09 fevereiro 2015

entrevista de Martin Schulz ao diário berlinense Tagesspiegel


Mais uma tradução rapidíssima. O artigo está aqui.




Martin Schulz, Presidente do Parlamento Europeu - FOTO: IMAGO/THILO SCHMÜLGEN

O presidente do Parlamento Europeu: "entendo a posição dos gregos

de  e 
O segundo foco de tensão na Europa é a Grécia. O que é que está em jogo?Penso que o novo governo em Atenas tem de aceitar que uma mudança de governo não significa que um país pode abandonar todos os compromissos realizados até então. Os acordos foram aceites pelo Parlamento grego. Em troca dos pagamentos de auxílio deviam ser feitas reformas. Esta é a base das negociações, à qual o novo governo também está sujeito. Se os gregos respeitarem os seus compromissos, os financiadores respeitarão os seus compromissos de financiamento. Se um dos lados abandonar os compromissos, o outro lado também abandona. E isto é exactamente aquilo que neste momento não faz falta nenhuma à Grécia. Por isso nos estamos todos a esforçar para encontrar uma solução razoável. O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, está em contacto com os financiadores. Também se encontrou consigo. Que impressão deixa nas pessoas?Alexis Tsipras é um homem razoável, com o qual se pode falar. Tem muitas convicções políticas que partilho. Também tem outras com as quais não concordo de modo algum. Mas penso que ele agora tem de sair do papel do político em campanha eleitoral, que quer pôr em prática o seu programa eleitoral custe o que custar, e entrar no papel de primeiro-ministro da Grécia. O governo grego está a fazer esse caminho neste preciso momento. A viagem de Tsipras pelas capitais da Europa mostra que ele procura a cooperação e o compromisso, e não o confronto.  
"Os pequenos pagaram o preço da crise"
Acredita que ele é capaz de resolver este conflito?Tenho simplesmente esperança que o governo de Atenas é capaz de se dar conta de que há na Europa boa vontade para ajudar a Grécia. Reconheceu-se que os pequenos pagaram o preço da crise. E se o governo diz que quer aplicar os impostos adequados aos multimilionários e controlar os que fogem aos impostos, ou seja, fortalecer finalmente a parte das receitas do Estado, então tem toda a Europa consigo. Parecer-me-ia muito positivo que eles se focassem nisso em vez de insistirem num debate ideológico. Isso não ajuda ninguém.  Porque é que só pressionou este governo, e não fez o mesmo com os anteriores?Não tenho nada a condenar-me no que diz respeito a este assunto. Sempre fui muito claro com todos os governos. Fui o primeiro representante europeu a ir a Atenas quando a crise surgiu, fiz um discurso no Parlamento em 2012. Na Alemanha tomei uma posição muito clara a favor do segundo pacote de ajuda à Grécia, e as minhas exigências de uma administração mais eficiente não me criaram apenas amigos em Atenas. Os gregos sentem-se humilhados pela actuação da Troika no seu país. A entrada desse grupo foi um erro?Uma grande maioria no Parlamento Europeu critica o modo como a Troika foi criada. Dizemos: os actos da Troika precisam de mais legitimação democrática. Tem de haver mais transparência, e controle pelo Parlamento Europeu. Muitas das medidas eram inevitáveis, mas naturalmente também foram feitos erros. Para sermos inteiramente justos, temos também de dizer que o governo grego aceitou as medidas da Troika - para depois dizer repetidamente: não fomos nós, foi a Troika.  Que alternativas há para a Troika?Os governos têm de assumir mais os compromissos que realizam com os parceiros da UE. O controle sobre a implementação das medidas pode ser feito de outro modo. O governo nacional pode fazer isso, e enviar os resultados aos parceiros europeus e ao FMI. Mas para já há que garantir que os compromissos vão ser respeitados e os pagamentos de ajuda vão ser realizados. Atenas anunciou que vai apresentar um programa de reformas novo. O que espera dele?Um dos lados da questão, que tem todo o meu apoio, é aumentar as receitas por meio de impostos aos ricos e reduzir as assimetrias sociais. Paralelamente, o governo tem de fazer tudo para atrair investidores ao país. Administração estatal eficiente, menos burocracia. O recuo nas privatização parece-me errado. Isso assusta os investidores, que estão interessados em investir centenas de milhões de euros nesse país. Uma grande parte do programa de 315 mil milhões de euros que está neste momento em preparação em Bruxelas podia também ir para a Grécia, 
para energia solar e eólica, para uma rede de transportes, para a indústria do turismo, para a rede de ferries, entre outros. Tudo isto pode acontecer a curto prazo. O meu conselho ao governo é que aposte nisto. O governo grego pediu um financiamento de transição até Maio, para desenvolver as suas reformas.Isso aconteceria automaticamente se o programa de auxílio fosse prolongado. De algum modo o governo grego caiu num buraco. Durante a campanha eleitoral fizeram promessas que querem cumprir a curto prazo, mas não o podem fazer porque antes de mais querem parar o programa. Têm de sair deste buraco. Para além disso, o governo grego fez propostas que temos de analisar com cuidado. As soluções radicais como um perdão parcial da dívida ou a saída da Grécia do Euro estão fora de causa?Não tenho a certeza, mas tenho esperança de que todas as partes vão continuar a apostar num caminho em conjunto. Tenho toda a compreensão pelos gregos quando dizem: não queremos reduzir ainda mais as reformas e os salários, queremos lutar contra o desemprego juvenil. É preciso criar mais justiça social na Grécia. Só não entendo a necessidade de romper com acordos internacionais que também trouxeram muitas coisas positivas.  

1 comentário:

Júlio de Matos disse...


Reformas. Estou farto desta palavra estéril, deste eufemismo cínico.


"Reformas" não mais é do que um termo conveniente e politicamente corretinho para designar AUSTERIDADE SEM PIEDADE.


Enquanto a narrativa austeritária continuar a usar este substantivo sem o explicitar devidamente, os receptores anti-austeridade sem piedade continuarão a reservar-se o direito de surdez.