óbvio, mas não ocorreu antes a mais ninguém. Ou, pelo menos, não vi mais ninguém escrever antes dela com esta clareza.

A questão que se impõe de seguida é perguntar se é só o Sócrates, ou se a mesma exigência se deve aplicar a todos os políticos: quem tiver comportamento eticamente reprovável, mesmo que não seja comprovadamente ilegal, deve passar a persona non grata no seu partido? E como definir as fronteiras e as exigências éticas acautelando o risco de se abrir uma época de caça selvagem aos políticos?

Perante questões tão incómodas quanto importantes e urgentes, que podem dar origem a uma mudança de paradigma na política portuguesa, o que faz Portugal? Prefere virar-se contra a Fernanda Câncio numa polifonia de "ah, sua rameira, o que tu queres sei eu".
Ah, heróis do mar, nobre povo, nação valente sempre aberta a novos desafios...


17 comentários:

Manuel Rocha disse...


Cara Helena Araújo,
Se este seu texto fosse um exercicio de patinhagem no gelo , dar-lhe-ia 8 em nota artistica e 2 em nota técnica. E porquê ? Porque a HA gesticula com grande elegância fora da pista legância mas não chega a entrar em ringue. Explico-me indo directamente ao ponto sem mais rodriguinhos: será a FC jornalista pessoa a quem se reconheça equidestância minima para debitar sobre JS/PS ? A mesma questão com uma metáfora: seria aceitável ver um juiz a decidir no seu próprio processo de divórcio ? Fosse o caso, e que diria a FC jornalista ?


Cump.

MR

Helena Araújo disse...

Manuel Rocha,
Não me venha com metáforas, dê-me factos: o que há de factualmente errado no texto da Fernanda Câncio? Em que passagens concretas daquele texto identifica a falta de equidistância?
Tanto quanto sei, foi ela a primeira pessoa a pôr na mesa a questão da ética com esta clareza. Para si, esta questão não é importante? Parece-lhe que devia continuar a ser omitida, apenas porque lhe cai mal que seja a Fernanda Câncio a falar disso?

Manuel Rocha disse...

Cara Helena Araujo,

1. Assumindo eu que vexa não terá testemunhado ao vivo a relação FC/ JS, como é que sabe quem mente e quem diz a verdade ? Será pela "linguagem corporal" ? Por moeda ao ar? Por solidariedade de género ?

2. Tota a eventual pertinência do texto da FC assenta numa premissa cuja validade carece de demonstração: a de que um ex pm deve explicações públicas sobre a sua vida privada fora da politica. Mentiu / omitiu em resposta a esses pedidos de esclarecimento ? Não faço ideia. O que penso é que ninguém tem legitimidade para o questionar.

2. Se um prof da escola pública dá explicaçõe privadas a um aluno seu, isso é visto como éticamente reprovável; se uma DG Cultura concede um subsidio a uma assoc a cujos corpos sociais pertence, idem ( ainda há dias demitiu-se uma por isso... ); mas se uma jornalista profissional usa factos da sua vida privada para colocar em xeque no jornal que lhe paga o salário o politico com quem se relacionou, entendemos que não há aqui um módico que seja de incompatibilidade e elogiamos ? Confesso-lhe total estupefacção !

Cump.

MR

Helena Araújo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Helena Araújo disse...

Manuel Rocha, leu o texto da Fernanda Câncio? Ou melhor: de que texto é que está a falar?
Quanto às suas perguntas:
1. O texto que eu mencionei não é sobre as mentiras que Sócrates lhe terá contado só a ela.
2. Afirma mesmo que ninguém tem legitimidade para questionar um ex pm sobre as fontes de financiamento da vida faustosa que está a fazer em Paris? Só se for em Portugal...
Mas, pelos vistos, nem o Sócrates concorda consigo, porque respondeu aos jornalistas que lhe fizeram essa pergunta, em vez de dizer que eles não tinham legitimidade para a fazer.
3. Nesse texto, a jornalista não usa factos da sua vida privada para colocar em xeque o político com o qual se relacionou.

Agradeço que identifique, no texto que se segue, as revelações que são do âmbito privado, e que só a Fernanda Câncio conhecia.
Concretamente: foi ela a única pessoa a perguntar-se com que dinheiro se sustentava em Paris? É que tenho ideia de ter ouvido essa mesma pergunta no Governo Sombra, e não me consta que nenhum daqueles homens durma com o Sócrates.
Também pode ler aqui, se quiser: https://observador.pt/2015/12/19/as-varias-diferentes-versoes-jose-socrates-paris-dinheiro/
Foi apenas o primeiro artigo que encontrei sobre o assunto. Há muitos mais.

"depois de ter sido primeiro-ministro sete anos e estabelecido residência em Paris durante algum tempo, de serem levantadas dúvidas sobre como conseguia sustentar-se e de o próprio assegurar denodada e indignadamente que o fazia graças a um empréstimo bancário e à ajuda da mãe, se soube que afinal as suas despesas eram suportadas por um amigo empresário - e em molhos de notas, à sorrelfa.
Vamos ignorar tudo menos isto: um ex PM que tratava como insulto qualquer pergunta ou dúvida sobre a proveniência dos fundos que lhe permitiam viver desafogadamente; que recusou receber pela sua prestação como comentador na RTP de 2013 a 2014; que ostentou, na saída do governo, a rejeição da subvenção vitalícia a que tinha direito por ser deputado eleito desde 1987 (e que agora está a receber), não teve afinal, desde que abandonou o governo até janeiro de 2013, quando se anunciou consultor da Octapharma, outros meios de subsistência senão o dinheiro do amigo (à generosidade do qual terá continuado a apelar mesmo quando auferia um ordenado de mais de 12 mil euros brutos por mês). Ou seja, fingiu ante toda a gente que tinha fortuna de família, rejeitando até rendimentos a que tinha direito como alguém que deles não necessitava. Urdiu uma teia de enganos. Mentiu, mentiu e tornou a mentir.
Mentiu ao país, ao seu partido, aos correligionários, aos camaradas, aos amigos."

Manuel Rocha disse...

Cara Helena Araujo,

Como é obvio, já escolheu a sua "verdade". Não era nem é minha intenção suscitar esse debate, muito menos discutindo tudo ao mesmo tempo. A minha questão era só uma : saber da sua opinião sobre a legitimidade da FC, jornalista, para debitar sobre o caracter de JS - ex pm e ex namorado. A HA já disse que não vê incomptabilidade alguma. Sinto-me esclarecido. Muito obrigado.

Cump.

MR

Helena Araújo disse...

E por que motivo deveria ficar calada?
Sobretudo num caso tão importante para o país, e quando não se viu mais ninguém a pôr a questão da ética na mesa?

Manuel Rocha disse...

"E por que motivo deveria ficar calada?"

Porque era por demais evidente que iria ser interpretada como uma reacção de ressabiamento, já que era parte interessada em medida que vai muito além da aceitável ao cidadão comum ou até ao eleitor do PS. Tanto assim que estão à vista as reacções publicadas.

"Sobretudo num caso tão importante para o país, e quando não se viu mais ninguém a pôr a questão da ética na mesa?"

Não me parece que isso confira. A questão ética já foi levantada inúmeras vezes por inúmeros opinadores ( Henrique Monteiro ou Daniel Oliverira em inumeros Expressos, António Guerreiro em mais que um Publico...etc, etc).A forma e os argumentos com que o fazem, isso é outro debate.

Manuel Rocha disse...

Mais uma achega e juro que é a última: :)

Diz a HA : " Sobretudo num caso tão importante para o país".

O que é que é importante para o país:
-saber como é que um ex pm gasta o dinheiro que tem e o que lhe emprestaram ?
-ou saber se esse cacau é devido a corrupção dele enquanto PM ?

Para meu uso, escolho a segunda hipotese, pois a primeira interessa-me tanto como as musica pimba . Mas, se é a segunda a que realmente importa, como é que continuamos à procura de um crime para um culpado ? Chegado a este ponto, as minhas prioridades mudam dramaticamente: já nem me importa se o ex pm se deixou corromper ou não; tudo o que me interessa é ver reposto o Estado de Direito e resolvida a deriva de judicialização da politica. Porquê ? Porque normalmente sabe-se como estas coisas começam mas nunca se sabe como acabam. E, amanhã, posso ser ser eu ou a HA, pois os processos kafkianos estão longe de ser apenas uma ficção do FK.

Obrigado pela polémica.

MR

Helena Araújo disse...

- E porque deveria ficar calada?
- Porque era por demais evidente que as reacções seriam "o que tu queres sei eu".
Foi por isso mesmo que escrevi este post. O país não pode ficar refém deste vício do debate. Em algum momento tem de aprender a olhar para o que as pessoas dizem, em vez de fazer insinuações sobre os eventuais motivos da pessoa para dizer o que diz.

O que é importante para o país:
- Ter a certeza que os políticos não andam "lá no poleiro" para fazerem fortuna pessoal à custa dos interesses dos portugueses. Passa também por se perguntar o que haverá de errado no facto de um ex PM contar versões diferentes sobre a origem do dinheiro que gasta para ter um nível de vida que não é habitual em ex PMs. É que em princípio não tem mal nenhum ele gastar dinheiro que herdou, ou pedir emprestado a um amigo. O que é muito estranho é que ele diga que viva de heranças quando anda a pedir emprestado. E fica ainda mais estranho quando o amigo é empresário, e está ligado a empresas sobre as quais recai a suspeita de corrupção.
A propósito: lembro que um presidente alemão foi afastado do cargo a meio do mandato por (1) ter recebido de um amigo banqueiro um empréstimo ligeiramente bonificado para compra de casa e (2) ter tentado pressionar o director de um jornal para ela não publicar sobre essa matéria. Muito antes de a Justiça decidir se ele era culpado ou inocente (e acabou por ser declarado inocente) deixou de ter a confiança dos alemães e teve de ser afastado. Por estas e por outras é que na Alemanha não se ouve que "eles são todos iguais" e "eles andam lá todos a servir-se", e muito menos "ai, e sou só eu? então, e os outros?!"

- A partir das desconfianças suscitadas pela conjugação de nível de vida elevado e mentiras sobre a origem do dinheiro, averiguar se terá havido corrupção. E sim, concordo inteiramente: aí, é fundamental um sistema de Justiça que funcione segundo as regras do Estado de Direito.
(Curiosamente, a Fernanda Câncio escreveu vários anos antes da operação marquês o "J'accuse" sobre o mau funcionamento do sistema de Justiça. Mas, claro, como "o que tu queres sei eu", as pessoas lêem esse texto como mais uma tentativa de encobrimento de Sócrates, que na altura até era PM...)

Manuel Rocha disse...

Por principio, teria de concordar consigo. Num mundo ideal, gostaria imenso que bastasse a minha palavra de que não levo nenhuma bomba nos sapatos para não me obrigarem a descalçar de cada vez que preciso de usar um avião. Ou que insinuassem que estou a soldo de uma petrolifera de cada vez que ouso questionar algum dos dogmas convencionados sobre “alterações climáticas”.Só que, na vida tal qual ela é, as coisas não são assim. De tal forma que existe por todo o lado, nomeadamente nas normas deontológicas dos estatutos de várias profissões, uma série de “incompatibilidades”. E mesmo quando elas não estão plasmadas num código de conduta qualquer, seja na justiça, nas finanças, nas escolas, ou na politica, é de bom tom que eu peça escusa sempre que esteja em causa o exame/ decisão sobre assunto que envolva pessoa/ instituição relativamente à qual possa, ainda que só eventualmente,possa vir a ser levantada a figura do conflito de interesses.
Ora não deixa de ser curioso que a HA aplique na integra este principio à conduta de JS ( “...E fica ainda mais estranho quando o amigo é empresário, e está ligado a empresas sobre as quais recai a suspeita de corrupção”.) ao mesmo tempo que isenta dele FC. Ou seja, a HA defende uma espécie de norma de salvaguarda ( ou principio de precaução ) na conduta de um ex pm ; mas isenta-a dela uma grande reporter de um jornal de referencia. E ,apetece perguntar, mas porquê ?! Porque os jornalistas , e FC em particular, são criaturas com uma objectividade acima de qualquer suspeita e completamente imunes a agendas, mesmo que apenas pessoais ? Qual a razão objectiva que me deveria fazer “olhar para o que as pessoas dizem, em vez de fazer insinuações sobre os eventuais motivos da pessoa para dizer o que diz” quando está em causa um jornalista e recorrer á dúvida metódica quando está em causa um politico ? Dito de outro modo: porque é que a HA não aplica o mesmo principio a JS ?! Confesso que não atinjo.

Cump.

MR

Helena Araújo disse...

Aplico o mesmo princípio aos dois. Sobre o JS, já expliquei quais são os factos que nos levam a suspeitar que ali há alguma coisa menos limpa. Sobre a Fernanda Câncio, estou desde o princípio desta conversa a pedir que me aponte passagens no texto dela que evidenciem que ela está a usar a sua posição no jornal para atingir objectivos pessoais e contrários ao bem público.
Agora, o que o Manuel Rocha quer é impedir à partida que a Fernanda Câncio escreva sobre algo ligado a este tema, sem apresentar factos para provar que ela não consegue escrever com isenção.
Outra coisa, muito importante: há que distinguir os textos da jornalista dos textos de opinião. As exigências não são iguais para uns e para outros. Mas mesmo nos textos de opinião, continuo à espera que me diga em que passagens de que textos é que fica evidente que a Fernanda Câncio não tem distanciamento nem neutralidade em relação àquilo de que está a falar. Mais: quero que me provem de que modo é que os seus textos - e em particular este mais recente - são danosos para o país.

Manuel Rocha disse...


“...De alguém com uma tal ausência de noção do bem e do mal, que instrumentalizou os melhores sentimentos dos seus próximos e dos seus camaradas e fez da mentira forma de vida não se pode esperar vergonha.”

FCâncio, in DN

Em que circunstância acha a HA que é legitimo que um jornalista profissional faça julgamentos ( e profira sentenças ) de carácter deste calibre sem sequer se dar ao incómodo de suscitar o contraditório ? Ah, “é um texto de opinião”, diz a HA. E pergunto eu: mas para escrever opinião é preciso carteira profissional ? Não será a categoria “opinião” um expediente questionável para isentar os jornalistas de fazer aquilo que se espera deles ? É que de jornalistas encartados espero informação, exploração de perspectivas divergentes, olhares inovadores sobre um tópico. Para consumir opinião, leio-a a si.

E é aqui que coloco a questão do bem público que a HA suscita: não faço ideia de como se pode educar uma criança a comer de faca e garfo, quando os pais comem com os pés. Traduzindo: quando o jornalismo se permite fazer julgamentos sumários de carácter com base em informação do foro privado ( “instrumentalizou os melhores sentimentos dos seus próximos”, diz, sem referir quem foi o “proximo” que se sentiu instrumentalizado, de onde é legitimo deduzir que é de si mesma que fala, situação em que forçoso é concluir que devemos tomar por liquido que a sua palavra tem um valor distinto da palavra do seu alvo...), então, não faço ideia do que se possa fazer mais para deseducar o espaço público relativamente a coisinhas tão prosaicas como o direito ao bom nome e à vida privada.

Fico por aqui.
Tenha um excelente fim de semana.

MR

Helena Araújo disse...

Portanto, se percebi bem, quer rever os estatutos do jornalismo e quer acabar com a figura dos jornalistas comentadores. Escolham: ou fazem jornalismo, ou emitem opinião. Ambos, nem pensar. É isso?
Já agora: a regra também abrange os jornalistas que são directores de jornais e escrevem aqueles textos tipo "cartas" ou "editoriais" do director? Quem quer escrever editoriais deve primeiro devolver a carteira de jornalista?
Bem, é uma opinião. Mas duvido que ganhe muitos adeptos.

Como é que passa de “instrumentalizou os melhores sentimentos dos seus próximos” para "está a falar de si mesma"? Não leu os parágrafos anteriores do texto? É que essa frase não é uma revelação, é um mero resumo do que fora afirmado antes:

"E mentiu tanto e tão bem que conseguiu que muita gente séria não só acreditasse nele como o defendesse, em privado e em público, como alguém que consideravam perseguido e alvo de campanhas de notícias falsas, boatos e assassinato de caráter (que, de resto, para ajudar a mentira a ser segura e atingir profundidade, existiram mesmo). Ao fazê-lo, não podia ignorar que estava não só a abusar da boa-fé dessas pessoas como a expô-las ao perigo de, se um dia se descobrisse a verdade, serem consideradas suas cúmplices e alvo do odioso expectável. Não podia ignorar que o partido que liderara, os governos a que presidira, até as políticas e ideias pelas quais pugnara, seriam conspurcados, como por lama tóxica, pela desonra face a tal revelação."

Caso não se tenha dado conta dessa instrumentalização dos melhores sentimentos dos seus próximos, e, dito de um modo geral, de tantas pessoas sérias que acreditaram nele, repare na passagem da entrevista do Herman José, na qual este pergunta "Hoje qual é a sua fonte de rendimento? Como é que sobrevive?" e acrescenta "Faço essas perguntas para dar armas às muitas pessoas que gostam de si e que fazem essas perguntas. Sobre aquela ida para França, especulou-se tudo: está cheio de dinheiro."
E Sócrates responde com a versão que contava na época. Já não eram as heranças do volfrâmio, agora era um empréstimo da CGD. Mas ainda não falava do empréstimo dado pela mãe.
A entrevista, de 2013, está no youtube. Veja-a, e depois venha cá afirmar de novo que Fernanda Câncio está a falar unica e exclusivamente de si própria.

Célia disse...

Senhor Manuel Rocha, uma questão periférica:
"Se um prof da escola pública dá explicaçõe privadas a um aluno seu, isso é visto como éticamente reprovável,,," além da dita ética reprovável é sobretudo crime punível pela lei. Aliás, qualquer professor está proibido de dar explicações a alunos, qualquer que seja o nivel de estudos e mesmo não sendo seus, que frequentem a escola onde leciona.
Seria um exercício de transparência e combate a uma certa corrupção se o estado assim legislasse junto de outros organismos públicos, começando pela própria Assembleia da República.

Manuel Rocha disse...

Cara Helena Araujo,

Já demos a volta completa ao tópico, esgotei os meus argumentos, e estou como comecei: com dúvidas . Dúvidas essas que, recordo, no caso concreto, expressei a propósito da postura ética da jornalista FC, e que os seus argumentos não desfizeram. A sua interpretação do “sentido” das frases da FC é tão valida como a minha, ou outra, pois só o autor sabe com que intenção escolheu aquela e não outra fórmula. Os complementos que me deixa na sua última resposta, em modalidade de “whataboutism”, também não me resolvem nada de essencial. Não é por outros jornalistas fazerem da opinião a sua forma de estar e modo de vida, que isso demonstra ou legitima que deva ser assim, até porque, então, não se perceberia para que precisavam de licenciaturas em jornalismo ou carteiras profissionais. Além de que o “whatabaut”, quando aplicado a outros terrenos, como aqueles para onde nos leva a segunda parte da sua resposta, nos deixa em territórios traiçoeiras. JS, o politico, mentiu – afirma HA. Ò HA, a sério ? Mas qual a originalidade ? Consegue apontar-me um politico que me possa garantir que nunca mentiu ? Portanto, e whatabaut ( lista interminável... ) de politicos activos que mentem com todos os dentes e todos os dias ? E a responsabilidade é só deles ? E whatabaut esta nossa paranóia de que, ao arrepio do que se sabe do comum mortal, os politicos deviam ser santos ? Ao instituirmos esse voyerismo que nos leva a confundir transparência com exibição pública da marca da roupa interior, não estaremos a fazer a cama onde agora nos descobrimos ? E whatabaut essa coisa de os média confundirem a tal ponto interesse publico ( ter noticia, de fonte de direito, se houve crime de corrupção, qual, e quem está acusado ) com interesse do publico ( publicar coisas destas: http://expresso.sapo.pt/sociedade/2018-05-11-PJ-investiga-corrupcao-na--Parque-Escolar) que até se dão à desfaçatez de permitir a um comediante que inquira em directo um ex pm sobre como ganha a vida ? Esteve bem na resposta ? Não esteve ? Ok ! Mas, whatabaut se ele tivesse dado uma resposta que incluisse a f-word, teria estado melhor ou pior ?
Tive muito gosto.
MR

Helena Araújo disse...

Manuel Rocha,
que whataboutism?
Disse que um jornalista não pode ser comentador. Respondi-lhe que há inúmeros jornalistas que são comentadores. Quer mudar as regras, tente. Mas não venha acusar a Fernanda Câncio de fazer algo que não deve quando isso é o que todos fazem e se considera normal e correcto. Sublinho: considera-se normal e correcto.

Quanto à segunda metade da sua resposta: não entendi.