Ontem fomos conhecer a Kinderhaus Sonnenblume (site aqui, em inglês - carregar em "start" sobre a bandeira).
À frente do projecto está uma mulher: a irmã Monika.
O objectivo é ajudar mulheres que estão grávidas ou têm filhos e não sabem o que fazer com aquela vida, porque temem a punição ou a pressão do meio social ou do próprio pai da criança.
As mulheres podem ficar a viver na Kinderhaus Sonnenblume algum tempo, até terem a criança ou até terem decidido se querem ficar com ela ou se a dão para adopção. Podem fazer partos anónimos (o que é ilegal, mas a irmão Monika preocupa-se mais com a vida que com a lei). Podem deixar a criança lá, mesmo anonimamente. Podem falar: encontram ali um porto seguro, onde se tenta ajudar cada mulher sem aproveitar para lhe impor moral.
Engana-se quem pensa que isto é um problema dos meios sociais mais desfavorecidos: pobres, mulheres sem instrução, prostitutas.
A maior parte das mulheres que procuram a casa Sonnenblume vem da classe média ou até alta.
O contexto que as empurra para uma situação tão desesperada não é de pobreza material ou de ignorância - na maior parte dos casos, são relações que não funcionam.
Também aparecem mães solteiras da Baviera ou de regiões rurais como a Floresta Negra, que dizem "se na minha terra sabem disto, estou arrumada". Mas a maior parte dos casos são mulheres que engravidaram apesar de o marido não querer uma criança (porque estão a comprar o carro ou a casa, ou a carreira é mais importante), e passam toda a gravidez indecisas, a fazer de conta que não está a acontecer nada.
Fascinante é que chegam àquela casa, grávidas de 8 meses, mas sem barriga. Ao fim de alguns dias, quando finalmente aceitam a gravidez, o corpo arredonda-se.
A irmã Monika contou histórias terríveis a propósito das nossas ideias feitas:
Nem sempre o melhor para a criança é ficar com a mãe biológica, dizia ela - e contava a história da mulher que esteve lá alguns dias com uma amiga, e queria dar o filho para adopção. Após o parto, a amiga, cheia de boas intenções, começou a pressioná-la para ficar com a criança, "tens os teus pais, tens os teus amigos, todos te daremos apoio" - a mãe deixou-se convencer, mas passados quatro meses matou o bebé.
O nível social não protege de nada, dizia ela - como aquela mulher que era directora de uma empresa, mas cujo marido não queria nem pensar na hipótese de uma criança. Escondeu a gravidez até ao fim, deu a criança para adopção, e só depois se deu conta que o problema não era o filho, mas a relação com o marido.
E as que estão na cadeia por terem matado o próprio filho?
Um caso: uma miúda que nunca conseguiu corresponder às expectativas dos pais. Queriam um rapaz, nasceu ela. Queriam um bom aluno, tinha notas baixas. Queriam uma beleza exemplar, era gordinha. Ela queria trabalhar em hotelaria, mas os pais exigiram que estudasse. Como a gravidez não cabia de modo algum no conceito dos pais, foi omitida. Após o parto, pela primeira vez na vida sentiu que começava ali uma história que era só dela, onde não havia lugar para os sonhos e as pressões dos pais. Saiu do hospital feliz, com o filho ao colo. Ao aproximar-se da sua rua, o peso da situação familiar abateu-se de tal modo sobre ela, que sufocou o filho e o atirou para um contentor de lixo.
Outro caso: uma mulher que matou nove filhos recém-nascidos, e os enterrou em vasos, sob as flores. Ela está na cadeia, mas o marido não. Disse que não se tinha apercebido de nada.
Muitos dos que visitam a irmã Monika e aquela obra lamentam-se que este mundo é um sítio horrível, e não há ponta por onde lhe pegar.
"Pegue por uma ponta qualquer", responde ela. "Se cada um de nós agarrar uma ponta, o mundo fica melhor."
***
Um pequeno comentário à margem: quantas vezes, durante a discussão sobre o aborto, se disse que as mulheres são adultas, sabem o que querem e são capazes de decidir livremente. Longe disso: é incrível a quantidade de mecanismos de pressão que podem existir sobre uma grávida e condicionar a sua vontade.
Sem comentários:
Enviar um comentário