29 novembro 2012

então o Crato veio a Berlim aprender umas coisas sobre Educação, e esqueceu-se de perguntar o essencial?

Passo a vida a repetir isto, até pareço obsessiva:

- Na Alemanha, os abonos de família andam pelos 180 euros por mês, por criança, até esta acabar a sua formação (pode bem ser aos 25 anos). A partir do terceiro filho, o abono é maior.
- As escolas são gratuitas até ao fim do secundário. Apesar dos imensos cortes que têm sido feitos (sim, aqui também andam a poupar), tentam assegurar que o ensino seja realmente gratuito; por isso, as escolas emprestam os livros escolares aos alunos. No princípio do ano somos informados sobre qual o plafond máximo de custos escolares que as famílias têm de pagar (anda pelos 60 euros, para cadernos de exercícios, fotocópias, etc.). A escola não pode dar aos alunos uma lista de materiais para aquisição que exceda este plafond.
- As escolas privadas são comparticipadas pelo Estado, que em troca impõe algumas condições, e têm geralmente um preço muito acessível (nós pagávamos 70 euros mensais).
- Na altura em que a Alemanha teve de cortar drasticamente nas despesas do Estado porque não estava a cumprir o acordo do euro, fez cortes em praticamente todas as áreas, mas não cortou (até aumentou, em certos casos) a investigação e o ensino. A nível do ensino deu particular atenção aos filhos das famílias mais pobres, para que a nova geração consiga, por meio da educação, quebrar o ciclo de pobreza.

A ideia é simples, e não passa de mero economicismo: o nosso futuro depende dos nossos filhos. É preciso apoiar as famílias, e dar-lhes todos os meios para que criem uma geração de pessoas capazes de tirar o maior partido das suas capacidades. Não somos tão ricos que nos possamos dar ao luxo de ter pobres, nomeadamente pessoas que ficaram aquém do que poderiam oferecer à sociedade, por não terem tido acesso à formação melhor e mais adequada às suas potencialidades.

16 comentários:

sem-se-ver disse...

deprimi.

Carlos disse...

Helena, isto parece tão óbvio, que eu só me pergunto quão burros têm de ser os nossos governantes para não o perceberem -- e, claro, agirem em conformidade.

Interessada disse...

Será que os nossos governantes ainda têm capacidade para aprender?
É que não basta ser-se inteligente.

Carla R. disse...

Tens razão em ser obsessiva, água mole em pedra dura...
Esta falta de visão política (não falemos da visão humana, que parece estar infelizmente completamente démodé...) enerva qualquer um.
Helena a primeira ministra, já !

Izzie disse...

Vocês não têm aí um ministro da educação a mais que nos cedam? Fazia-nos muita faltinha um que pensasse assim.

Lucy disse...

também deprimi

Helena Araújo disse...

Gente,
não deprimam. Eu falo destas coisas para sublinhar que a Europa tem de ser toda assim. Não é possível termos uma Europa unida quando uma questão tão básica como esta não é aceite por todos os países de igual forma. Ando há que tempos a repetir que as políticas de austeridade não podem implicar a passagem de determinadas fronteiras, e esta é uma delas.
Se falo da Alemanha, é só para vincar que os alemães seriam os primeiros a compreender que não se pode exigir isto ao povo (e ao futuro) português.

Interessada,
pois é, não basta ser inteligente, também convinha frequentar a universidade... (Ó Relvas, vai...)
;-)

Carla,
parece-me que esse lugar já está ocupado pelo Fox, que simplesmente ignora a voz do dono (alemão).

Izzie,
para estas coisas, nem é preciso importar um ministro. Basta umas colheradas de bom senso... (é como diz o Carlos Azevedo)

Luísa disse...

Cara Helena,

é com interesse que a leio e que lhe sugiro que veja, no site da arte.tv, os documentários sobre a pobreza, nomeadamente "La fabrique de pauvres", que mostra, entre outras, a situação da Alemanha, infelizmente bem diferente daquela que descreve.
Luísa Rossi

Helena Araújo disse...

Luísa,
infelizmente esse vídeo não está disponível. O que é que eles mostram, que é contrário ao que eu disse (abono de família de 180 euros por criança, preocupação acrescida do Estado em quebrar o ciclo de pobreza e permitir que as crianças tenham acesso à Educação)?

Dirão talvez que na Alemanha há muitos pobres, e que a pobreza vai sendo passada de geração em geração? Não o nego, mas lembro que a pobreza é sempre uma questão relativa (o nível de vida destes pobres não é muito inferior ao de uma certa franja da classe média em Portugal), e repito que essa questão é uma preocupação central do Estado.
Já disse, em posts anteriores, qual é o quadro de apoio do Hartz IV para os mais pobres dos alemães.

Luísa disse...

Helena,

não lhe enviei um comentário para a contradizer mas para partilhar um dos documentários que fez parte de uma série que apreciei muitíssimo.


Como é referido no documentário para se ser catalogado de pobre, num país de ricos, não é necessário ter-se apenas de que sobreviver. Nesse caso significa ser desfavorecido em diversos domínios como: alojamento, saúde, educação, cultura, etc. Significa não ter o mesmo espaço na sociedade que os outros. Embora o sentido de pobreza não seja o mesmo, nos países ricos a pobreza é mais estigmatizante e a maioria das vitimas são crianças.
Continuando com o que é dito em “ La fabrique de pauvres”, a pobreza expandiu-se, nos últimos anos, mais depressa do que na Alemanha em apenas dois países: Roménia e Bulgária. As medidas politicas tiveram, na Alemanha, um forte impacto neste desenvolvimento. Apesar do “milagre” do emprego, desregulamentou-se o mundo do trabalho que é, em grande proporção considerado precário. Para os mais desfavorecidos as despesas aumentaram e as ajudas diminuíram enquanto os mais ricos beneficiaram da redução de impostos. Perguntam porque é que o país mais rico da Europa tolera a pobreza infantil de 2,9 milhões de crianças.
A Helena fala na lei de Hartz IV, saiba que ignoro tanta coisa que a primeira vez que ouvi falar nela foi, precisamente neste documentário, definida como compromissos degradantes. Apontavam ainda um monstro burocrático para definir um programa de educação e sobre, entre outros, a falta de um salário mínimo na Alemanha questionavam se a economia mais forte da europa não poderia instaurar um sistema de prestações sociais de base.
Consigo aceder ao documentário através de http://videos.arte.tv/fr/videos/la-fabrique-de-pauvres--7075488.html e confesso-lhe que me detive, agora, no caso particular da Alemanha apenas para lhe poder responder não por o conhecer especialmente bem, aliás não sou especialista em coisa alguma. Estes documentários interessam-me sobretudo para uma compreensão mais abrangente da sociedade global.
Aproveito para lhe dizer que é a primeira vez que faço um comentário num blogue e que descubro que esta é, mesmo na simples necessidade de transmitir o visionamento de um documentário, uma forma de aprendizagem bastante interessante.

Unknown disse...

Olá Helena,

Sobre a pobreza na Alemanha, viu o programa do Günther Jauch de 11 de Novembro (não sei se ainda lá está o vídeo no site, mas informação escrita está de certeza)?
A Hannelore Kraft no discurso que fez em Münster (está no Youtube) refere-se tb. a um recente relatório sobre a pobreza e critica muito a actual política. Ok, sendo do SPD e falando num encontro partidário com certeza que não iria dizer que está tudo muito bem. Mas até que ponto está mal?
Também tenho visto vários telefilmes alemães com argumentos onde são criticadas as condições de vida de parte da população.
Há grande descontentamento contra este governo ou não? Por outras palavras, é provável que o Steinbrück ganhe ou o contrário?

Isto são muitas perguntas:)), mas já agora, o que significaria uma vitória do SPD para os países do Sul? Conheço o teor do tal documento de 30 páginas que ele publicou, mas não exactamente as ideias dele quanto a esta questão.

Helena Araújo disse...

Luisa,
de que falamos quando falamos de pobreza? E quanto é que se pode exigir ao Estado Social?
O sistema Hartz IV dá aos mais pobres o seguinte: alojamento digno e respectivas despesas, inclusivamente aquecimento (conheci de perto um caso de uma família de 4 pessoas que tinha direito a um apartamento de 90 metros quadrados), saúde (o mesmo seguro de saúde que eu tenho, e que é bastante bom), e mais uns 360 euros por mês para cada adulto (não sei como é com crianças, mas sei que têm esse abono de família, pelo menos). Os portadores de cartão Hartz IV têm descontos de uns 50% nos museus e nas exposições. A educação é uma questão indiscutível, e justamente na altura em que o Estado estava a cortar nas despesas foi criado um programa para oferecer aos filhos dos mais pobres aquilo a que os outros têm acesso (explicações, aulas de música, etc.). Depois deram-se conta que o programa era demasiado complicado e as famílias não estavam a recorrer a ele - penso que entretanto têm tentado melhorar. E tem mais uns detalhes, tais como electrodomésticos, estadias de várias semanas em estâncias balneares ou termais para curar depressões (por exemplo), etc. Claro que as crianças têm todo o material escolar pago, as viagens de estudo, etc.

Sim, é verdade que há cada vez mais pobres, e cada vez mais ricos. Fala-se muito disso por cá, e é uma tendência criticada.
Mas o nível mínimo que o Estado assegura aos mais pobres, apesar de ter baixado com as reformas do Schroeder, ainda é bastante razoável. Só para ter uma ideia: uma vez ouvi uma dessas mães queixar-se que o dinheiro que recebia não chegava para comprar roupa de marca, e que isso era muito importante para os filhos não se sentirem excluídos na escola. Não julgo essa mulher - mas este exemplo serve bem para mostrar qual é o nível de necessidade dos pobres alemães. Lá está: de que falamos, quando falamos de pobreza? Essas 2,9 milhões de crianças não estão a dormir em casebres e a desmaiar de fome na escola.
Mais: a agência estatal de emprego tem instruções para dar tratamento prioritário a desempregados sem filhos, porque é fundamental que as crianças cresçam numa família cujo ritmo é estruturado pelo trabalho de pelo menos um dos pais. Há infelizmente muitos casos de miséria, mais que pobreza, em que os pais, desempregados de longa duração, entram em depressão ou em situações de desleixo, e não dão aos filhos uma vida organizada como eles precisam.

Quanto ao salário mínimo: é verdade que aqui não existe. Mas já ouvi patrões dizerem "abaixo de determinado nível salarial, não arranjamos ninguém para trabalhar - o Estado é o nosso maior concorrente..."

Helena Araújo disse...

Maria B,
tantas perguntas, e eu sem saber responder a nenhuma...
Não vi o programa do Jauch, nem vou ter tempo de ver nos próximos dias.
Bem sei que aqui não temos o paraíso (aliás: seria conveniente avisar os portugueses que querem vir para cá que aqui não é o paraíso, e que a vida pode ser muito difícil para pessoas que falam alemão, quanto mais para as que não o falam), mas a maior parte das pessoas tem a garantia de não cair abaixo de um determinado nível de vida. E - o que era o ponto central do meu post - o Estado tem um cuidado particular com os filhos dos pobres e a Educação.
Sobre o recente relatório da pobreza, ouvi na rádio dizerem que as contas estão mal feitas, e as conclusões alarmistas não correspondem à realidade. Não sei mais que isso.
Não me parece que o descontentamento contra este governo seja assim tão grande. Mas hoje o parlamento aprovou com larga maioria a ajuda suplementar à Grécia, e sondagens revelaram que a população não concorda com isso. Ora, se a SPD tenciona ajudar ainda mais, para conseguir ganhar as eleições vai ter de fazer aqui muito trabalho de sensibilização e reeducação do povo.
E não acredito muito nessas coisas. Olho para o Hollande, que tanta esperança suscitou, e não vejo grandes mudanças na gestão desta crise.

Unknown disse...

Helena,
Já tinha percebido que esta questão da ajuda não é popular junto do eleitorado. Por isso tenho curiosidade sobre o que os partidos vão dizer na campanha eleitoral sobre este tema, especialmente se a situação se agravar na Grécia e/ou em Espanha.

Helena Araújo disse...

Maria,
agora que fala nisso, começo a acreditar que a crise do euro não vai ser tema. O SPD não deve ganhar muitos votos com uma postura de "é preciso ajudar esses países de forma integrada, dar-lhes condições para reestruturar a economia, etc." (imagino um partido português a tentar ganhar votos no continente dizendo que era preciso ter compreensão com os problemas da Madeira e ajudá-los ainda mais...)
E a Merkel está numa posição muito difícil, porque às vezes parece ser a mais esquerdista do seu próprio partido. O apoio suplementar à Grécia aprovado ontem no Parlamento custa uns 40 mil milhões de euros extra à Alemanha. Dá 500 euros a cada alemão. E é apenas um pacote entre outros.
(Mas tenho de investigar isto melhor: custa, se a Grécia não pagar? Ou custa isso, mesmo que a Grécia pague? E alguém acredita que a Grécia alguma vez vai pagar? Ou seja: ainda vai sobrar para os contribuintes alemães? Se isto for tema de campanha eleitoral, provavelmente vai acabar por deslocar votos para a extrema direita nacionalista.)

Unknown disse...

Helena,
Espero que não aconteça (um aumento de votos na extrema-direita).
Pelo que tenho lido, penso que o SPD vai insistir particularmente na regulamentação/reestruturação do sector financeiro, limitação dos bonus para directores, combate à especulação com bens alimentares, etc.
O documento publicado pelo P.Steinbrück chama-se "Vertrauen zurückgewinnen: Ein neuer Anlauf zur Bändigung der Finanzmärkte" e aparece logo quando se põe o nome no google. Quando tiver tempo, dê uma olhadela, para ver o que é que acha.
Bom fim de noite e bom começo de semana.