24 setembro 2015

mais uma "notícia" escandalosa sobre a Alemanha



Antes do escândalo dos refugiados-levados-para-os-campos-de-concentração-nazis houve um outro escândalo que envolveu a Alemanha, também forjado, mas desta vez com o objectivo de denegrir a imagem dos refugiados. Por sorte há escândalos para alimentar preconceitos de todas as espécies - vai por aqui um self-service que só visto.
É certo que um artigo que começa com

German Girls Must Cover Arms and Legs to Appease Syrian “Refugees”

So many nonwhite invaders from the Middle East have entered Germany over the past few months that a school headmaster in Bavaria has been forced to ask female pupils to cover up their arms and legs—for their own protection against local Syrian “refugees.”

não devia ir muito longe, mas foi. Muitas pessoas acreditaram, e lá me vieram perguntar se era mesmo verdade.

A quem ouviu falar desta história e ficou mesmo a pensar que as pobres rapariguinhas alemãs não tarda nada estão a usar burka, aqui vai a tradução da parte da carta enviada aos pais, pela escola que disponibilizou um ginásio para acolher provisoriamente refugiados:

Qual é o comportamento adequado em relação aos refugiados? 

Os cidadãos sírios são na sua maioria muçulmanos e falam árabe. Os refugiados estão formados pela sua própria cultura. 
Tendo em conta que a nossa escola fica mesmo ao lado do centro de refugiados, o uso de vestuário discreto devia ser adequado para evitar discrepâncias. Tops ou blusas transparentes, calções curtos ou mini-saias podem levar a mal-entendidos.
Deve-se evitar ao máximo observar os refugiados despudoradamente, bem como tirar fotografias - por favor, respeitem a dignidade das pessoas. 

Comentários de desprezo ou racistas não podem de modo algum ser tolerados. 
Por favor tenham em conta que os refugiados sírios estão a fugir da guerra, e alguns deles estão traumatizados. Devemos tratá-los com respeito, e oferecer-lhes apoio, pois todas as crianças e todas as pessoas merecem ter um futuro.


Tão simples como isto: entender o contexto dessas pessoas, e respeitá-las.
Claro que podemos agora questionar se os refugiados têm algum direito de vir cá para a nossa terra e trazer as manias e os tiques deles. Ter o direito, se calhar não têm, mas também não nos caem os parentes na lama se tivermos algum cuidado para evitar mal-entendidos e para que eles se sintam bem entre nós.

Esta questão do vestuário na escola está longe de ser pacífica na Alemanha, e não se coloca apenas devido à presença de refugiados sírios. Já há vários anos que algumas escolas tentam uniformizar parcialmente o vestuário dos alunos, de forma a evitar exageros e competições (e parece que o ambiente entre os alunos melhora substancialmente); por seu lado, este ano houve duas escolas que foram muito faladas por terem imposto certas regras de vestuário - e não foi devido à proximidade de refugiados. A revista Focus conta que numa escola de Hamburgo o conselho de representantes de professores, pais e alunos emitiu um dress code que proibia mostrar "peito, barriga, roupa interior/cuecas, demasiada coxa", por uma questão de respeito e tolerância mútuos. E uma outra escola, no sul da Alemanha, proibiu hot pants, e empresta t-shirts para esconder as roupas menos púdicas. A carta que a escola enviou aos pais e uma dessas t-shirts já foram parar à Casa da História, em Bona. E assim vai a vida...


5 comentários:

Gi disse...

Notícia escandalosa sobre a Alemanha não é essa, Helena: é a Volkswagen ter mentido sobre as emissões de gases.

Helena Araújo disse...

Mas isso é mesmo uma notícia, não é uma "notícia escandalosa" que é preciso desmontar. :)

Lucy disse...

que bom poder encontrar bom senso nalgum lado! Por aqui, por enquanto, vamos opinando com muito, muito palavreado e raras ações. Por acaso acabo de ver uma no religionline...ainda bem... Acho que é mesmo tempo de avançar e não estou neste momento a falar politicamente, of course…

Filipa disse...

Desculpe-me, Helena, mas é inadmissível que se cogite, sequer, em sugerir que as mulheres parem de exercer a liberdade de se vestir como bem entenderem por causa das crenças religiosas de outrem.

É repugnante a noção de que as mulheres se podem sempre adaptar a qualquer parvoíce que seja.

E não, a crença religiosa não justifica que se ouse cercear a liberdade de outras pessoas . Se ficam histéricos perante a visão de uma mulher em calções, que voltem para de onde vieram.

Helena Araújo disse...

Penso que é uma questão de delicadeza e bom senso.
São pessoas que vêm de outra cultura (nem direi que é uma questão religiosa) e algumas delas vêm profundamente traumatizadas. Não é preciso andarmos a fazer o discurso do "na minha terra faço como me apetece, habitua-te".
De qualquer modo terão de aprender imensa coisa. Um tratamento de choque no momento em que chegam, e nas condições em que chegam, era um sinal de fundamentalismo da nossa parte.

Além disso, repito, essa questão do vestuário nas escolas está longe de ser consensual. Muito antes de os refugiados cá chegarem já havia decisões das escolas de impedir certos tipos de vestuário. De despiário, melhor dizendo...