Ora aqui está alguém que sabe, e que nos vem dizer que afinal há alternativa. Afinal, não é preciso apertar ainda mais o garrotilho aos pobres, não é preciso manter a classe média no caminho que leva da depressão ao desespero, não é preciso continuar a matar a economia portuguesa.
Portanto: se isto não tem dúvida, e se é simples e claro como a água, porque é que o governo português não muda o rumo?
O filme só dura 13 minutos, e tem tudo muito bem explicadinho, com mensagem e destinatários e tudo. É só o Passos Coelho e o Gaspar assinarem em baixo, meterem a cartinha no envelope, irem entregar em mão própria, pronto. E se lhes falta dinheiro, podem ficar a dormir na minha casa, que fica a escassos 10 km da Chancelaria, e tem bons acessos com transportes públicos - não seja por isso!
E até os ajudo, transcrevendo parte do que foi dito na entrevista (porque já percebi que eles são um bocado preguiçosos: preferem que o trabalhinho seja feito por mulheres em Berlim - e até nem se importam que não saia tão bem feito como o povo português exige, porque o que realmente interessa é poderem desculpar-se com um "ai, a culpa não é minha, foi ela que fez assim!..."):
Tem a palavra Maria João Rodrigues, conselheira da Comissão Europeia:
O novo consenso que se está a desenhar (...) consiste em dizer que países como Portugal têm de fazer o esforço de redução do défice e da dívida mas têm ao mesmo tempo que crescer, investir e criar emprego, porque isso é vital, é a razão última de tudo isto, mas também porque sem crescimento é muito difícil reduzir a dívida e o défice.
(...)
Portugal tem de estar muito atento à forma como o quadro europeu está a evoluir. Realmente há ano e meio havia um enfoque quase exclusivo na questão da redução do défice e da dívida, mas entretanto as coisas mudaram, porque há um balanço do que está a acontecer no terreno, porque há uma composição diferente do Conselho Europeu, e hoje o discurso oficial da União Europeia frisa bem que é necessário fazer as duas coisas ao mesmo tempo.
(...)
Este programa proposto pela troika devia ser realinhado com este novo quadro europeu.
(...)
Há uma vertente negativa que, a meu ver, não é suficientemente conhecida do lado europeu, e que seria importante levar a conhecer, porque, a certa altura, há o risco da vertente negativa se tornar mais importante que a vertente de resultados positivos que estão a ser obtidos. (...) Não há nenhum problema em dizermos que estamos a fazer um esforço real, estamos a obter alguns resultados positivos, mas também há resultados negativos em relação aos quais o Conselho Europeu tem de estar atento, e tem que ponderar qual é o equilíbrio devido entre a parte negativa e a parte positiva.
(...)
De acordo com a minha experiência, se Portugal intervier no Conselho Europeu com um discurso que é este: (...) como há um risco de o impacto negativo superar os resultados positivos, nós vamos propor aqui um certo ajustamento do programa, e que a meu ver neste momento é relativamente claro. O objectivo central para Portugal é, evidentemente, voltar a crescer, criar emprego. De facto é necessário reduzir o défice e sobretudo a dívida pública, porque têm um nível muito elevado e são uma grande restrição sobre a nossa possibilidade de crescer. Mas, actualmente, nós não conseguimos fazer as duas coisas, crescer e reduzir o défice e a dívida, com estes custos de financiamento. Portanto, há aqui um terceiro pólo da equação muito importante - que é o central, a meu ver -, que é conseguir chegar a custos e condições de financiamento normais.
(...)
Antes de discutir tempo, nós temos de discutir, à cabeça, condições de financiamento: taxa de juro, os chamados colaterais, portanto as condições a que o país acede para financiar o Estado e as empresas. Se conseguir condições melhores, vai poder pagar a sua dívida com encargos menores para o orçamento do Estado, e vai também facilitar o acesso ao crédito por parte das empresas.
(...)
Com uma boa argumentação, e tirando partido dos instrumentos que se estão a desenvolver (porque nós temos neste momento uma transição do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira para um mecanismo permanente de estabilidade financeira, que vai ter outros instrumentos; temos o horizonte de num certo momento poder recorrer aos novos instrumentos do Banco Central Europeu, que foram anunciados durante o Verão; temos também no horizonte a construção do que se chama uma união bancária, que deveria normalizar a circulação do capital disponível na Europa). Portugal tem de jogar com toda essa paleta de instrumentos. Mas também lhe devo dizer que para propor uma estratégia deste tipo - melhores condições de financiamento - o segundo aspecto seria apresentar em cima da mesa uma boa carteira de projectos de investimento, porque - atenção! - o Banco Europeu de Investimentos tem neste momento um reforço da sua capacidade de financiamento, e está à procura de projectos. Eu própria tenho sido contactada, perguntando o que é que Portugal está em condições de apresentar como projectos de investimento de futuro, de qualidade. E de certeza que há essa capacidade na sociedade portuguesa, há empresários com provas dadas.
(...)
O país enquanto país tem de apresentar essa boa carteira de projectos porque a margem financeira está lá para ser aplicada.
Depois, o terceiro ponto, é discutir metas credíveis para redução do défice e da dívida. A meu ver, não faz sentido definir o objectivo em termos de défice nominal, o que nós temos de ter é medidas credíveis de redução do peso da dívida, mas com um horizonte que seja sustentável a prazo e, acima de tudo, que não liquide capacidade em Portugal. (...) Nós temos que reformar uma série de coisas em Portugal, mas uma coisa é reformar, outra coisa é destruir capacidade de empresas que são viáveis, de empregos que são viáveis, de qualificação de pessoas que estão disponíveis para trabalhar... Essa liquidação de capacidade não pode ser feita, e é essa linha de separação que temos de apresentar como argumento central aos nossos parceiros europeus. (...)
- E essa lista de parceiros inclui a Alemanha?
(...) Temos de apresentar uma estratégia clara - e a meu ver são estes três pontos: condições de financiamento, carteira de projectos e consolidação orçamental com metas mais credíveis -, e depois: a quem é que nós apresentamos isso? Bom, devo dizer que o nível troika não é um nível relevante. A troika é uma equipa operacional que obedece a instruções de um outro nível. E é com esse outro nível que o país tem de entrar em interlocução. É o nível da decisão política. Ainda agora vimos no caso da Grécia: a troika que está a operar na Grécia teve instruções políticas para encontrar outro tipo de soluções que há um ano e meio eram impensáveis. Portanto: é com esse nível que temos de falar. (...) Estou a falar dos presidentes das instituições europeias, Comissão Europeia, Conselho Europeu, grupo Euro (o sr. Juncker), mas estou também evidentemente a falar do governo alemão, à cabeça, porque, em termos informais, o governo alemão - se bem que não esteja presente no cargo destes presidentes que acabei de referir - tem pessoas chave no sistema que condiciona a solução para Portugal. O director do actual Fundo Europeu de Estabilidade Financeira é alemão, há alemães nos pontos chave de decisão de apoio ao Ecofin, dentro da Comissão Europeia; dentro da Comissão Europeia há um canal quase estanque de instrução às equipas troika que é altamente influenciado informalmente pelo governo alemão. Portanto: a execução com o governo alemão é a chave. E acho que a percepção do governo alemão também está a evoluir. Claro que muito condicionada agora pela política interna alemã, porque vamos ter eleições em Setembro, e se há objectivo central que a senhora Merkel tem é obviamente ser reeleita, mas, apesar dessa condicionante, ela também já percebeu que tem de chegar lá não com desastres nestes países que estão a ser intervencionados, mas com resultados positivos à vista. (...)
Portanto: Portugal tem de fazer política europeia. Portugal, se quer resolver o seu problema, tem de fazer um esforço interno de adaptação para um modo de crescimento que resulte mais, mas também tem de ter política europeia activa, fazer coligações. Hoje há, no Conselho Europeu, um jogo de alianças completamente diferente. (...) Portugal tem tido uma opção que tem sido sobretudo alinhar a posição portuguesa com a posição deste governo alemão. Mas atenção: o jogo envolvente está a mudar. Na própria Alemanha, em primeiro lugar. Mesmo que a senhora Merkel ganhe eleições, é muito provável que a composição do futuro governo alemão seja bastante diferente, e vá integrar partidos que estão muito mais atentos a uma solução equilibrada para a crise; em segundo lugar, porque hoje temos no Conselho Europeu uma grande coligação, em que temos o senhor Monti, da Itália, o presidente Hollande, o próprio presidente Rajoy, num alinhamento de forças que torna mais difícil à senhora Merkel marcar todo o jogo. Ela tem muita força política, porque tem por trás a força económica e financeira da Alemanha, mas está mais isolada do que estava antes. Embora eu lhe deva dizer que o objectivo não é propriamente isolá-la, porque a solução para a Europa vai exigir sempre o envolvimento da Alemanha. (...) Há alemães que dizem "nós compreendemos que não podemos ter sucesso construído em cima do desastre dos outros. Não é do nosso interesse. É do nosso interesse que os outros também possam ter sucesso". Este é o discurso para a intelligentsia alemã que funciona, e que pode ser ouvido, e que nós temos de levar lá.
1 comentário:
Por acaso tive oportunidade de ver ontem em direto a intervenção dela. Acho que tem toda a razão. Resta saber se estes governantes sabem fazer política europeia...
Mas faltava não só fazerem essa pressão na Europa como também chamar as grandes fortunas particulares, as empresas mais ricas e as instituições bancárias a contribuirem num momento de emergência nacional, aliviando a classe média-baixa e os mais pobres.
E nem precisava de ser um "imposto Bill Gates", aliás esse Bill Gates deve ser um comunista, onde já se viu pedir aos mais ricos para darem 50% das fortunas?! :)
No entanto a mim parece-me óbvio que este governo, tendo conseguido a revisão para 4,5% de objetivo para 2013, está a contar com uma posterior revisão do objetivo de 2,5% para 2014, pois sabe perfeitamente que baixar de 4,5% (se conseguirmos atingir esse valor, o que não é seguro) em 2013 para 2,5% em 2014 é fantasioso. Penso que a estratégia deles é "one step at a time".
P.S.: Ela é da área do P.S., foi ministra de António Guterres. Que pena não ter aconselhado Sócrates quando foi a negociação do memorando da troika, depois desse governo do P.S. ter levado os cofres públicos ao esgotamento com endividamento descontrolado...
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