23 dezembro 2011

e porque amanhã é Natal (1)

"Então através do bater da chuva e do rolar da tempestade ergueu-se do fundo da cozinha, velha, cansada e trémula a voz da Joana:

   A minha alma engrandece ao Senhor.
      O meu espírito alegra-se em extremo
em Deus meu Salvador.


   Pois ele pôs os olhos na baixeza da sua escrava e de hoje em diante todas as gerações me chamarão de bem-aventurada.
   
   Porque me fez grandes coisas o que é poderoso;
e santo é o Seu Nome;


   E a sua misericórdia se estende de geração em geração sobre os que O temem.


De súbito a Joana calou-se.
- Acabou? - perguntou a Gertrudes.
- Não, não acabou; mas estou velha, esqueci o resto.
Porém, do outro canto da cozinha, a voz do homem sentado à mesa dos pobres ergueu-se e continuou:

   Ele manifestou o poder do seu braço e dissipou os que nos fundo do seu coração formavam altivos pensamentos.
   Depôs do trono os poderosos e elevou os humildes.

   Encheu de bens os que tinham fome e despediu vazios os que eram ricos."


Sophia de Mello Breyner, Contos Exemplares

***
Traduções, traduções...
Bem me apeteceu mudar algumas frases do Magnificat. Por exemplo, escrever assim: "Pois ele pôs os olhos na humildade da sua serva" ou "Encheu de bens os famintos e despediu os ricos de mãos vazias".

-- E despediu os ricos de mãos vazias.
Está escrito, há dois mil anos que é esta a mensagem. 

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