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14 setembro 2019

sou eu, e o Brad Pitt

No âmbito do Festival Internacional de Literatura de Berlim decorreram ontem no Instituto Cervantes algumas sessões dedicadas ao tema "O Brasil sob Bolsonaro". Pareceu-me que as pessoas que assistem a um evento destes gostariam de saber que o filme "Chuva é cantoria na aldeia dos mortos" vai passar em Berlim, e por isso fui para lá distribuir folhetos dos Dias do Cinema Português. Três em um: passava a informação, assistia à palestra do Luiz Ruffato, que era um dos participantes do painel, e ouvia falar sobre um tema que me preocupa muito.

Enquanto distribuía os folhetos um a um ("óptimos filmes portugueses, e em especial esta co-produção brasileira, sobre as dificuldades de indígenas na Amazónia...") lembrei-me que bom, bom mesmo, era se o Luiz Ruffato quisesse mencionar esse filme no final da sua palestra. Assim ficavam todos avisados de uma só vez. De modo que fiquei atenta à sua chegada.

O problema é que tenho uma péssima memória visual. Inacreditável, mas já me aconteceu não reconhecer a minha própria filha numa fotografia (espero que ela não leia isto). E, apesar de já ter estado sentada a conversar longamente com o Luiz Ruffato, esqueci-me da cara dele. Lembrava-me bem da conversa, do seu discurso inteligente e articulado, mas a cara...
(de onde se prova que eu, entre conteúdo e aparência, nem hesito)

Pouco antes da hora de início da sessão apareceu uma cara que me era muito familiar. Pensei "é este!" e avancei. Cumprimentei, disse de onde nos conhecíamos, mostrei o flyer e quando ia a pedir para falar do filme no fim da palestra...

- Mas não é o Ruffato, é o Agualusa!

Era, e riu-se. 

(Também em tempos tinha conversado longamente com o Agualusa, e ali mesmo confirmei a impressão muito favorável que já tinha dele. Pedi desculpa pelo equívoco, e ele pegou no meu folheto e prometeu que o ia passar ao Ruffato.)

Li algures que o Brad Pitt tem uma dificuldade enorme em recordar ou reconhecer o rosto das pessoas. Uma lesão no cérebro,  dizem, e que no caso dele se deve ao consumo de droga; no meu caso não sei, porque o mais perto que andei das drogas fortes foi em criança apreciar o sabor da cola quando punha selos numa carta, ou o aroma da gasolina quando o meu pai enchia o depósito.

Em todo o caso: gostava de saber como é que o Brad, meu companheiro de desgraça, faz para sair destas cenas sem grandes beliscaduras no amor-próprio. O que eu faço (o que eu fiz ontem): rir-me por dentro, e pensar "eh pá, que grande vergonha! isto vai dar uma bela história no blogue!"

(Escusado será dizer que o Brad Pitt não precisa de se dar ao trabalho de me passar pela frente, porque não o vou reconhecer. Excepto se vir um rapaz bem parecido a fazer figuras tristes e que me são muito familiares: pode ser que então, aí, se faça luz neste meu cérebro de batatinha.)



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