Discurso de Klaus Wowereit, o presidente da câmara de Berlim, por ocasião do cinquentenário da construção do muro de Berlim, junto ao memorial do muro na Bernauer Straße:
(aqui em alemão, tradução do Speedy Gonzalez)
("presidente da câmara" não é uma expressão muito correcta. Berlim é um dos Estados alemães, e o seu presidente tem as mesmas funções de um ministro-presidente. Um dia, quando não for o Speedy Gonzalez a traduzir, hei-de averiguar como é que isto se traduz para português.)
„Hoje lembramos o dia mais triste da História recente de Berlim. A Bernauer Straße tornou-se o símbolo mais forte da tragédia da divisão da nossa cidade.
Tudo mudou com o dia 13 de Agosto de 1961. A construção do muro atingiu os berlinenses em cheio. Perplexos, fomos testemunhas do modo como o Estado da SED cimentava a divisão da cidade. Estávamos chocados e desesperados. Muitas pessoas tentaram ainda no último momento fugir para o Ocidente. Ainda hoje essas imagens nos perturbam, porque nos revelam o desejo de liberdade dos berlinenses e documentam a desumanidade e a injustiça do muro.
Pessoalmente, esta amarga experiência é-me um estímulo para não desistir nunca na luta contra pensamentos e actos totalitários, independentemente da capa e dos disfarces ideológicos que possam usar.
Mais de 100 pessoas morreram entre 1961 e 1989 ao longo dos 155 km da fronteira à volta de Berlim ocidental, porque tentaram conquistar a liberdade. Mas este sonho de liberdade terminou duramente sob uma chuva de balas dos soldados da fronteira da RDA.
No dia 13 de Agosto de 1961 os governantes da RDA encarceraram o seu povo, roubando a dezenas de milhares de pessoas a sua perspectiva de vida [refere-se aos residentes de Berlim leste que trabalhavam em Berlim ocidental]. Com esta acção o regime SED ganhou tempo, mas já naquele momento se anunciava a bancarrota de um sistema do qual as pessoas fugiam.
Hoje, 50 anos depois da construção do muro, lembramos as vítimas da fronteira da RDA, mas também todos os que – em Bautzen, Hohenschönhausen ou nos outros locais do horror – foram vítimas de injustiças porque queriam ser livres. Lembramos a perseverância de tantos berlinenses que, apesar de todas as dificuldades, continuaram a acreditar no futuro da nossa cidade e deram tudo para o conseguir. Pensamos em todas as melhorias que Willy Brandt, como presidente da câmara e como chanceler conseguiu, bem como os seus sucessores. Lembramos hoje tantas pessoas que, de todo o mundo, estiveram com os berlinenses durante esses tempos difíceis. Recordemos John F. Kennedy, que nos deu alento com a sua frase: ‚Ich bin ein Berliner.’
A nossa gratidão dirige-se hoje muito em especial aos membros dos movimentos de direitos humanos da RDA, aos quais a Igreja Evangélica ofereceu o tão importante espaço de liberdade e deu tanto encorajamento. A revolução pacífica e a vitória dos movimentos europeus de libertação contra a ditadura comunista na Polónia, na Hungria e na Checoslováquia: eles aplanaram o caminho para o fim da nossa divisão. E é a sobretudo a Michail Gorbatschow, nosso cidadão honorário, que devemos o facto de esta ter sido uma transição pacífica.
Quando o muro caiu, a 9 de Novembro de 1989, os berlinenses mal podiam acreditar em tamanha felicidade. Abraçados uns aos outros, festejavam o fim dessa triste época de encarceramento e espaço exíguo. E o mundo festejava connosco.
Isso foi há pouco menos de 22 anos. Desde então, Berlim transformou-se a uma velocidade vertiginosa, e é hoje considerada uma das metrópoles mais excitantes do mundo. Podemos orgulhar-nos disso. Contudo, também há pessoas no Leste da Alemanha cuja vida foi duramente atingida por estas transformações. Essas pessoas merecem a nossa solidariedade, e as suas realizações merecem o nosso respeito.
Não merecem qualquer compreensão, em contrapartida, aqueles que glorificam com nostalgia a divisão operada pelo muro. O muro era parte de um sistema ditatorial, um Estado sem Direito. É assustador que ainda hoje alguns afirmem que a SED tinha boas razões para construir o muro. Não! Para a injustiça, para o desrespeito dos direitos humanos, para mortos devido ao muro e ao arame farpado não há qualquer bom motivo e qualquer justificação.
O muro passou à história, mas não o podemos esquecer. Quem se confronta com este tema torna-se mais sensível aos problemas da injustiça e das ideologias totalitárias. Aqui, na Bernauer Straße, encontramo-nos num ponto central dos acontecimentos de 13 de Agosto de 1961. A autenticidade deste local lembra a história do muro de Berlim. E hoje acrescentámos ao memorial uma parcela importante [refere-se à parte do memorial que foi inaugurada ontem, entre a Ackerstrasse e a capela da Reconciliação, onde estão marcadas as paredes exteriores dos edifícios destruídos para estender a faixa da morte]. Com mais de meio milhão de visitantes por ano, é o mais visitado memorial das injustiças da SED. No entanto, inquéritos feitos à população revelam repetidamente que a falta de interesse e a ignorância em relação à divisão alemã e à construção do muro têm vindo a crescer.
Hoje, 50 anos após a construção do muro, é a hora de dar nas escolas um espaço alargado a este tema, de pais falarem com os seus filhos sobre o que experienciaram nessa época, e de procurarmos o diálogo com testemunhas desse tempo que vivem ainda entre nós.
Um jornal diário de Berlim escreveu no dia 14 de Agosto de 1961: ‚os berlinenses nunca esquecerão este dia.’ Hoje, no cinquentenário da construção do muro, eu acrescento: é responsabilidade de todos nós manter a memória viva e passá-la às próximas gerações, para que tal injustiça não se repita nunca mais. “
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