12 dezembro 2014

três pianistas

Na segunda metade de Novembro passaram por Berlim três pianistas excepcionais, e trouxeram nos dedos Mozart (Maria João Pires), Schumann (Martha Argerich) e água (Hélène Grimaud).

Schumann veio também nos dedos da Maria João Pires: um "Pássaro como Profeta" (10'56'' no vídeo) que deixou a sala a levitar.




Para o concerto com o Riccardo Chailly e a Martha Argerich só me ocorre uma exclamação: Ah, os italianos! Bem sei que é uma incorrecção, mas o concerto foi tão intenso e emotivo que "ah! os italianos!" é para mim a única síntese possível. Além disso, toda a gente sabe que os argentinos pensam que são italianos, e se a Martha Argerich for uma argentina dessas, eu tenho todo o gosto em dar-lhe razão para a ver feliz, para agradecer os tantos que ela fez muito felizes com a sua arte.
A Gabriela Montero falou sobre este concerto no seu mural do facebook, e deixo aqui falar quem sabe:

I have just heard Martha play Schumann's Piano Concerto with the incredible Berlin Philharmonic Orchestra. From the very beginning, I could not contain my tears. If Martha in her youth was a force of nature - a torrent of sensuality and fearlessness - Martha in her older years permits herself to show human vulnerability and total honesty. She plays with a sincerity and tenderness that disarms me every time. I will never forget sitting in the audience a few years ago in Lugano, listening to her play Kinderszenen. I began sobbing uncontrollably and had to walk out. She was speaking to me through sound of her love for her children, of her generosity, of her regrets, of time passing, of aging, of youth, of innocence. It was too much for me. Today, I felt the same. A woman in her later years who has lived through everything, who has tamed her nature, understood it, made peace with it. Martha Argerich: In my opinion, the greatest pianist alive. Thank you, Martha, for all you have given us selflessly.

Acrescento apenas o olhar de atenção e ternura quase maternal da Martha Argerich para a orquestra, a tendência para dar ao maestro uma ajudinha na direcção, a constipação que a obrigou a assoar-se entre dois andamentos, o modo quase tímido como aceitava os aplausos, e depois, porque o público não a deixava sair da sala, o gesto decidido com que atirou o lenço de papel para cima das cordas do piano, se atirou para o banco e nos ofereceu um encore. "Vamos a isto, pessoal!" Tão humana, tão nossa, a Martha Argerich!

E no fim a Hélène Grimaud. A etérea, com um programa "water music": Wasserklavier de Berio, Jeux d’eau de Ravel, Les jeux d’eau à la Villa d’Este de Liszt, La cathédrale engloutie de Debussy, e uma sublime sonata nº2 de Brahms.
Água, a Hélène Grimaud, sozinha com o seu piano no meio do palco enorme quase às escuras. A cara dela também na penumbra, a sala inteira entregue à sua música tranquila e imensa.


Eu entregue à sua música tranquila e imensa. Sem procurar o seu rosto delicado e belo, sem pensar comentários para a indumentária.
A música.


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