25 maio 2007

„Łejery”

Andava eu cá a pensar com os meus botões se digo ou não digo, que talvez interesse mas provavelmente não, e que o pretexto da pedagogia não esconde a baba maternal, e quase ia contando que na turma da Christina (alunos de 12 e 13 anos) andam a aprender de cor baladas de Schiller e Goethe (como esta ou esta), e que a nota incide não apenas sobre a memorização mas especialmente sobre a interpretação, e que é fundamental - têm falado muito disso, ultimamente - as crianças fazerem exercícios de memória (mas já não me lembro porquê), e ia acrescentar disfarçadamente que gostei de ajudar a Christina a desbastar um Schiller, e que ela teve uma boa nota (hmm hmm e tosse seca para disfarçar), e provavelmente aproveitaria para contar que descobri que ainda me lembro do Operário em Construção quase todo, mas acho que agora o declamo menos mal do que quando tinha 13 anos, e que a emoção nas partes "como era de esperar, as bocas da delação..." e "não podes dar-me o que é meu" continua igual, e ia falar de como a capacidade de memorização é um recurso tão mal explorado e...

...e eis que a realidade me ultrapassa pela direita: os miúdos de Poznan estiveram cá esta semana, e apresentaram Alice no País das Maravilhas em versão musical, com as músicas em polaco, mas os diálogos todos em alemão.
Note-se que são crianças de 9 anos, que interpretaram com imensa qualidade uma peça de 45 minutos numa língua desconhecida.
Passaram três meses a decorar o texto sílaba a sílaba, e tinham-no de tal modo controlado que conseguiam representar a peça com toda a naturalidade.

Desta vez não levei máquina fotográfica. As fotos são de um espectáculo semelhante, em 2005, "As Férias do Dragão Bonaventura". Um doce para quem descobrir quais são os animais representados na segunda fotografia.






A escola resultou de uma iniciativa de professores e pais para criar uma alternativa de ensino primário e secundário que desse especial atenção às artes. Chama-se „Łejery”, que é uma interjeição tipo "aiaiai" (em alemão: oje oje).

O problema de traduzir interjeições é que em Portugal ou se descamba para um lado ou para outro:
podemos optar entre ai meu Deus, ai Jesus, ai a minha rica Santíssima Trindade e mais todos os santos, ou até ai os santos todos um por um, de um lado, ou o seu oposto, ai o cará..., e é para não traduzir mais.
"Aiaiai", por seu turno, não é mais que a média ponderada do estado laico com o politicamente correcto.
Uma porcaria de tradução, a bem dizer.
E contudo... "ando na escola secundária valhamedeus" não é frase que se apresente.
Talvez então: Escola "Ai!"
(que diria o Ministério da Educação se tivesse uma escola que desse pelo nome de "Ai!"? Provavelmente alguém comentaria: "se fosse só uma...")
São uns brincalhões, estes polacos.

Lembrei Poznan com saudades - os edifícios antigos tão bem recuperados, a beleza dos seus cafés e a elegância do serviço. Haverá mais algum país onde sirvam um belíssimo prato de gelado decorado com pétalas de rosa, por menos de 2 euros?
Disseram-me que devia ir a Varsóvia, muito melhor que Poznan. Melhor ainda, será possível?
Para que conste: o lado de cá da cortina de ferro está cheio de boas surpresas.



PS. E mais uma foto, para contar que em Weimar há um lar de terceira idade para actores e músicos. Um lugar animado como dificilmente se imaginaria. A Fundação responsável (Marie-Seebach-Stiftung) participa a nível político para defender os interesses dos idosos, organiza cursos para a terceira idade, e dispõe de uma sala com capacidade para 200 pessoas, onde várias vezes por semana decorrem espectáculos variados. Ora são os próprios habitantes do lar que se oferecem recitais e concertos, ora são os seus visitantes - artistas famosos - que fazem a festa, ora são convidados que vêm mostrar o que valem. Como as crianças de Poznan. Ou estas da fotografia, da orquestra de cordas de uma escola primária de Weimar.
(para ver melhor, carregar sobre as fotografias)

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