13 agosto 2021

paredes-meias

(fonte: DW)
 

 
 
Faz hoje 60 anos que a população de Berlim Leste acordou fechada dentro de um muro.
(Bem sei que quem estava dentro do muro eram os de Berlim Ocidental, mas esta prisão tinha paredes convexas.)
 
Por coincidência, hoje vou festejar o aniversário de uma amiga no antigo corredor da morte, numa casa construída junto à cicatriz da cidade: trechos onde retiraram as paredes de betão, e transformaram em rua a antiga estrada dos guardas da fronteira.
(Os postes de iluminação ficaram, que já estavam no sítio certo - e são eles que nos lembram quotidianamente que aquela rua é diferente da outras.)
 
Uma cicatriz de 160 km, que uma década após a queda do muro foi transformada no Mauerweg, o "caminho do muro": um circuito à volta da cidade, quase todo sobre a antiga faixa murada, que pode ser facilmente percorrido a pé ou de bicicleta, em etapas servidas pelos transportes públicos.
(Outra maneira de ir a Fátima ou a Santiago de Compostela.)

Penso no muro, e logo me ocorre um dos momentos altos deste meu ano, quando descobri a beleza das cerejeiras em flor numa alameda de quase 2 km de comprimento em Teltow, e me espantei com a minha capacidade de passear extasiada e feliz ali mesmo onde antes se disparava a matar sobre quem passava. Contradições?
 
Em Berlim, vive-se paredes-meias com a História. E a alegria é possível, mesmo quando se habita nos cenários que testemunharam horrores, e em cada lugar nos é lembrado o que ali aconteceu. Talvez por isso mesmo: porque a memória de um passado terrível nos prova que nada é para sempre. De certo modo, esta cidade indómita é também uma "cidade das luzes" - iluminada por tantos que em cada época lutaram e arriscaram a própria vida para pôr algum travão às injustiças dos poderosos, e nos confirmam a esperança de que "há sempre uma candeia / dentro da própria desgraça / há sempre alguém que semeia / canções no vento que passa".
 
 

2 comentários:

Lucy disse...

Que bom ter-te de volta! já estava a pensar que ficaríamos para sempre parados na Diana Spencer

Helena Araújo disse...

Estava de férias. :)
E que bem sabe fazer férias longe da internet.