Passámos uma semana sem filhos nem Fox na casa do Minho, e foi estranho. Aquela casa guarda os ritmos e os ecos de vinte anos de férias em família, e durante uma semana tudo nela nos lembrava as ausências, como se a vida não estivesse a bater certo.
Durante três semanas trabalhei em Lisboa, e pernoitei na casa de amigos. Perjantei também muitas vezes, porque estava demasiado cansada para organizar saídas nocturnas. Telefonava, pedia uma sopinha, davam-me jantares deliciosos no jardim de árvores frondosas. De manhã, encontrávamo-nos os três na sala, cada um entregue ao seu vício solitário. Entre o écran e o café, comentávamos brevemente as novidades e as descobertas, e depois cada um voltava ao seu mundo. Heimat ist da, wo man sich nicht erklären muss.
Emprestei a casa de férias a uma amiga, que mandou um sms a dizer "Os meus filhos estão histéricos, pensam que estão num palácio. Eu estou pior." Passaram pela casa como Jesus por Maria: nem se notou. Mas deixaram uma banda de música, "esperamos que a partir de agora não mais te sintas longe da tua querida filarmónica". Tenho o Simon Rattle mais laroca de todo o Minho.
Das conversas com tantos e tão bons amigos já nem lembro o que foi dito - sobrou um coração cheio de sorrisos carinhosos, gargalhadas e partilhas plenas de confiança.
Vi finalmente a Elisabete Matos entregue ao "vício da arte". O Paulo Ferreira prometeu que vem a Berlim cantar-me as árias do Calaf, e nem sei se acredite, mas vou falar com o otorrino para me pôr passadeiras vermelhas nos ouvidos. O Matthias, quando soube desta conversa, enterrou a cabeça nas mãos e disse "Oh, mãe..." - quando ele diz "Oh, mãe..." assim, sinto-me uma catraia traquina, e desato a rir.
Descobri uma música que me encantou (ouçam aqui, yesterdays), mostrei-a ao Matthias. Ele aprovou, e mostrou-me as suas descobertas musicais dessas férias. Anda uma mãe a criar um filho - e é para isto mesmo, é também para isto.
A meio deste verão regressei a Berlim e tomei um longo pequeno-almoço com a Christina. Entre macchiatos fomos desatando a pouco e pouco os nós que a estorvavam. Ela saiu a correr para o autocarro, ia tão leve que quase voava. Eu segui para a minha mercearia de turcos favorita, e tinham beldroegas. Beldroegas em Berlim!
Voltei para casa pelo caminho do lago, o meu peito em surda agitação: esta é a minha vida, e gosto tanto de estar assim nela!
4 comentários:
Olá Helena.
Sou uma daquelas leitoras assíduas, mas silenciosa. No entanto, hoje, tenho q quebrar este silencio. Beldroegas? Em Berlim? Onde? E eram mesmo beldroegas como aquelas que nascem nos campos portugueses sem serem semeadas ou são "Portulacas"?
Obrigada pela informação e beijinhos
Sofia
Sofia,
não sei o que são portulacas. As que comprei têm o caule um bocado mais comprido que as que costumam crescer no meu campo em Portugal, mas as folhas têm a mesma forma.
Comprei no turco da Wilmersdorfer Strasse, entre o metro Bismarckstrasse e a Schillerstrasse.
Mas acredito que as haja em quase todas as lojas de turcos.
Enganei-me no nome. É portulak e são "primas" das beldroegas, mas com folhas mais largas e duras que as nossas, e com uma espécie de "pelo" branco na folha. Essas encontro aqui de vez em quando nos stands de legumes dos mercados semanais. Só costumava ir ao turco para comprar azeitonas e coentros, mas agora vou estar mais atenta :)
Aha, ainda há dois dias comi uma sopa de beldroegas colhidas na minha horta, que se eu as deixo elas crescem no meio dos tomateiros, das alfaces, dos morangos...
Muito boa, a sopinha (não fui eu quem a fez).
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