O Matthias esqueceu-se de um casaco numa loja do cidadão (alemã). Eu fui lá no dia seguinte, e disseram-me que já tinham mandado o casaco para o centro dos perdidos e achados. E que esperasse uns dias antes de telefonar a perguntar pelo dito. E eu esperei. E depois procurei na internet, mas não estava listado. Telefonei, e não sabiam de casaco nenhum como o descrito, mas disseram-me para ir lá, para ver no armazém. Eu fui, e não encontrei o casaco.
Depois procuraram no computador, e disseram-me que não tinham recebido nada desse centro, além de acharem muito esquisito a rapidez com que despacharam uma coisa esquecida - que não é nada habitual, disseram eles. De modo que eu fui outra vez à loja do cidadão, ver se o casaco não teria caído para trás de algum móvel.
A senhora que me atendeu foi muito desagradável. Aquele tipo de mulher sobre quem se diz que tem "cabelos nos dentes". Disse-me com maus modos que não registam essas coisas sem importância, e que não tinha como provar ou verificar fosse o que fosse ligado a uma bagatela. E que dava o assunto por encerrado. Perguntei-lhe se não a incomodava a suspeita de ter havido um furto, perpetrado por funcionários do Estado, dentro de organismos estatais. Ela disse que não a interessava, e "se não estiver satisfeita, vá à Polícia".
E eu fui.
Disse na recepção ao que ia, e que até tinha vergonha de vir incomodar por causa de um artigo de tão pouco valor, mas que não gosto da ideia de haver furtos dentro das repartições públicas. Daí a nada chamaram-me para registar a queixa. Voltei a pedir desculpa por causa da bagatela, e a funcionária, muito simpática, cortou-me a palavra: que era o que faltava, que não se pode admitir uma coisa destas, aonde é que vamos parar se nem nos serviços públicos nos sentimos em segurança?, e que até o polícia da recepção ficou boquiaberto quando contei o sucedido.
Daí a nada estava a telefonar à barbuda dental, que voltou a dizer que não tinha nada com isso, e a polícia só fazia "hm-hm, hm-hm", e eu pensava "pronto, já foste bem embrulhada". Mas quando a outra acabou de falar, ela rematou: pois é, mas a senhora tem obrigação de registar tudo o que sai dessa casa, independentemente do seu valor, até para sua própria defesa, e teremos de dar início a uma investigação sobre a "subtracção de coisa perdida" ocorrida nesses serviços.
Já perdi a esperança de recuperar o casaco, e é pena, porque ainda estava a contar dá-lo a uma escadinha de três sobrinhos - a qualidade da "coisa perdida" chega para esses rapazes, e mais outros tantos. Mas que o esforço valha ao menos para que alguém naquela cadeia de serviços afaste para longe a ideia de que se pode servir impunemente à custa dos utentes.
(Sim, eu sei: a proceder assim, bem mereço um descontozinho nos tais 300 euros que custa o processo para obter a nacionalidade alemã)
7 comentários:
Go Helena, estamos contigo!
:-)
Mas durante o tempo todo pensei: quando foi da bicicleta da Rita, os da Polícia não foram tão simpáticos...
Se todos procedêssemos assim, o estado "da coisa" melhorava certamente. O pior é ter tempo, paciência, determinação... e lá vamos indo embrulhados e roubados...
Lucy,
é mais fácil quando se tem a sensação de que se trata de uma situação anormal. Se achasse que esta é a ordem natural das coisas, eu também não me dava ao trabalho.
Conclusão: é mais fácil ser alemão que português. Em Portugal parte-se já do princípio que não há hipótese, que somos um D.Quixote rodeado de moinhos.
Agarrem-me, que estou a ter uma ideia: e que tal combinar entre todos o início de um período de tolerância zero contra a corrupção e os jeitinhos? Com duas vertentes:
(1) eu não faço
(2) eu denuncio
(ai! "denúncia": a palavrinha maldita no léxico português...)
Muito bem, Helena. Eu também alinho! Sou incompatível com a negligência e a corrupção, sejam elas grandes, pequenas, gigantescas, ou minúsculas...
A. Castanho,
também andas a ver se te fazem preço de amigo para adquirir a nacionalidade alemã?
;-)
Não vou tão longe, mas não duvido de que seja muito mais fácil ser alemão, do que português. Até para um negro (quem o diz é o insuspeito do meu Sogro, que já aí vive há mais de vinte anos...)!
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