Adjectivo
abgefahren (comparativo: abgefahrener; superlativo: am abgefahrensten)
"Abgefahren" (2.) é o adjectivo que me ocorre para a ideia do Joachim: fazer uma festa de família no atelier de um amigo nosso, num edifício industrial tornado antro de artistas.
Imaginem as pessoas nos seus vestidos de festa, os sapatos chiques, e eu própria disfarçada de Isabel Preysler (mas mais nova, e sem fazer aquela expressão esfíngica das vítimas do botulismo) a avançar por este corredor, que de facto é uma galeria ao longo do rio Spree,
para um almoço numa sala assim:
Se acham a sala aceitável (obrigados, obrigados, trabalhámos muito para a pôr neste estado), vejam agora o corredor das casas de banho
e a propriamente dita (inlimpável, mas deu-se um jeito)
com esta janela toda partida, e uma vista fenomenal para o rio
Do programa constou também uma visita a uma torre de vigia na temível fronteira de Berlim, agora tornada museu e classificada como Património Mundial (não sei que me parece), e que fica mesmo ao lado do pavilhão dos artistas. O descampado por onde está a passar a bicicleta era o corredor da morte; as árvores muito frondosas por trás foram propositadamente poupadas, para que ninguém pudesse ver o que se passava junto ao muro.
Ao fim da tarde: um mergulho no Badeschiff, que é um barco transformado em piscina.
(Os convidados estavam avisados, levaram fato de banho - de modo que não houve cenas como daquela vez que estávamos num casamento principesco num antigo convento austríaco junto ao Danúbio e o tio da noiva se atirou à piscina, no meio do que fora o claustro, em cuecas)
Em suma: um lugar completamente abgefahren, para uma festa completamente abgefahren.
14 comentários:
Vou já tratar de acrescentar o adjectivo na sua versão 2. ao meu léxico. O jeitão que dá: os fregueses exclamando Ja, cool, e eu retorquindo Abgefahren!
[Eu fugindo ao tema central que é a inveja que nos estás a causar.]
inveja mesmo e não só das realidades físicas, digamos...
Sobre a temível fronteira: lembro-me de umas torres de madeira de onde podíamos espreitar para o lado de lá, a uma certa distância do muro, junto às placas que nos alertavam que estávamos a deixar o sector americano de Berlim Ocidental.
E não te esqueças de "krass", que serve para tudo, e não significa nada.
Assim, uma pessoa não se compromete.
Agora cá entre nós, Paulo: no sábado passado, até eu tive inveja de mim própria!
:-)
Sim, também me lembro, Paulo.
O mais terrível, para mim, foi a estação de Friedrichsstrasse: de um lado Alemanha ocidental (e pessoas sem-abrigo, e hippies, e namorados, e uma enorme mistura de cores e estilos) e do outro lado Alemanha oriental (e uma linha branca ao longo da plataforma, e letreiros a dizer que não se pode pisar o risco sem autorização, e os polícias de metralhadora pronta a disparar, e as pessoas vestidas de cores escuras e com ar tristonho).
Muito doloroso.
Aposto que eles gostaram muito da festa e de tudo mas no fim pensaram "ai, ainda bem que vamos para casa da Helena, que pelo menos tem as janelas limpinhas".
E tu sem contratares o alemao nem nada a colher os louros do contraste. Ainda eles todos nao tinham nascido, já tu eras muito esperta...
O metro passava por várias estações de Berlim Ocidental que entretanto tinham sido emparedadas, com a excepção de Friedrichsstrasse. Foi por lá que entrei em Berlim-Leste. Só não apanhei um choque muito grande porque tinha ido de comboio de Colónia para Berlim e já tinha apanhado a cena das metralhadoras duas vezes.
Entrar num super-mercado ou numa livraria era todo um outro mundo. Estávamos a folhear e a comentar um livro quando se aproximou de nós, quase a medo, um senhor que falava Português. Tinha vivido uns tempos em Angola. Fomos tomar um café com ele mas sempre pressentindo o cuidado que ele tinha nas conversas, o medo de estar a ser observado.
Depois queríamos passar para o lado de cá a pé, por Check-Point Charlie. Eis que não. A saída tinha de ser rigorosamente pelo mesmo sítio onde se tinha entrado. Estávamos em Abril de 1989. Em Novembro estava com um grupo de Alemães quando soube da notícia. Rejubilei mais que eles, que pareciam já estar a deitar contas à vida. Krass.
Paulo,
não me digas que estiveste em Berlim na Páscoa de 89?!
Eu também. Eras tu aquele lindo rapaz na Dussmann?
;-)
Também fomos de carro num renault 4 que, coitadinho, para chegar aos 100 era preciso um de nós sair e empurrar. Mas levámos quer na ida quer no regresso uma multa por excesso de velocidade. Íamos a 123 (das duas vezes) num sítio onde só se podia ir a 100. É muito estranho se estás num país onde a Polícia é o ladrão.
Os alemães com quem eu estava rejubilaram - até choravam sem conseguir parar.
Mas depois, no dia 3 de Outubro, quando o tratado da reunificação foi assinado e foi feriado nacional, eu saí para a rua na expectativa de um segundo primeiro primeiro de Maio, e nada. Nessa altura já estavam definitivamente a deitar contas à vida. Excepto em Berlim, claro, terra onde qualquer motivo é bom para fazer uma festa na rua...
;-)
Rita,
como adivinhaste?
(E não contei do rapaz que veio entregar as mesas e os bancos, e do calor que fazia, e de ele carregar aquilo tudo de tronco nu, e de como tinha os músculos todos no sítio. Adoro festas de família!)
(Quando foi buscar as mesas já não estava eu sozinha, também estava o Joachim. Não sei como é que aconteceu, mas já não fez tanto calor.)
Como é que eu hei-de dizer isto sem te magoar? Não, não era eu. Na Páscoa de '89, que foi em Março, eu era aquele rapaz lindo que estava na Flandres. Não te lembras? Estavas a comprar diamantes em Antuérpia.
E o teu gémeo foi para Berlim?
Ah, que engraçado!
E eu que nunca visitei Berlim :((
Como dizer em alemão : "grande tanso" ?
Cumprimentos
Ai a inveja a dominar-me, subindo, trepando por mim acima.
António,
espere um bocadinho mais, até eu conhecer e contar mais cantos da cidade. Isto é todo um mundo, que eu só aos poucos vou descobrindo.
Tansos, coitados, são os amigos que já cá vieram, e não viram nem um centésimo do que a cidade tem para oferecer, porque eu não sabia para lhes mostrar.
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