21 março 2015

música




Encostas a face à melancolia e nem sequer 

ouves o rouxinol. Ou é a cotovia? 
Suportas mal o ar, dividido 
entre a fidelidade que deves 

à terra de tua mãe e ao quase branco 

azul onde a ave se perde. 
A música, chamemos-lhe assim, 
foi sempre a tua ferida, mas também 

foi sobre as dunas a exaltação. 

Não ouças o rouxinol. Ou a cotovia. 
É dentro de ti 
que toda a música é ave. 

(Eugénio de Andrade)


Há 30 anos perguntava-me: este poema foi feito por mim, ou fez-me? 


Com o tempo descobri que o quase branco azul onde a ave se perde é em todos os pontos cardeais, e ainda mais branco azul e ave na terra da minha mãe. Dividida entre todos esses lugares onde sou, sendo diferente em cada um deles, mudo de poeta: ó vida de mil faces transbordantes, pudesse eu não ter laços nem limites...

Não posso. Encosto a face à melancolia, e canto-me a música que vem do quase branco azul dentro de mim. 


1 comentário:

jj.amarante disse...

Aahh, le bleu... Afinal o quadro fazia sentido, só lhe faltava um pouco de branco ;))