24 maio 2017

"urina"

Começa a desenhar-se uma tendência: por falta de tempo passo um dia sem ir à Enciclopédia Ilustrada, no dia seguinte vou lá de madrugada e vejo o que os outros escreveram, fico cheia de ideias tipo "e diria mesmo mais", e com o prazo a estourar escrevo o mais depressa que posso, antes de sair a palavra desse dia.
Ontem/hoje foi assim (em edição revista e aumentada):

A Enciclopédia está de parabéns! Fizeram posts excelentes sobre #Urina.
Já estou ansiosa pelo dia em que a letra seja M...

Se me permitem alguns apontamentos soltos:

A H. V. S. já escreveu sobre a guerra dos sexos que há na Alemanha, para os homens urinarem sentados. Entretanto deixou de ser guerra dos sexos, agora é uma causa: os homens mais fracos já cederam, e tornaram suas as reivindicações das mulheres. Se calhar são os fracos que até acham bem dividir o trabalho com elas e limpar a casa de banho...
Há alguns anos participei num debate internético sobre o hábito, ou direito, de urinar em pé. Uma mulher confessou que lhe parece pouco masculino um homem urinar sentado. Passados uns tempos tive de limpar umas pingas que um homem deixou na minha casa de banho, e pensei na frase dela: o reverso da medalha de um homem másculo a mijar em pé é uma mulher de gatas a limpar a porcaria que ele faz.
Em todo o caso, ficam avisados: quem urinar em pé não vai fazer muitos amigos na Alemanha.

Diz que os homens gostam de fazer mira, e para evitar pingos à volta se deve pôr um sinal no fundo do urinol. Uma mosquinha, por exemplo.
Hehehehe, eternos rapazinhos.

Fizeram obras na escola primária do meu filho, e puseram urinóis. Não se esqueceram da mosca, mas esqueceram-se de explicar aos miúdos que não se deita no urinol o papel higiénico com que limparam as últimas gotinhas. Ao fim da primeira semana, quando a turma do meu filho se sentou em roda para conversar sobre o que correu bem e o que correu mal nesses dias, um miúdo disse que o que correu mal foi ter sido atacado pelo urinol. A professora quis saber mais, mas eles estavam todos enrascados. Até que finalmente se descobriu que os urinóis estavam entupidos. No fim, sobrou para o meu filho: ele tinha avisado os outros que não deviam usar o papel higiénico (sabia mais que eles, porque tínhamos um urinol em casa) mas não quiseram acreditar. E ele não quis falar com a professora sobre isso, para não ser queixinhas. Veio para casa furioso com a professora, por ela lhe ter ralhado. Confesso que uma das coisas que mais confusão me provoca na educação dos miúdos é essa dicotomia entre ser queixinhas e ser leal.

A minha avó passava a vida a mandar-nos pôr o penico debaixo da cama. Um dia que me esqueci, percebi rapidamente o porquê daquela obsessão. Quer dizer, não foi imediatamente, foi no dia seguinte, quando ia para me levantar, sem reparar pus o pé na borda do penico (da Vista Alegre, que naquele tempo não havia canalizações mas havia luxo na mesma), o palerma do penico virou e molhou tudo à volta.
Nos meus primeiros tempos na Alemanha tomei conta de um miúdo de três anos. O rapazinho estava a viver uma profunda crise existencial: uma irmã recém-nascida, e uma estranha em casa, que nem sequer entendia tudo o que ele dizia mas queria mandar nele. Um dia, como protesto, sacou da mangueirita e mijou o quarto dele de alto a baixo. Levei-o para a banheira, e ralhava enquanto o lavava: "estou furiosa! Isso não se faz! Isso é uma grande porcaria."
Sem se desconcertar, o raio do miúdo começou a corrigir a minha pronúncia. "Não se diz "furriosá", diz-se "furiosa", e por aí fora. Era um excelente professor de alemão.
Depois dei-lhe um rolo de cozinha e mandei-o limpar o quarto. Ele lá foi enxugando aqui e ali, no chão e nas paredes, e às tantas pára, olha em volta, e diz cheio de orgulho: "caramba! tenho uma pilinha muito boa!"
(Espero que dê para perceber que adoro aquele rapaz.)

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