17 julho 2016

to kiss the words and to speak the kisses

A sucessão vertiginosa de acontecimentos, da chacina de Nice para o golpe de Estado na Turquia, dá vontade de pedir que abrandem um bocadinho a História, para podermos descer...

Aproveito este fim de domingo que parece relativamente sossegado para lembrar um momento de beleza da semana passada: o Philippe Jaroussky deu finalmente um concerto - o único dos cinco eventos previstos para Junho na Konzerthaus. Desta vez, o programa era todo sobre as primeiras óperas italianas.

O cantor parecia um pouco fora de forma nos fortes e sobretudo nas coloraturas mas, em compensação, conseguiu momentos sublimes nas passagens mais líricas. Parece-me que chegou a uma nova etapa de maturidade, de controlo da voz e sobretudo de apropriação das peças.

As interpretações de "con che soavitá", de Monteverdi, e de "Berenice, ove sei?", de Pietro Antonio Cesti, foram extraordinariamente serenas e introspectivas.
"Gelosia, laciami in pace" foi interpretada de forma muito divertida, especialmente quando a repetiu no encore, mimando uma certa competição com Michele Claude, que deu um belo solo de percussão (e que bela mistura de jazz e barroco!)




"Berenice, ove sei?" está nesta gravação de um concerto semelhante ao de Berlim, que ele deu em Paris mal recuperou da doença do mês passado. Podem ouvir a partir de 1:05.30 (e devolvo o dinheiro a quem não ficar satisfeito).
"Gelosia, laciami in pace" começa a 1:09:24.




E porque é domingo, e porque apetece, o poema de ""con che soavitá" traduzido para inglês:

How softly, scented lips,
I kiss or listen to you:
but when I enjoy one pleasure,
I am deprived of the other.
How is it that your delights
can annul each other,
if my soul lives tenderly for both?
Such sweet harmony you would make,
oh dear kisses, oh delicate words,
if only you were equally
capable of procuring both delights:
to kiss the words and to speak the kisses.

(Con che soavità, labbra odorate
e vi bacio e v’ascolto:
ma se godo un piacer, l’altro m’è tolto.
Come i vostri diletti
s’ancidono fra lor, se dolcemente
vive per ambedue l’anima mia?
Che soave armonia
fareste, o dolci baci, o cari detti,
se foste unitamente
d’ambedue le dolcezze ambo capaci,
baciando i detti e ragionando i baci.)

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Já agora, que estou a falar em beleza: há tempos o Daniil Trifonof esteve na Filarmonia a tocar o segundo concerto de Rachmaninov para piano, com a Pittsburgh Symphony Orchestra e o maestro Manfred Honeck. Não vou chover no molhado: é claro que foi excepcional.
Aqui está o concerto completo, inclusivamente a boa disposição final, quando o maestro falou para o público que via em directo, em Pittsburgh, e exibiu a "terrible towel" dos Pitthsburgh Steelers (2:20:15) e quando, pouco depois, parecia não se lembrar em que cidade estava. As gargalhadas descontraídas dos músicos lembraram-me - finalmente - que estava perante uma orquestra americana. O último encore, a partir de 2:22:22 também foi muito divertido: a partir do Gallop, de Aram Khatchaturian, juntaram alguns excertos de outras peças,entre as quais uma canção que os Filarmónicos de Berlim tocam sempre por brincadeira no fim do concerto no Waldbühne: o Berliner Luft.  





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