21 junho 2011

a superioridade musical dos portugueses

Ontem o meu coro ensaiou Luci Care Luci Belle, uma peça de Mozart. Esta (mas não assim, claro, não pensem que):



Trata de um mal de amor, como de costume, que é provavelmente o problema que mais contributos tem dado ao espólio artístico mundial.

Estava eu a cantar, e a achar que o Mozart não percebia nada do assunto. Devia ser muito novo, sei lá, havia de ter uns doze anos e estar a compor sobre um tema que terá lido numa revista. Pois admite-se lá que alguém que está a morrer de amor o cante numa modinha destas?

Mal de amor, o que se chama mal de amor, é assim:

os meus olhos são dois peixes
navegam numa lagoa
choram lágrimas de sangue
por uma certa pessoa

E isto cantado com uma melodia bem recheada de trilos e apogiaturas, ora vamos lá remexer na ferida como deve ser. E a duas vozes com um simples intervalo de terceira, o brutamontinhos da composição (o brutamontão é o intervalo de quinta contínuo), com a primeira voz a erguer-se estridente, bárbara. Para que não haja dúvidas que está a doer mesmo muito.

De onde se prova que Mozart, aí pelos seus doze anos, calculo eu, ainda tinha de aprender muito com os portugueses. Mas não: por causa daquela mania que eles tinham de não sair da Europa central, não chegou a contactar com a nossa cultura, perdendo assim uma oportunidade única de enriquecimento que teria com certeza projectado a música barroca para o limiar da modernidade.

11 comentários:

Paulo disse...

Aí está uma cantiga que havemos de ensaiar. Aprendi-a há quase trinta anos e não a canto há mais de vinte, à falta de com quem.
Já não devo é chegar aos agudos com a mesma facilidade.

Helena Araújo disse...

Havemos, pois!
Tens a partitura?
Só nos falta arranjar uma sopraninho simpática. Estarás a pensar na mesma que eu?

jj.amarante disse...

É por isso que eles nos emprestam tanto dinheiro, para depois falirmos e termos que emigrar para a terra desses europeus centrais, para lhes levarmos notícias do que se passa fora da terra deles.

Helena Araújo disse...

Boa malha, jj.amarante!
:-)

Anónimo disse...

Por uma certa pessoa....

Linda cantiga. Também a canto com amigos do coro, depois dos concertos, aí é cantar até doer...

Já agora, sobre a partitura quem me a pode dar.

Obrigada
Maria

Helena Araújo disse...

Olá Maria,
está-se a referir à partitura do Luci Care?

Anónimo disse...

Olá Helena

Deixe-me dizer-lhe que foi a primeira vez que comentei, apesar de vir aqui, obrigatoriamente, todos os dias, assim como ao amor&outros desastres, e cada vez que cá venho fico, como hei-de dizer, reconfortada...

Quanto à partitura era à outra, mas também aceito essa. Música é comigo e à capella ainda melhor.

Bj
Maria

Helena Araújo disse...

Maria,
:-)
Olhe, não tenho nenhuma das partituras. A "os meus olhos são dois peixes" é pura tradição oral, do tempo em que fazia parte de um grupo de folclore (quantas vidas haverá na minha vida?)
E a Luci Care só me vão dar depois das férias.
Beijinho,
Helena

Gi disse...

Quer-se dizer então que a Itália, por onde o jovem Mozart passeou, fica na Europa central...
Pois fica, dirás tu, com toda a razão, já que não há nada mais periférico na Europa do que Portugal, nem sequer a Noruega.

Helena Araújo disse...

Quer-se dizer... a Grécia...
(espero que o jovem Mozart nunca tenha ido à Grécia)

Gi disse...

A Grécia tem várias fronteiras e num instante chega a Itália. Portugal está entalado entre a enormidade da Espanha e a enormidade do mar.