03 junho 2020

"aparência"


Havia na Casa da Conferência de Wannsee um cartaz de propaganda nazi que me deixava sempre perplexa. O cartaz estava dividido em duas áreas, uma com retratos de candidatos de esquerda, outra com retratos de candidatos nazis, e uma frase que dizia algo como “basta olhar para a cara deles para sabermos ao que vêm, e em quem podemos confiar”. 

O meu problema é que, mesmo com a informação sobre o partido a que pertenciam, eu não saberia decifrar na cara deles nem o carácter nem as intenções. Faltava-me, provavelmente, o treino do olhar que seria próprio daquela época. 

(Infelizmente não fotografei esse cartaz, para o partilhar agora aqui, e não sei se ainda consta da exposição na Casa da Conferência de Wannsee, que foi recentemente reformulada.) 

Pergunto: será que as aparências enganam, ou será que somos nós quem “engana” as aparências? Quer dizer: será que a #aparência é algo subjectivo, criado pelas informações ou pelos preconceitos que nos levam a distorcer inconscientemente o que vemos, focando-nos apenas nos traços que queremos ver? 

No registo oposto ao do cartaz nazi, a história de um rapazinho branco que quis fazer o mesmo corte de cabelo do seu melhor amigo para que no infantário não fosse possível distingui-los um do outro. Um caso extremo – e comovedor – da capacidade de construir a aparência dos outros a partir do que nos vai no coração.





1 comentário:

jj.amarante disse...

É por isso que eu sou contra o recenseamento étnico como expliquei aqui: https://imagenscomtexto.blogspot.com/2019/03/recenseamento-etnico.html