01 junho 2010

cambada de umbiguistas!

Então a Alemanha ganha o Grand Prix Eurovision de la Chanson, e o Presidente da República demite-se, e ninguém em Portugal comenta nada?
Nem um "ai, parabéns, foi quase merecido..." nem um "ai, coitados, pobre Alemanha e pobre Angela Merkel!"?

Cambada de umbiguistas.

Sobre o Presidente da República, que se chateou pelo modo como criticaram uma afirmação dele, e saiu feito dama indignada "essas interpretações não são compatíveis com a dignidade do cargo que ocupo", lamento sobretudo que tenha escolhido tão mal o momento.
Quanto à afirmação propriamente dita, é das tais coisas: ele disse em voz alta o que todos fazem e pensam... Um dia hei-de conseguir compreender porque é que só se safa quem consegue ocultar melhor. Concretamente: neste momento há tropas alemãs no Oceano Índico a proteger aquela via comercial dos ataques piratas. Qual é o problema?
(para mim, o problema é não haver piratas e navios comerciais alemães a passar pelo meio do Darfur...)

Quanto ao Festival da Canção, vejam-me esta miúda:



É desconcertante.
Tem uma consciência de si própria e da sua dignidade como não é normal no mundo do espectáculo. Neste programa de televisão, trata o entrevistador por tu. Quando ele a trata por você, ela acusa logo: "Disseste "você"? Hã? Não me digas que também queres que te trate assim?" e acaba a trazê-lo para o campo dela, obrigando-o a que se tratem por tu. Quando ele lhe pergunta sobre a sua vida afectiva, ela diz que não é o primeiro a fazer essa pergunta, e que também ele ficará sem resposta. Da primeira vez que a quiseram interrogar sobre isso, respondeu que foi obrigada a casar aos oito anos de idade, e que o assunto ficara assim encerrado.
Mais à frente questiona o comportamento das pessoas perante a nova estrela que ela é: os que a chamam na rua como se se quisessem gabar de a terem reconhecido, ou os que, ao vê-la, sacam da câmara de filmar e toca de gravar tudo, sem respeito nem pudor, independentemente daquilo que ela esteja a fazer. Que acha muito estranho, diz ela.
A meio de uma frase diz "tenho um cabelo na boca", e ri, e continua a falar.
E conta que nunca aprendeu música, e que só tem experiência de palco devido a algumas festas na escola, "para o avô e a avó", e que achou graça a participar no concurso para selecção do cantor que iria representar a Alemanha em Oslo, mas que a vida dela continuou normal. Sim, normal: pelo meio fez o dificílimo exame final do ensino secundário.
- E como é que correu o exame, que sensação tens?, pergunta o entrevistador.
- Nenhuma, fiz questão de não ter nenhuma. Se achasse que correu muito bem, e no fim tivesse má nota, era desagradável. E se achasse que correu mal, ia passar um período de ansiedade até saber a nota, o que também não vale a pena.
- E como é que conseguiste estudar, apesar de teres a cabeça cheia de projectos bem mais interessantes?
- Ahem... estudei, simplesmente.
O entrevistador lembra o momento em que ela ganhou o concurso para ir a Oslo, e a enxurrada de calão juvenil que largou em frente à câmaras de televisão.
- E qual é o problema?! É esta a minha idade!

Se viram o Festival, no sábado passado, talvez tenham reparado num pormenor delicioso no fim do espectáculo: ela vem ao palco como vencedora, e o vencedor do ano passado rouba-lhe um beijo com aquele truque palhaciano de subitamente oferecer a boca no momento em que ela vai dar um beijo na face. Perante o público geral e os milhões de telespectadores, ela põe cara zangada e obriga o rapaz a vir dar um beijo como deve ser. Esta miúda não dorme na forma e não se deixa intimidar por nada!

E depois, tem uma capacidade fantástica de rir de si própria. Olhem só para isto (espero que dê para ouvir bem a pronúncia):

4 comentários:

Paulo disse...

Tu é que não sabes o que se passa dentro dos "autoplumas" em Lisboa. Eu dei os parabéns aos meus fregueses, embora eles, como eu, não conhecessem a canção (ou mentiram para não parecer mal). Quanto ao PR, não me pareceu que tivessem ficado muito preocupados.

Helena Araújo disse...

Essa gente dos autoplumas parece ser muito esquisita...

Eu pensei que haveria caravana e barulheira até às 3 da manhã, como quando a Turquia ganha um jogo de futebol. É que o primeiro lugar foi para a Alemanha, e o segundo para a Turquia. Isso, em Berlim, havia de dar uma festa monumental. Mas não deu.
O que é que o Balack tem, que a Lena não tem?
...muletas. Agora me lembrei. Coitado. Outro dia foi, por uma vez sem exemplo, notícia de abertura do noticiário das oito. Disseram que o Balack tinha a perna partida, e o país o coração.

(não sei se é a perna partida, mas era um trocadilho do género)

Lucy disse...

Pois é, de facto não dei por nenhum desses "grandes" acontecimentos e fico deveras preocupada... sou eu que ando completamente fora ou os meios de comunicação não nos comunicam muito além do futebol e da crise?
Recebam os meus parabéns (espero que se sintam orgulhosos e bem representados) e os meus lamentos solidários pelo vazio no e do poder(??)

Helena Araújo disse...

Obrigada, Lucy.
Acho que os alemães não estão propriamente orgulhosos, deve estar mais para o lado do enternecidos. Esta Lena escapa a tudo o que é standard no mundo do espectáculo.

Quanto ao vazio do poder: o Presidente não tem funções muito importantes, é mais uma espécie de rainha de Inglaterra. O que me está a preocupar é andarem a falar em ministros muito bons para esse cargo. Eu queria os ministros bons a continuar o seu trabalho de ministro!
Para presidente, bem podiam ir buscar um Habermas, ou então a eterna candidata de esquerda, uma mulher cheia de garra, que por duas vezes perdeu apenas por pouco para o candidato da direita.