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25 maio 2024

"galinha"

 

Passo a vida a contar isto, e se calhar na minha idade já me é permitido repetir as histórias, portanto aqui vai: a minha avó prendia as flores e soltava as #galinhas. Mesmo. As flores só faziam falta para a jarra na mesa da sala de jantar e para o cemitério, bem podiam crescer por trás de uma rede, muito juntas umas às outras, para as galinhas se espalharem pelo resto do terreiro, a debicar aqui e ali.
Quando tinha azar, cabia-me o quarto por cima do galinheiro, que era o que cheirava pior. Também havia dois por cima da loja do vinho, e a cozinha era por cima das vacas. A sala do Senhor, assim chamada porque era onde se recebia o crucifixo na Páscoa e onde se despediam os mortos (de janela aberta durante a noite, para ao menos a alma ir a Santiago de Compostela antes de o corpo ser metido na terra), era por cima da loja das batatas. Também tinha o seu cheiro, especialmente no inverno, quando as batatas começavam a grelar. Mas nada batia o fedor do quarto por cima da divisão de terra batida onde as galinhas passavam a noite.

De manhã, a avó embrulhava um pouco de milho no avental e abria o portelho das galinhas, que dava directamente para o caminho pelo meio das flores em clausura. Lá vinham as matronas, vagarosamente, atravessando aquela profusão de cores. A avó vinha à frente, chamava "polhinha! polhinha!", atirava o milho para o outro lado da sebe, esperava que passasse a última e fechava o portão.

Naquele terreiro, todos os dias eram de Páscoa: procurávamos os ovos que elas iam pondo aqui e ali. Não eram de chocolate, mas davam belas gemadas.

Às vezes havia um sobressalto no paraíso, e a seguir arroz de cabidela.

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