05 março 2014

Szymon Goldberg







Em trio, com Hindemith e Feuermann:




Por estes dias, e até 16 de Março, há uma exposição no foyer da Filarmonia sobre o violinista Szymon Goldberg. "Sobre quem?..." foi a minha primeira reacção. Imaginei que, para lhe fazerem uma exposição, seria um violinista ainda mais extraordinário que os outros - e descobri que é bem mais que isso.

Um músico extraordinário, sem dúvida: na inauguração, ao ouvir num gramofone a Sicilienne de Maria Theresa von Paradis (a primeira peça desta série de vídeos), fiquei rendida: como é possível pôr tanta intensidade em frases assim contidas e elegantes?

A par da homenagem ao músico, a exposição é um marco importante no árduo trabalho de confronto com o passado da orquestra, iniciado há alguns anos. Furtwängler não conseguiu proteger os seus músicos judeus, e os Filarmónicos seguiram em frente sem eles. O maestro ficou furioso com a debandada provocada pelos nazis, porque "precisava daqueles músicos para bem servir a música". Ainda se zangou com o Goebbels e abandonou a orquestra, mas acabaria por voltar, para continuar a servir a música ao serviço dos nazis. Os músicos judeus foram esquecidos, e o nome de Szymon Goldberg só recentemente voltou a aparecer no contexto da Filarmonia de Berlim, após quase oitenta anos de silêncio.

Szymon Goldberg era um judeu polaco, nascido em 1909, de tal modo dotado para o violino que aos nove anos veio para Berlim para fazer carreira como violinista. Aos quinze anos já tinha conquistado os melhores palcos, e aos vinte foi convidado por Wilhelm Furtwängler para concertino dos Filarmónicos de Berlim. Em 1934, quando os nazis proibiram os músicos judeus, fugiu precipitadamente para Inglaterra. Conseguiu escapar aos nazis na Alemanha em 1934, mas em 1942 foi apanhado pelos japoneses durante uma tournée na Indonésia. Ficou preso em Java até 1945. Curiosamente, muitos anos mais tarde viria a casar com uma japonesa, indo viver para o país da sua mulher, onde morreria aos 84 anos.

A exposição mostra alguns documentos que hoje nos parecem chocantes e incompreensíveis. Por exemplo, a carta escrita em 1964, na qual o director da orquestra recusa a reincorporação do antigo concertino, pedida em 1955, apesar da recomendação da Agência de Restituição. Pagaram-lhe os anos de salários não recebidos por andar a fugir aos nazis, e foi tudo. O que se terá passado nos bastidores? Porque é que Karajan não se interessou por ele, ao contrário de Furtwängler?
E como é que um músico destes reage a tamanha afronta? Szymon Goldberg só voltou a tocar em Berlim uma única vez, acompanhado ao piano por Ashkenasi. Diz-se que, quando tinha de atravessar a Alemanha de comboio, fechava as cortinas do seu compartimento.


5 comentários:

Paulo disse...

(coração) Philharmonie.

Helena Araújo disse...

:)
Mas olha que aquela vez andaram mal.
O Szymon Goldberg até era capaz de perdoar (pois se casou com uma japonesa e foi viver para o Japão!) mas magoaram-no tanto que ele atravessava a Alemanha de cortinas corridas.

O que é bonito, lá isso é, é terem a coragem e a decência de mostrar no foyer da Filarmonia documentos históricos que os envergonham.

Paulo disse...

"O que é bonito, lá isso é, é terem a coragem e a decência de mostrar no foyer da Filarmonia documentos históricos que os envergonham."

É por isso mesmo.

Gi disse...

Tendes toda a razão.

Vi outro dia, no canal Mezzo, um documentário sobre a Filarmonia e os seus músicos judeus, naqueles anos.

Helena Araújo disse...

Foi este, Gi?

A Orquestra do Reich:
http://www.digitalconcerthall.com/en/concert/108