07 julho 2018

olhar para o nosso país com olhos de ver


"Vai para o teu país, pá! Lá é que estás bem" é o título de um artigo de Paulo Tavares no DN que põe o dedo na ferida do racismo e da xenofobia que existem em Portugal.

Alguns excertos (mas convém ler o texto completo):

Não sei bem há quantas décadas andamos a aprender, ensinar e perpetuar narrativas mais ou menos enganadoras sobre quem somos e qual o nosso papel na história. A colonização amiguinha e inócua, os brandos costumes, o país inclusivo e quase nada racista e, mais recentemente, a ilha de razoabilidade e moderação política numa Europa rasgada por intolerância, xenofobia, nacionalismos e populismos vários.
Sobre este último ponto ou esta última narrativa que, em bom rigor, o nosso sistema político continua a confirmar, aconselho a leitura atenta dos dados deste quadro, com resultados de um inquérito do PEW Research Center.
(...)
Em Portugal, 80% dos inquiridos afirmam que é decisivo ter ascendência familiar no país para que alguém possa identificar-se como português (a média do inquérito é de 53%); ter nascido no país é um fator decisivo para 81% dos portugueses questionados (a média dos 15 países é de 51%) e, talvez mais surpreendente, para 62% dos inquiridos em Portugal, ser cristão é essencial para definir a identidade nacional (a média aqui é de apenas 34%). Já agora, se não reparou, convém dizer que o estudo apanha países com enorme pressão de vagas de imigrantes e refugiados, como Itália, França ou Espanha, e esses países não chegam perto dos valores registados em Portugal.
(...)

Lembra-se do caso "Preta de merda, queres apanhar um autocarro, apanhas no teu país" contado aqui no DN por Fernanda Câncio? Quantas vezes viu, ouviu e leu o nome dela, da agredida Nicol Quinayas, seguido de "colombiana" ou "luso-colombiana"? A jovem tem 21 anos, nasceu na Colômbia é certo, mas vive em Portugal desde os 5. Fala português perfeito, com um igualmente perfeito sotaque do Porto. Depois, quantos comentários leu, nas redes, a desculpar a agressão com um "ela também deve ter feito das boas..." ou "passou à frente na fila, estava a pedi-las". Consciente ou inconscientemente, todos esses comentários fixavam-se na agressão, ignorando o discurso racista do agressor. Mesmo entre quem a defendia, quase todos lembravam a desproporção das agressões, o tamanho do agressor e a fragilidade da vítima, e... ignoravam os insultos racistas.
Não nos dá jeito encarar isto de frente, vamos preferindo as tais narrativas confortáveis que nos têm moldado enquanto povo e que raramente questionamos. Uma campanha "Todos diferentes, todos iguais", uns quantos discursos a elogiar a capacidade de inclusão e o caso está arrumado. Dormimos todos mais descansados.

 

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