11 abril 2018

calma, bom senso, decência

(fonte: euronews / © Copyright : REUTERS/Wolfgang Rattay)


A propósito da tragédia de Münster (um condutor que atropelou propositadamente dezenas de pessoas sentadas numa esplanada), li este comentário no facebook:

"Fico sempre espantada com a postura dos alemães nas redes sociais em momentos como os de hoje. Para já não circulam fotos, nem vídeos, nada..."

Não acompanho as redes sociais deste país. Mas nunca são alemães que nos contactam a perguntar se estamos bem - é sempre via Portugal que fico a saber que na Alemanha se passa alguma coisa assustadora.
Tentando explicar esta postura dos alemães, começo com uma brincadeira: será uma questão de tecnologia - suspeito que os alemães não são tão hábeis como os portugueses a usar os smartphones para participar nas redes sociais...

Mais a sério: um dos factores que explicam esta falta de agitação nas redes sociais pode ser o fenómeno III Reich, que mostrou aos alemães a fragilidade do Estado de Direito, o que tornou prioritária a educação para uma postura conscientemente decente e crítica. Isso vê-se a todos os níveis, desde a escola até ao modo como se realiza o debate público. Se na sociedade há um entendimento sobre não ser adequado divulgar imagens de tragédias como esta e desatar a fazer especulações, a maior parte das pessoas age em conformidade.

Dou-me conta de que os meios de comunicação social só dão as notícias depois de terem a certeza de se tratar de algo significativo, e só informam sobre o que sabem. Por exemplo, no dia do amok de Munique, durante cerca de três horas ouvimos repetidamente na rádio "Houve um tiroteio em Munique, mas a Polícia ainda não nos deu mais informações. Quando soubermos o que se passou informaremos imediatamente."

Em resposta ao debate sobre as "fake news" e à acusação de que os meios de comunicação social andam combinados com os políticos do sistema e só informam segundo os interesses destes, os jornalistas têm tido um cuidado especial em explicar os motivos das suas escolhas, e em sublinhar que estão a passar a informação que é credível. Em muitas das notícias, começam com: "até ao momento, é isto que sabemos de fonte segura". Paralelamente, em momentos de crise, repetem-se os avisos para as pessoas enviarem à polícia as imagens que tiverem, em vez de as porem na net. Avisa-se que a polícia precisa das imagens para a investigação, e que o seu trabalho pode ser dificultado se estas forem publicamente divulgadas.

Um outro factor que explica este distanciamento será com certeza a calma com que se apresentam os assuntos, por muito chocantes que sejam. Nesse dia, o noticiário da ARD às oito da noite abriu com quatro minutos sobre este tema. Assim:



Síntese:
- Em Münster, um carro atropelou várias pessoas numa esplanada. Segundo informações oficiais, houve quatro vítimas mortais - entre elas, o próprio condutor, que se suicidou com uma arma de fogo dentro do veículo.
- A polícia pediu à população que evitasse o centro da cidade. A tragédia aconteceu em... às... x horas, etc. [Imagens de fotos do Twitter]
- A polícia bloqueou os acessos ao local, e enviou forças especiais. A investigação ainda só está na fase inicial. Um representante da polícia diz que o condutor se suicidou, e que ainda não há qualquer certeza sobre os seus motivos.
- A polícia pede à população que não se entregue a especulações sobre a possibilidade de se tratar de um atentado terrorista. Entretanto, já há indícios de que o condutor era um alemão com problemas psíquicos.
- Presidente da Câmara (pouco depois da ocorrência): "Münster está de luto devido a esta tragédia. O nosso coração está com os familiares das vítimas mortais e desejamos rápidas melhoras aos feridos. De momento ainda não conhecemos as causas desta tragédia."
- A Polícia fez uma busca à casa do condutor, procurando explosivos. A cidade planeia há algum tempo dotar as ruas de equipamentos que impeçam atropelamentos deste tipo.
- Directo de Münster: a polícia tem uma pista concreta / está a investigar também o carro / foi lá encontrado um objecto suspeito / a zona foi evacuada / uma nuvem negra paira sobre a cidade / as pessoas devem evitar ir ao centro / de momento, é tudo.
- Entrevista com o especialista da ARD para terrorismo: "o que chama a atenção: o condutor não tentou sair do carro, não lutou com outras pessoas, não se rebentou para levar outros com ele; em vez disso, matou-se com um tiro dentro do carro - o que o distingue dos terroristas islamistas. Apurou-se que se tratava de um alemão de 50 anos com problemas psíquicos. A polícia tem de investigar o caso e responder à questão de eventuais motivações políticas. Mas de momento não há qualquer indício disso, ou de ele ter ligações aos islamistas."


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