06 dezembro 2013

não sei como é que o Natal faz para chegar cada vez mais cedo

Ontem, ao chegar a casa depois de um concerto, vimos os sapatos dos filhos da vizinha cheios de chocolates, e só então me lembrei, sobressaltada, que hoje era Nikolaus. Como é possível?! Ando desde Setembro a pensar que tenho de comprar Pais-Natal de chocolate para não deixar ficar mal o Nikolaus, e não compro, "que disparate, com tanta antecedência!" - para afinal às onze da noite do dia 5 de Dezembro descobrir que o Natal está outra vez a chegar prematuro. O Matthias riu-se, e fez de conta que não me via a vasculhar a casa toda em busca de presentes possíveis. Esta manhã até me agradeceu ter partilhado com eles os chocolates que estavam bem guardados para o meu Inverno, e riu-se de novo quando descobriu que lhe tinha posto no sapato uma laranja encarquilhada (infelizmente ontem, sem me lembrar, comi as tangerinas todas). Depois a Christina entrou na casa da vizinha, viu a sua coroa de Advento, as suas decorações de Natal feitas de pequenos apontamentos discretos aqui e ali, e elogiou-a imenso. Combinámos que a vizinha pode adoptar os meus filhos no Natal, para eles serem felizes, e que pode mandar os dela para minha casa, para eles finalmente verem a sorte que têm. Eu deixo ir os meus (que remédio...) e de bom grado acolho ferozmente os dela, para lhes abrir os olhinhos.
Por estes dias, a casa da vizinha fica assim (esta é a coroa do ano passado - a deste ano é ainda mais bonita):




A Christina insistiu: que a única pista de Natal que cá temos é o calendário de Advento de chocolate que os miúdos me deram, além de dois bonequinhos amorosos que foram presente de aniversário e ainda estão dentro da caixa de plástico. Como gosto de dar alegrias aos meus filhos, abri logo a caixa e pendurei os bonequinhos bem à vista, numa máscara que a Christina trouxe da Bolívia para oferecer ao pai. Aqui:



A Christina gritou horrorizada: "Matthias, anda ver a decoração de Natal que a mãe fez!"
Desataram os dois a rir. Bem sei que a vizinha talicoisa, mas cá em casa a gente ri-se muito.

Quando os miúdos eram pequeninos, eu fazia tudo isso com muito esmero. Tinha um calendário de Advento que era uma longa fita de estrelas (em cartão canelado amarelo, os calos que arranjei a cortar todas aquelas estrelas em cartão canelado!) e um anjinho amoroso em lã não fiada, que todos os dias descia uma estrela até que finalmente, na noite de Natal, tocava a terra: a nossa mesa. Decorava o corrimão das escadas com luzes e bonequinhos. Fazia com os miúdos centros de mesa com ramos de abeto e anjinhos de lã, inventávamos presépios variados, espalhávamos pela casa laranjas e tangerinas decoradas com cravinhos. Tínhamos a coroa de Advento na nossa mesa de jantar, e acendíamos todas as noites as velas correspondentes à semana. Antes de se deitarem lia-lhes pequenas histórias dos calendários especiais de Advento. Uns dias antes do Natal íamos à floresta buscar um abeto fresquinho, que decorávamos com bolas de vidro transparente e passarinhos de Praga. A casa enchia-se de um maravilhoso aroma de resina e velas de cera.
Tudo.






Mas os miúdos cresceram: eles não acreditam em Nikolaus nem em Meninos Jesus, e eu comecei a perder a energia para criar essa atmosfera mágica. Ou então, provavelmente, estou a reservá-la para quando vierem os netos. Ainda guardo o calendário com o anjinho, as bolas de vidro e os passarinhos checos, os suportes para as velas do abeto. Sei que um ano destes voltaremos a ter Natais desses antigos, cheios de um mistério especial. Dou comigo a sonhar com o futuro como um passado revisto e melhorado, e é assim que uma pessoa se põe velha: um dia destes descubro que não é apenas o Natal que chega cada vez mais cedo, é a minha própria vida que aconteceu com muita pressa.


13 comentários:

Mãe disse...

Primeiro deixo um sorriso para a conclusão.
Depois um desabafo, não estou a dar conta do recado das festividades este ano, no meu tempo era o dia de Natal e depois um bolo no dia dos reis. Ja era muito bom, sempre fui uma criança simples. Este ano, decidi festejar tudo e tem sido uma trabalheira, primeiro com o Thanksgiving, agora o dia de São Nicolau. Felizmete vivo em Franca e aqui festeja-se hoje, ainda vou a tempo dos chocolates (porque é que calha a dias diferentes, que falta de organização é esta?). E o que são os passaros de Praga ?
Um ponto a meu favor : A arvore de Natal ja ca canta ! :)

Carla R. disse...

O comentario ali em cima é meu.

Helena Araújo disse...

:)
Pergunto-me onde ia eu buscar a força para todos aqueles rituais de Natal, e sobretudo onde ia eu buscar a calma...
Os "pássaros de Praga" são passarinhos em vidro, com a cauda feita de plumas, uma especialidade checa. Mas também se fazem na Alemanha.
http://pics.ricardostatic.ch/2_721358768_450/weihnachten/paar-glasvoegel-christbaumschmuck-e399.jpg

Helena Araújo disse...

Não me digas que não tens passarinhos de Praga na tua árvore de Natal?! De todas as famílias, a tua é aquela que tem mesmo de ter passarinhos de Praga na sua árvore de Natal!
(A verdade é que combinam muito mal com o outro tipo de quinquilharia que se põe na árvore. Por isso é que nós optamos pelos passarinhos, bolas de vidro transparente, e velas. Um ou dois objectos de recordação importante de uma viagem, e mainada.)

Rita Maria disse...

Eu também gostava imenso de voltar a ter tradições natalécias, a vida é mais rica com essas coisas bonitas todas. Mas essa máscara podia perfeitamente entrar para as tradições familiares, é fantástica!

Rita Maria disse...

(eu também nunca tinha visto um passarinho de Praga e eu morei lá, snif)

Helena Araújo disse...

Para mim, o Natal é especial quando há crianças por perto. Sem elas, tudo isso me parece um pouco deslocado.
Quanto à máscara: pois, se calhar tens razão. Mas por enquanto, não a associo nada ao Natal, e por isso me rio sempre que levanto os olhos para ela e dou com os bonequinhos amorosos pendurados nos cornos daquele diabo.

Helena Araújo disse...

Ah, os passarinhos: eu descobri-os em Weimar, a minha sogra contou depois que eram uma tradição da infância dela, e no mercado de Erfurt fiquei a saber que os melhores e de mais fama vêm da república checa. Em Praga vi-os à venda em muitos sítios.

Carla R. disse...

Pois, então se são de vidro, vamos esquecer por agora. Tudo o que era quebravel, ja se partiu. Para dizer a verdade, até o que não era quebravel.
Quem é que me mandou ter filhos ?
Da proxima vez que for a Praga, a ver se descubro passaros de ferro, ou coisa que o valha.

Teresa disse...

Fujo deliberadamente aos dois últimos parágrafos. Eu continuo teimosamente a enfeitar a casa de Natal (foi ontem, mantenho-me fiel ao dia 8 para fazer as decorações, a ver se fotografo a árvore enquanto ainda está bonita Agri não começa a sentir inapelavelmente o seu fascínio).

«Combinámos que a vizinha pode adoptar os meus filhos no Natal, para eles serem felizes, e que pode mandar os dela para minha casa, para eles finalmente verem a sorte que têm.» - alguma vez te disse que adoro o teu self-deprecating humour?

«Bem sei que a vizinha talicoisa, mas cá em casa a gente ri-se muito.» - idem.

Helena Araújo disse...

Teresa,
:)

snowgaze disse...

Muito honestamente, acho essa ideia de mandar os filhos "a casa da vizinha" (e vice versa) muito boa. Aliás, sou praticante. Ficam todos com outra perspectiva da vida, toda a gente fica a ganhar.

A máscara que a tua filha trouxe é lindíssima!

Helena Araújo disse...

Até eu fico com uma perspectiva diferente...
Quando era pequenina, ia muito brincar com uma amiga que morava na casa ao lado. A mãe dela passava a vida a dizer-lhe que eu era amorosa e muito bem educada, e que ela devia ser como eu. Coitada da miúda!

A máscara é muito bonita, é, e a minha filha é louca: trouxe esta coisa enorme como bagagem de mão, numa viagem de avião em que trazia também tudo o que levou e mais o que lá comprou durante um ano inteiro!