11 janeiro 2010

muito gostava eu de saber como é que se diz "hate speech" em português...

Do Abrupto:

"A ilusão de que o acesso ao casamento quebra uma barreira simbólica que ajuda a terminar com a homofobia efectivamente existente, o argumento mais hábil de Vale de Almeida, repousa numa ambiguidade e numa hipocrisia. Porque Vale de Almeida sabe perfeitamente que ele e muitos outros a última coisa que pretendem é casar-se, ou sequer imaginam no casamento qualquer virtude especial. Eles sabem bem que o casamento é algo dos "outros", não por causa da lei que os exclui, mas porque o que vem virtualmente no pacote do casamento, a instituição familiar convencional, os "deveres conjugais", não correspondem ao mesmo mundo cultural e emocional do seu entendimento da "causa" dos homossexuais e lésbicas. Para eles o que conta é a "causa", não o mérito da instituição a cujas portas pretendem aceder e por isso a questão é outra, bem longe da luta por um direito, é um ataque a uma determinada forma de viver em sociedade, que abominam e desprezam e tem pouco a ver com a sua cultura e a sua mundovisão. Sabem que ao romper na lei a relação do casamento com a família nuclear, que implica possibilidade real da procriação, erodem para outros um valor que não desejam."


E agora vou fazer um desenho:


Para eles (por exemplo: os filhos dos imigrantes, que querem ter acesso de pleno direito à participação política) o que conta é a "causa", não o mérito da instituição a cujas portas pretendem aceder e por isso a questão é outra, bem longe da luta por um direito, é um ataque a uma determinada forma de viver em sociedade, que abominam e desprezam e tem pouco a ver com a sua cultura e a sua mundovisão.

Para eles (por exemplo: as muçulmanas que querem poder dar aulas no ensino público mantendo a cabeça coberta) o que conta é a "causa", não o mérito da instituição a cujas portas pretendem aceder e por isso a questão é outra, bem longe da luta por um direito, é um ataque a uma determinada forma de viver em sociedade, que abominam e desprezam e tem pouco a ver com a sua cultura e a sua mundovisão.

Para eles (por exemplo: as sufragistas) o que conta é a "causa", não o mérito da instituição a cujas portas pretendem aceder e por isso a questão é outra, bem longe da luta por um direito, é um ataque a uma determinada forma de viver em sociedade, que abominam e desprezam e tem pouco a ver com a sua cultura e a sua mundovisão.

Para eles (por exemplo: os árabes que exigem a criação de um Estado Palestiniano) o que conta é a "causa", não o mérito da instituição a cujas portas pretendem aceder e por isso a questão é outra, bem longe da luta por um direito, é um ataque a uma determinada forma de viver em sociedade, que abominam e desprezam e tem pouco a ver com a sua cultura e a sua mundovisão.

Para eles (por exemplo: os judeus, durante o processo da "emancipação judaica") o que conta é a "causa", não o mérito da instituição a cujas portas pretendem aceder e por isso a questão é outra, bem longe da luta por um direito, é um ataque a uma determinada forma de viver em sociedade, que abominam e desprezam e tem pouco a ver com a sua cultura e a sua mundovisão.

***

A pergunta que não quer calar é esta: como é que Pacheco Pereira pode estar tão seguro de saber que "ele e muitos outros a última coisa que pretendem é casar-se, ou sequer imaginam no casamento qualquer virtude especial", e que "o que vem virtualmente no pacote do casamento, a instituição familiar convencional, os "deveres conjugais", não correspondem ao mesmo mundo cultural e emocional do seu entendimento da "causa" dos homossexuais e lésbicas"?

Desde quando é que os homossexuais são todos iguais, e o pior possível?

***

E depois - para quem teve o cuidado de ler o post de Pacheco Pereira até ao último parágrafo -, não é preciso recorrer a uma bola de cristal para adivinhar o futuro. Já há estatísticas. O primeiro link da minha lista no google é este: http://gaymarriage.lifetips.com/cat/64319/gay-marriage-facts-statistics/

7 comentários:

Rita Maria disse...

Grande desenho!

io disse...

Ai Jesus que eu até me ia dando uma cosinha má: onde escreveste Abrupto eu li Abrunho e ia lindo e ia ficando em estado choque a pensar que solta e liberta Abrunho se tinha passado bem passada. Depois resolvi ir à fonte e clicar no link e respirei a bom respirar de alívio. :-) As minhas desculpas à Abrunho pela confusão: nem tudo o que luz é ouro, tal como nem tudo o que se inicia com A é adorável como a Abrunho.
é por estas e por muitas outras que te admiro profundamente bela Helena: lograr ler o JPP até ao fim, não morrer de vómito ao primeiro parágrafo e ainda conseguir fazer belos, grandes e elucidativos desenhos não é para todos. É mesmo só para alguns privilegiados como tu. Belíssimo post!

Helena Araújo disse...

io,
minha disléxica,
;-)
não costumo ler o Abrupto. Cheguei a este post porque o Voz do Deserto o citava (para explicar porque é que as coisas não são simplesmente "seguir com as nossas vidas").
Parece-me fundamental que nos comecemos a ler uns aos outros com atenção. Este assunto não é para arrumar com frases simplistas, tu és homofóbico, tu queres corromper tudo.

Há aí medos que é importante que sejam verbalizados, mas também é fundamental que se saiba falar do medo e do desconhecido sem fazer um discurso do ódio.

Que provas irrefutáveis tem o Pacheco Pereira para fazer este conjunto de afirmações (ou serão insinuações?) sobre um grupo minoritário? E as acusações que faz ao Vale de Almeida, concretamente, são gravíssimas.

Gi disse...

Helena, boa. Ando há uns dias a dizer (acho que tenho de escrever também) que já deve haver números suficientes para se ter uma ideia do que acontece por exemplo aos filhos de casais homossexuais, em vez de andarmos a especular sobre o assunto.

Helena Araújo disse...

Gi,
Claro que já há números, as interpretações é que "vareiam"...

Helena Araújo disse...

Gi,
Claro que já há números, as interpretações é que "vareiam"...

Paulo disse...

Como também não-leitor de JPP (conheço quem diria agora que era por interdição médica), também já tinha chegado a este texto via já nem sei o quê. E também tive de fazer um grande esforço para o ler até ao fim sem vomitar. Os argumentos que ele normalmente utiliza têm o poder de me deixar muito enervado.
O desenho está muito bem feito, mas duvido que ele o queira entender.