31 agosto 2012

o passeio dos alegres (6)


Infelizmente esta vida não é só passeio, e na segunda-feira a minha vida real começou a atropelar-me um bocadinho, pelo que mandei os miúdos sozinhos para a cidade, e combinei encontrar-me com eles à hora do almoço na estação de comboios da Friedrichstraße. Foram ver as lojas que os interessavam, foram corridos de uma delas - pelo que me contaram, admito que talvez houvesse aqui algumas aprendizagens a fazer de parte a parte: aprender a estar numa loja sem fazer muito barulho, uns, aprender a ter um pouco de paciência e tolerância com miúdos de outras culturas, que ainda por cima entraram nessa loja com vontade de comprar presentes para as respectivas mães, os outros. Enfim: saíram da loja antipática e foram passear na Dussmann, mas não se perderam (nem na loja de vários andares, nem na caixa - ah, valentes!).




Depois do almoço (que nem às paredes confesso em que consistiu, e foi comido nos degraus em frente ao "palácio das lágrimas", o pavilhão onde as pessoas se despediam daqueles que iam sair para sempre da RDA) precisávamos de ir a uma casa de banho. Lembrei-me que logo a seguir a Unter den Linden tem umas bem boas na área de exposições do Automobil Forum. Para lá fomos, descemos ao piso inferior, procurámos as casas de banho, e à saída deparámos com uma exposição que nos prendeu por mais de uma hora. Ars Electronica: sobre impulsos, movimentos e desvios.

O que primeiro nos chamou a atenção foi um tapete de metal com trinta metros de comprimento, sob o qual deslizava uma placa com a forma de um cilindro cortado pelo meio. Desatámos a experimentar: de pé ou deitados no tapete, a placa passava sob nós como uma espécie de massagem.


FLOOR from cantoni-crescenti on Vimeo.

Logo a seguir descobrimos os CabBoots, sapatos que nos levam pelo caminho certo, quer queiramos quer não...



E muito mais. Um concerto feito só com ruídos produzidos com peças de um automóvel:



Skates telecomandados pelo público, que punha o inventor dos skates a fazer figura de desenhos animados:



O animador da exposição enviou-nos para uma sala relativamente escondida, e explicou que nos levava de volta ao deslumbramento da infância. Não nos mentiu. No silêncio da sala escura os segundos esticavam-se intensos, calmos e lentos. Saímos encantados (e cheios de ideias para fazer o mesmo em casa).



Antes de sairmos da exposição, tivemos ainda direito a uma partida de futebol. Alemanha contra Portugal, uma dos nossos à baliza. Jogo complicadíssimo, em que uma extraordinária sucessão de acontecimentos, em estilo dominó mas muito mais criativo, accionava finalmente o jogador que tentava marcar o golo. Ganhou Portugal!

À saída, os rapazes fizeram um pequeno desvio para os lados de um Bugatti, ou lá o que seria aquela carruagem dourada exposta na esquina Unter den Linden / Friedrichstrasse. As raparigas (nós) espreitavam do lado de fora da montra, e riam-se.



Era o dia do consumismo-só-com-os-olhinhos. Passámos pelas galerias Lafayette, vimos a fachada com o jardim vertical do Patrick Blanc (já tinham visto um semelhante na Dussmann),




vimos a coluna de vidro no interior, e as Delikatessen francesas na cave. Fomos pelo túnel das Lafayette à Quartier 216, o centro comercial dos super-ricos, e daí até ao café à volta da escultura de crushed cars do John Chamberlain.





Claro que nos sentámos naqueles belos sofás (e que apetecíveis estavam!) e claro que fizemos as fotografias da praxe, até o empregado começar a olhar para nós pelo canto do olho.

Mostrei-lhes ainda o Gendarmenmarkt,


e a Fassbender & Rausch Chocolatiers (mas fiquei de olho neles, não fosse alguém lembrar-se de desatar a lamber as esculturas de chocolate) (e de olho em mim, claro, que aquilo é uma tentação) e depois fomos a uma loja que não posso dizer qual é, porque por estes dias este blogue tem estado sujeito a censura. Talvez conte na segunda-feira - disseram-me que daqui a uns dias já me deixam revelar certos segredos.



Como habitualmente estávamos muito atrasados para o ponto seguinte do programa: a visita à cúpula do Reichstag. Mas ainda deu para atravessar o memorial do Holocausto, e para falar de um novo conceito para este tipo de monumentos: em vez de esculturas patéticas que nos dizem à partida qual é a reacção que se espera de nós, algo neutro que marca o momento histórico sem o representar, antes lançando as pessoas à procura dos ecos que acontecem dentro de si.





Vimos ainda os edifícios ao lado do Reichstag, a cantina dos assistentes dos deputados, a escultura de dois famosos alemães, a "praia" junto ao rio.






Depois do Reichstag fomos a casa jantar, para voltar de novo à cidade. Ufa ufa ufa. Tínhamos dois programas a acontecer simultaneamente: o tango em frente ao Bode Museum, e o concerto de música de inspiração balcânica no teatro de madeira mesmo ao lado. Só pelo anfiteatro já vale a pena ir lá, porque é uma alegre piscadela de olhos ao teatro de Shakespeare. Os berlinenses, uns brincalhões...


Cinco das miúdas queriam ficar no tango. Fui com os restantes ao concerto, e o grupo "?SHMALTZ!" agarrou-nos desde o primeiro segundo. Só visto, só visto. Mas podem ouvir um pouco aqui: audio.
No fim os rapazes fizeram uma fotografia com a acordeonista (era tão cheia de graça, e tocava com tal sensualidade, que até a mim apetecia fazer uma fotografia com ela) e perguntaram quando é que o grupo vai a Portugal. "Quando nos convidarem", respondeu ela com um sorriso aberto, e nós dissemos que sim, que vamos tratar disso. Caso este post esteja a ser lido por alguém do CCB, ou de uma organização de festas da rua, ou do que quiserem: vão por nós, o grupo é mesmo bom e muito especial em palco, podem convidá-los à confiança.







Fomos ter com as miúdas que estavam no tango, em frente ao rio. Continuavam felizes, e sem a mínima vontade de ir embora. Sentámo-nos por ali a observar o estilo de cada par, as mulheres vestidas para matar, os homens no engate que se esperava deles. Todo um mundo, fascinante e divertido.



Voltámos para casa, plenos de música e sorrisos, extenuados.


4 comentários:

Gi disse...

Helena, estou a adorar estes posts, e a anotar ideias para a minha próxima visita a Berlim. "Só" preciso escolher entre tantas coisas apetitosas.
Ai ai.

Helena Araújo disse...

Espera, Gi, ainda não acabei os relatos!
Vens por um mês, certo? ;-)

Gi disse...

Um mês? Quem me dera! :-)

Carla R. disse...

A ver se encontro a minha agenda, evitando o final do crédito no meu cartão, e marco logo esta viagem.