Hoje havia várias crianças barulhentas na missa. Incomodam um bocado, reconheço, mas: fazer o quê? Se as quiserem fora da igreja, a elas e aos pais, a idade média dos participantes eleva-se aí para uns 87.
No momento em que as pessoas se trocaram gestos de Paz, dois irmãozinhos, talvez de 2 e 4 anos, começaram a ir pelas filas adiante, cumprimentando todas as pessoas. Parecia que um raio de luz avançava na direcção do altar: por onde eles passavam, as pessoas sorriam muito enternecidas. Mas depois a miúda mais velha deixou o pequenito sozinho e voltou para trás, ele começou a chorar, e a mãe foi a correr buscá-lo mas já foi tarde: um homem resmungou "isto não é lugar para crianças!" e pela igreja passou um burburinho de "agarrem-me que eu vou-me a ele" e "sim, senhor, é isso mesmo!". Ao meu lado alguém gritou "as crianças são bem-vindas na nossa igreja!", outros apoiaram, outros criticaram, e o padre, que já estava preparado para dar a comunhão, disse: no fim falaremos disso, agora não é o momento.
Lembram-se do que contei neste post? Pois é, já não precisamos de estudantes espanholas malucas para abandalhar a missinha, nós cá, católicos de Berlim, somos muito faça-você-mesmo.
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No fim, o padre disse duas coisas:
- Sobre as crianças, o óbvio: que as queremos na igreja, mas que em certos momentos se apela aos pais para que tentem resolver a agitação do melhor modo para as crianças e também para os outros presentes - sem que ninguém esqueça, contudo, que "é pela voz das crianças que se louva Deus", como vem no salmo.
- Na próxima semana vai haver um colóquio literário cuja receita devia reverter a favor das obras da igreja
(o famoso "telhado da igreja", haverá paróquia que não junte dinheiro para o telhadinho? - mas por acaso desta vez é sério: toda a igreja tem estado em obras, e temos andado a celebrar no ginásio da escola vizinha. Talvez isso explique um pouco a maluquice que hoje acometeu a comunidade)
mas o padre vai tentar que todos concordem em enviar o dinheiro para o Japão em vez de o usar para o objectivo inicial. Porque, dizia ele, "é bem verdade que precisamos do dinheiro, mas se compararmos as nossas dificuldades com as dos japoneses, as coisas ganham toda uma outra dimensão".
(Será que já disse hoje que gosto da minha paróquia?)
12 comentários:
(estou tão assim :-( avisei-te que te mandei um mail e até agora não tive resposta nenhuma :((
Uma das coisas que mais gosto na minha paróquia em Portugal é que ninguém desejaria pôr uma criança fora da igreja. Nem imagino o que faria a alguém que me dissesse isso em relação a um filho meu, mas seria um gesto pouco cristão, certamente.
sem-se-ver: ai!!! já lá fui, já respondi. (já me posso levantar do milho?)
gralha,
se calhar teríamos de comparar os barulhos. Tenho a sensação que os pais portugueses saem mais depressa da igreja quando a criança começa a fazer barulho. Estes alemães, nem dos concertos saem, quanto mais das igrejas...
Já estive uma vez numa missa onde uma boa meia dúzia de crianças pequeninas começou a desenvolver dinâmicas de grupo: conversavam muito, corriam todos para aqui e para ali, se um chorava os outros choravam também, etc. Nem o padre se conseguia concentrar na homilia que queria fazer.
Digamos que não havia necessidade...
Mas ontem, além daquele momento luminoso em que os dois foram cumprimentar as pessoas, houve um momento hilariante: o rapazito de 3 anos, sentado atrás de mim, que estava muito chateado e irrequieto por causa daquela missa que nunca mais acabava, perguntou muito alto quando o cesto da colecta passou: "ainda por cima temos de pagar?!"
Conheço um padre que tem um jeito especial para crianças. Elas até se esquecem de fazer barulho, porque estão completamente suspensas do que ele diz e as faz fazer. Rezar com o corpo, entender o infinito a partir dos gestos que fazem. Uma coisa incrível.
Deviam fazer um documentário e espalhar em todas as paróquias!
Acho este episódio exemplar pelo bom-senso demonstrado pelo sacerdote.
Aqui na minha paróquia em Bona a opcao é iniciar a missa com todos os fiéis (miúdos inclusivé) depois antes da homilia os miúdos vao em grupo para a sacristia (onde se preparou uma dinâmica especial para eles que explique as leituras desse domingo)e regressam antes do Pai Nosso. Os resultados sao muito positivos e seniores e juniores respeitam-se ( ou aprendem a respeitar-se mutuamente).
De vez em quando também há momentos hilariantes ( o franciscano holandês que celebra a missa faz erros deliciosos de alemao) e ainda bem! A fé nao precisa de ser uma coisa tumular e sisuda.
Deste-me ideia para um post. Ver se o escrevo ainda hoje. beijocas
Como ex-Católico praticante (até aos treze), depois Católico não-praticante (até aos dezasseis, ou talvez dezassete) e actual agnóstico não-militante (mas convicto), só posso dizer que se, por um lado, a Missa não é lugar mesmo é para pessoas iradas (não lhes chega o lugar de condutor, no carro?), certos Pais talvez devessem também ter um pouco mais de cuidado com a forma como ensinam os seus rebentinhos a comportarem-se, não só na Missa em especial, mas nos espaços públicos em geral. Como, porém, se eles próprios são às vezes os primeiros a portarem-se tão mal, sobretudo no Cinema, mas também em Conferências, Concertos, lojas, transportes públicos, etc.?...
P. S.: A propósito deste tema, lá em casa ainda não chegámos à inevitável decisão sobre se os miúdos (em primeiro lugar o mais velho) hão-de frequentar a Catequese (e as aulas de Educação Sexual?...), ou não. Mas parece-me que, por mim, se a decisão familiar for "sim", gostaria de poder escolher a tal Paróquia, tão original e sábia, de Bona, ou então mesmo essa aí em Berlim (teriam também a vantagem de eles irem já aprendendo Alemão...)!
A. Castanho,
só digo 3 palavrinhas: Karl Kern, Munique.
Até o teu agnosticismo convicto abria brechas...
Helena,
isto também é para si: se passar por Munique, vá espreitar a paróquia do Karl Kern. Independentemente da idade dos seus filhos, vale mesmo a pena. Um homem que é capaz de dizer as coisas mais profundas do modo mais simples e que consegue sempre dar-nos a sensação que preparou aquela homilia só para nós. Já falei aqui dele, porque fez a missa do funeral do Bernd Eichinger.
http://www.st-michael-muenchen.de/index.php?id=317&PHPSESSID=b4023c5e0ca311f7bf15ca34cc69f84b
Quanto ao resto: quando eu frequentava a Serra do Pilar, em Gaia, havia o momento lindíssimo em que os miúdos entravam na igreja a meio da missa, a cantar "nós somos aqueles que Jesus amou".
- quer dizer: agora que olho melhor para este versinho, nos tempos que correm, eeeeeh lá... ;-)
Parabéns pelo seu blogue e por este texto em concreto. Está atenta e reflecte sobre as vivências da sua paróquia. Precisava de paroquianos assim. Tenho duas missas de crianças ao fim de semana. Também têm alguma algazarra, mas gosto e raramente chamo a atenção... Gosto assim, acho que Deus está muito, mas mesmo muito fora de todas a rubricas litúrgicas certinhas. Parabéns às crianças por essa ousadia e Deus fala com elas e por elas como são. Obrigado pela informação que me indicou sobre o texto que recebi sobre a Geração à rasca como sendo do Mia Couto, já retirei o nome e a foto.
Obrigada!
Sim, o texto não precisa de vir com aquele nome para ser um elemento interessante de reflexão.
Helena,
se isso te conforta, o meu agnosticismo está já cheio de brechas por tudo quanto é lado (sempre esteve, aliás, mas parece que resiste bem)...
Em todo o caso, se o Karl Kern algum dia tiver algum escrito traduzido para Português (estou a brincar), ou mesmo para Francês, Espanhol, ou Italiano, vou seguramente ter curiosidade em lê-lo.
Isto porque em Alemão seria algo (muito...) arriscado e o Inglês actual, enfim, não será a minha língua preferida para assuntos que ultrapassem um pouco as boas Séries da BBC, a música "ró", a Informática, os avisos aero-portuários e pouco mais...
ai, qual milho, credo!! eu é que sou super infantil e embeiço cá com uma facilidade...... sorry. :)
Ah, óptimo, então já posso varrer o milho e esgregar os joelhos. Ufff!
;-)
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