23 setembro 2020

mas afinal qual é, concretamente, o problema da disciplina de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento?

Tento compreender os motivos que podem levar os encarregados de educação a alegar objecção de consciência para impedirem os menores a seu cargo de frequentar a disciplina obrigatória de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento, mas está difícil, porque os argumentos permanecem demasiado vagos. Limitam-se a falar em "ideologia" e "temas que não são do âmbito da escola". Se pergunto um pouco mais, falam-me em "sexualidade" e "ideologia de género". Mas o que quer dizer isso, concretamente?

No final deste post partilho as linhas orientadoras desta disciplina, e apelo aos objectores de consciência para que informem sobre quais são as partes do programa dessa disciplina com as quais não concordam, e porquê. Agradeço também que apresentem casos reais de excessos cometidos em alguma escola, para podermos averiguar se se trata de um excesso ocasional a corrigir localmente, ou se é algo que abrange todo o sistema.

Quanto aos argumentos que já avançaram relativos a "sexualidade" e "ideologia de género", pergunto aos objectores de consciência: 

1. Porque é que, no que diz respeito à sexualidade, não querem que os menores a vosso cuidado recebam da escola "informações rigorosas relacionadas com a protecção da saúde e a prevenção do risco"? (v. as linhas orientadoras da disciplina, que partilho abaixo)
Ou será que conhecem casos de professores que se excederam, e trataram o tema "sexualidade" de uma forma nociva aos interesses dos alunos?

2. Porque é que não querem que a escola desconstrua "preconceitos e estereótipos de género, de forma a garantir as mesmas oportunidades educativas e opções profissionais tanto para rapazes como para raparigas"? Porque é que uma sociedade que tem a igualdade de oportunidades como princípio básico deve reconhecer a um encarregado de educação o direito de inculcar princípios contrários àquele, sem que ao menor seja oferecida a possibilidade de qualquer contraditório? 

3. Porque é que não querem que a escola informe os menores a vosso cuidado sobre a existência de orientações sexuais diversas, e lhes incuta o princípio do respeito por todas as pessoas, independentemente da sua orientação sexual?
Ou será que conhecem casos de professores que se excederam, e - por exemplo - fizeram a apologia dessas orientações sexuais como algo preferível à heterossexualidade?

4. Porque é que não querem que a escola informe os menores a vosso cuidado sobre a existência de pessoas que não identificam o seu género com o seu sexo biológico, sublinhando que essas pessoas merecem respeito? O que há de errado na informação sobre a existência de pessoas transexuais, e no alertar para as dificuldades da sua vida no contexto de uma sociedade maioritariamente binária?

Será que acreditam realmente que essas pessoas não existem? E, nesse caso, por que motivo deve a sociedade reconhecer a um encarregado de educação o direito de negar ao menor a seu cuidado informações fundamentais para a coexistência numa comunidade mais diversa do que aquilo que esse adulto está capaz de reconhecer e aceitar?

Agradeço sinceramente que me respondam a estas questões. 
 

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Educação paraa Cidadania - Linhas Orientadoras

A prática da cidadania constitui um processo participado, individual e coletivo, que apela à reflexão e à ação sobre os problemas sentidos por cada um e pela sociedade. O exercício da cidadania implica, por parte de cada indivíduo e daqueles com quem interage, uma tomada de consciência, cuja evolução acompanha as dinâmicas de intervenção e transformação social. A cidadania traduz-se numa atitude e num comportamento, num modo de estar em sociedade que tem como referência os direitos humanos, nomeadamente os valores da igualdade, da democracia e da justiça social.

 

Enquanto processo educativo, a educação para a cidadania visa contribuir para a formação de pessoas responsáveis, autónomas, solidárias, que conhecem e exercem os seus direitos e deveres em diálogo e no respeito pelos outros, com espírito democrático, pluralista, crítico e criativo.

 

A escola constitui um importante contexto para a aprendizagem e o exercício da cidadania e nela se refletem preocupações transversais à sociedade, que envolvem diferentes dimensões da educação para a cidadania, tais como: educação para os direitos humanos; educação ambiental/desenvolvimento sustentável; educação rodoviária; educação financeira; educação do consumidor; educação para o empreendedorismo; educação para a igualdade de género; educação intercultural; educação para o desenvolvimento; educação para a defesa e a segurança/educação para a paz; voluntariado; educação para os media; dimensão europeia da educação; educação para a saúde e a sexualidade.

 

Sendo estes temas transversais à sociedade, a sua inserção no currículo requer uma abordagem transversal, tanto nas áreas disciplinares e disciplinas como em atividades e projetos, desde a educação pré-escolar ao ensino secundário, de acordo com os princípios definidos no Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 91/2013 de 10 de julho. Subjacente a esta conceção educativa, está uma visão integradora das diversas áreas do saber que atravessa toda a prática educativa e que supõe, para além de uma dinâmica curricular, também uma vivência de escola, coerente e sistemática, alargada ao contexto em que esta se insere.

 

A abordagem curricular da educação para a cidadania pode assumir formas diversas, consoante as dinâmicas adotadas pelas escolas no âmbito da sua autonomia, nomeadamente através do desenvolvimento de projetos e atividades da sua iniciativa, em parceria com as famílias e entidades que intervêm neste âmbito, no quadro da relação entre a escola e a comunidade. Não sendo imposta como uma disciplina obrigatória, é dada às escolas a possibilidade de decidir da sua oferta como disciplina autónoma, nos 1.º, 2.º e 3.º ciclos do ensino básico. Deste modo, a educação para a cidadania pode ser desenvolvida em função das necessidades e problemas específicos da comunidade educativa, em articulação e em resposta a objetivos definidos em cada projeto educativo de agrupamento de escola ou escola não agrupada.

 

Atendendo à importância que o Ministério da Educação e Ciência reconhece a esta área curricular, têm vindo a ser produzidos, em colaboração com outros organismos e instituições públicas e com diversos parceiros da sociedade civil, documentos que se poderão constituir como referenciais na abordagem das diferentes dimensões de cidadania. Os referenciais e outros documentos orientadores não constituem guias ou programas prescritivos, mas instrumentos de apoio que, no âmbito da autonomia de cada estabelecimento de ensino, podem ser utilizados e adaptados em função das opções a definir em cada contexto, enquadrando as práticas a desenvolver.

 

As diversas dimensões da educação para a cidadania são já objeto de trabalho em muitas escolas, quer transversalmente, quer através de ofertas curriculares específicas e de projetos. As dimensões para as quais já foram elaborados ou estão em elaboração documentos orientadores para as escolas são, nomeadamente:

 

A Educação Rodoviária, que se assume como um processo de formação ao longo da vida que envolve toda a sociedade com a finalidade de promover comportamentos cívicos e mudar hábitos sociais, de forma a reduzir a sinistralidade rodoviária e assim contribuir para a melhoria da qualidade de vida das populações.

 

A Educação para o Desenvolvimento, que visa a consciencialização e a compreensão das causas dos problemas do desenvolvimento e das desigualdades a nível local e mundial, num contexto de interdependência e globalização, com a finalidade de promover o direito e o dever de todas as pessoas e de todos os povos a participarem e contribuírem para um desenvolvimento integral e sustentável.

 

A Educação para a Igualdade de Género, que visa a promoção da igualdade de direitos e deveres das alunas e dos alunos, através de uma educação livre de preconceitos e de estereótipos de género, de forma a garantir as mesmas oportunidades educativas e opções profissionais e sociais. Este processo configura-se a partir de uma progressiva tomada de consciência da realidade vivida por alunas e alunos, tendo em conta a sua evolução histórica, na perspetiva de uma alteração de atitudes e comportamentos.

 

A Educação para os Direitos Humanos, que está intimamente ligada à educação para a cidadania democrática, incidindo especialmente sobre o espectro alargado dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, em todos os aspetos da vida das pessoas, enquanto a educação para a cidadania democrática se centra, essencialmente, nos direitos e nas responsabilidades democráticos e na participação ativa nas esferas cívica, política, social, económica, jurídica e cultural da sociedade.

 

A Educação Financeira, que permite aos jovens a aquisição e desenvolvimento de conhecimentos e capacidades fundamentais para as decisões que, no futuro, terão que tomar sobre as suas finanças pessoais, habilitando-os como consumidores, e concretamente como consumidores de produtos e serviços financeiros, a lidar com a crescente complexidade dos contextos e instrumentos financeiros, gerando um efeito multiplicador de informação e de formação junto das famílias.

 

A Educação para a Segurança e Defesa Nacional, que pretende evidenciar o contributo específico dos órgãos e estruturas de defesa para a afirmação e preservação dos direitos e liberdades civis, bem como a natureza e finalidades da sua atividade em tempo de paz, e ainda contribuir para a defesa da identidade nacional e para o reforço da matriz histórica de Portugal, nomeadamente como forma de consciencializar a importância do património cultural, no quadro da tradição universal de interdependência e solidariedade entre os povos do Mundo.

 

A promoção do Voluntariado, que visa o envolvimento das crianças e dos jovens em atividades desta natureza, permitindo, de uma forma ativa e tão cedo quanto possível, a compreensão que a defesa de valores fundamentais como o da solidariedade, da entreajuda e do trabalho, contribui para aumentar a qualidade de vida e para impulsionar o desenvolvimento harmonioso da sociedade. A criação de uma cultura educacional baseada na defesa destes mesmos valores reforça a importância do voluntariado como meio de promoção da coesão social.

 

A Educação Ambiental/Desenvolvimento Sustentável, que pretende promover um processo de consciencialização ambiental, de promoção de valores, de mudança de atitudes e de comportamentos face ao ambiente, de forma a preparar os alunos para o exercício de uma cidadania consciente, dinâmica e informada face às problemáticas ambientais atuais. Neste contexto, é importante que os alunos aprendam a utilizar o conhecimento para interpretar e avaliar a realidade envolvente, para formular e debater argumentos, para sustentar posições e opções, capacidades fundamentais para a participação ativa na tomada de decisões fundamentadas no mundo atual.

 

A Dimensão Europeia da Educação, que contribui para formação e envolvimento dos alunos no projeto de construção europeia, incrementando a sua participação, reforçando a proteção dos seus direitos e deveres, fortalecendo assim a identidade e os valores europeus. Pretende-se promover um melhor conhecimento da Europa e das suas instituições, nomeadamente da União Europeia e do Conselho da Europa, do património cultural e natural da Europa e dos problemas com que se defronta a Europa contemporânea.

 

A Educação para os Media, que pretende incentivar os alunos a utilizar e decifrar os meios de comunicação, nomeadamente o acesso e utilização das tecnologias de informação e comunicação, visando a adoção de comportamentos e atitudes adequados a uma utilização crítica e segura da Internet e das redes sociais.

 

A Educação para a Saúde e a Sexualidade, que pretende dotar as crianças e os jovens de conhecimentos, atitudes e valores que os ajudem a fazer opções e a tomar decisões adequadas à sua saúde e ao seu bem-estar físico, social e mental. A escola deve providenciar informações rigorosas relacionadas com a proteção da saúde e a prevenção do risco, nomeadamente na área da sexualidade, da violência, do comportamento alimentar, do consumo de substâncias, do sedentarismo e dos acidentes em contexto escolar e doméstico.

 

A Educação para o Empreendedorismo, que visa promover a aquisição de conhecimentos, capacidades e atitudes que incentivem e proporcionem o desenvolvimento de ideias, de iniciativas e de projetos, no sentido de criar, inovar ou proceder a mudanças na área de atuação de cada um perante os desafios que a sociedade coloca.

 

A Educação do Consumidor, que pretende disponibilizar informação que sustente opções individuais de escolha mais criteriosas, contribuindo para comportamentos solidários e responsáveis do aluno enquanto consumidor, no contexto do sistema socioeconómico e cultural onde se articulam os direitos do indivíduo e as suas responsabilidades face ao desenvolvimento sustentável e ao bem comum.

 

A Educação Intercultural, que pretende promover o reconhecimento e a valorização da diversidade como uma oportunidade e fonte de aprendizagem para todos, no respeito pela multiculturalidade das sociedades atuais. Pretende-se desenvolver a capacidade de comunicar e incentivar a interação social, criadora de identidades e de sentido de pertença comum à humanidade.

 

 

 

Tento compreender os motivos que levam encarregados de educação a alegar "objecção de consciência" para impedir que os seus filhos frequentem esta disciplina, mas debato-me sempre com a falta de informação. Os motivos apresesentados são vagos ("temas que competem às famílias", "ideologia"). Os casos concretos são inexistentes. Ou então, sou eu que estou mal informada.

 

Se bem entendi, o problema reside nos temas "sexualidade" e "

 

A Educação para a Igualdade de Género, que visa a promoção da igualdade de direitos e deveres das alunas e dos alunos, através de uma educação livre de preconceitos e de estereótipos de género, de forma a garantir as mesmas oportunidades educativas e opções profissionais e sociais. Este processo configura-se a partir de uma progressiva tomada de consciência da realidade vivida por alunas e alunos, tendo em conta a sua evolução histórica, na perspetiva de uma alteração de atitudes e comportamentos.

  

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