Isto de ter diversos nomes artísticos ainda vai ser a morte da artista: um simpático cavalheiro que me conhece por Margarida achou boa ideia a RTP entrevistar-me, e a pobre jornalista andou na Embaixada a tentar conseguir o meu contacto, mas a única Margarida que por lá conheciam com um perfil semelhante ao descrito chamava-se Helena Araújo. De modo que me contactaram a mim.
(Querida Margarida, caso existas e sejas outra: desculpa! Foi sem querer.)
Andava eu a passear o Fox (sim! o bom neto à casa torna!) (mas é só até ao fim do festival que o Matthias está a preparar) quando me ligaram a perguntar se podíamos fazer a entrevista daí a bocadinho. Ainda pensei levar o bicho comigo, mas optei por deixá-lo em casa (e assim perdi a oportunidade de o mostrar ao mundo, e de juntar às imagens um pequeno anúncio, "cão de meia idade, simpático, com boa figura e trilingue procura cadelinha com bom feitio para vocês-sabem-bem-o-quê-seus-brejeiros). Conversei com a jornalista, contei-lhe a minha vida praticamente toda (wow! depois dos padres e dos psicólogos, agora é a vez de porem os jornalistas a ouvir o povo!), gravámos a entrevista, e depois pediram-me para andar ó pra cá e ó pra lá, para terem mais alguns planos. Fiz tudo como queriam, arranquei-lhes a promessa de que dariam um jeitinho com photoshop às sandálias e à pedicure, despedi-me e fui para casa. Só no metro é que me ocorreu: "ó mulher! tu deixaste-te filmar sem ter o cuidado de colar a barriga às costas!" - mas já era demasiado tarde para voltar atrás e pedir que fizessem tudo de novo, e além disso escuso de tentar enganar as pessoas, que quem tenta parecer quem não é arranja um stress para a vida toda. Tanto mais que o mais provável era esquecer-me outra vez a partir do quarto ou quinto passo, e ter de recomeçar a filmar uma e outra vez, e ainda hoje lá estávamos (o que ia ser chato para o telejornal, porque enquanto esperavam teriam de meter muitos autocarros de equipas de futebol até poder passar finalmente a reportagem com um assunto importante, e eles não gostam nada de fazer isso).
Regressei a casa a pensar muito num pequeno filme de publicidade para um curso de representação da Helen Mirren, no qual ela dá uns passos em direcção ao centro da sala, depois olha para a câmara e diz que o que acabou de fazer é um dos maiores desafios da actuação. Havia uma altura em que o facebook me mostrava repetidamente esse filme, e eu não ligava. Bem me arrependi! Doravante, estarei mais atenta a toda a publicidade do facebook, que pelos vistos é lá que se aprendem as coisas importantes da vida.
Fui passear outra vez o Fox, a seguir disfarcei-me de senhora e saímos para a recepção do presidente da República. Deparámo-nos com uma grande animação, e gostei muito de encontrar lá tantas pessoas da comunidade. O presidente havia de vir mais vezes a Berlim, porque ajuda-nos muito a estreitar os laços da diáspora. É verdade que na sardinhada e no magusto também nos encontramos, mas nesses eventos eu faço parte da organização, e não dá para estreitar laços nenhuns, para além de dizer "olá!" e "já estás inscrito na mailing list dos Portugueses em Berlim?"
Apesar de não haver jogo de futebol (hihihihi) cantámos o hino nacional (e o senhor à minha frente, que é alemão, cantou-o inteirinho sem se enganar em palavra nenhuma, o que foi quase comovedor) (ao contrário de certa pessoa que eu cá sei, que troca "guiar" por "levar", e se fosse só essa dúvida, menos mal, mas às vezes também diz "entre as brumas da vitória" - senhor juiz, a culpa não é minha, é do Freud). O embaixador fez um discurso de boas-vindas e o presidente fez um discurso que não sei, mas parece-me que os senhores da Geringonça lhe podiam dar um beijinho agradecido. Depois começaram a servir comes e bebes enquanto o pobre presidente dava entrevistas para a comunicação social. Quando acabou de responder ao último jornalista começou o seu impressionante trabalho de conversar com as pessoas uma a uma, ouvir cada uma delas com atenção, e tirar selfies. Umas horas mais tarde encontrei o meu facebook e vários sites de jornais cheios de imagens de pessoas muito sorridentes a conversar com o presidente da República: como se fosse - perdoem-me a imagem - uma mãe com uma multidão de filhos únicos. Como político, teremos as nossas divergências. Mas reconheço a Marcelo Rebelo de Sousa um dom de proximidade genuína que provavelmente vai criar dificuldades a quem o suceder naquele cargo (excepto se for a Marisa Matias, claro, claro).
Deixei-me ficar para trás, a ver de fora aquele curioso espectáculo de magnetismo. O ministro dos Negócios Estrangeiros também observava a cena. Estava a poucos metros do epicentro do fenómeno, e todos lhe voltavam as costas. Lembrou-me o segundo astronauta a chegar à lua, mas ele não parecia incomodado. Até gracejou dizendo de si próprio, a quem lhe pediu uma selfie, que era o prémio de consolação.
A Embaixada fez um trabalho excelente de networking: por todos os lados grupinhos de pessoas a conversar animadamente, a apresentar-se, a trocar cartões e a combinar projectos. Algumas pessoas muito activas na comunidade portuguesa, que ali estavam pela primeira vez, mostraram-se encantadas por poderem ter dado um abraço ao presidente. Só por causa dessa alegria nos seus olhos, esta visita presidencial já valeu a pena.
Para a Sofia Borges e para mim foi também uma bela oportunidade para conversar com o ministro dos Negócios Estrangeiros, que é o maior patrocinador da Associação 2314, e pô-lo ao corrente dos maiores projectos que temos de momento em curso - a mostra "dias do cinema português em Berlim", que será em Outubro, e a escola de bombos portugueses, que vai de vento em popa.
Também tivemos direito à conversa e às selfies com o presidente. Ele teve gestos de uma enorme ternura para a Sofia - como mostra a foto no princípio deste post. Da próxima vez que der com alguém a dizer que o #metoo perverteu a relação de confiança entre homens e mulheres, hei-de lembrar-me do exemplo deste presidente: sabe abraçar e beijar com tamanho respeito e inocência que a ninguém ocorre acusá-lo de ter um comportamento invasivo e desagradável.
(foto: Joana Almeida Matos)
Deixo algumas dessas imagens para os mais cuscos. E a quem se rir do meu punho fechado, informo que uma amiga minha já criou o movimento #freeHelenaAraujo. Para quem quer saber a verdade em vez de se rir, explico que quando ele me pegou nas mãos eu tinha-as cruzadas, e quando as cruzo fecho sempre o punho para não parecer que estou a defender um livre. Ao fim de quase duas horas o presidente foi-se embora e levou consigo a comitiva, diz que foram jantar a um restaurante alemão. O que é pena para eles, porque ficavam mais bem servidos se tivessem ido ao Anabela's Kitchen, que é culinária em excelente e sem nacionalidade (o futuro bem podia pôr aqui os olhinhos) (mas é sempre a mesma coisa: nunca ninguém me pergunta nada, nem para escolher restaurante nem para desenhar o futuro). As pessoas começaram a sair, os grupinhos foram ficando cada vez mais pequenos, e às tantas o simpático motorista da Embaixada passou a fazer de carro vassoura e nós trouxemos para nossa casa os últimos convivas. A noite acabou com um esparguete de tomate feito à pressa, algum vinho, muita conversa e ainda mais risota.
E um último passeio para o Fox - com o Joachim, a Helena, a Margarida, a Lena e todas essas peças do puzzle que sou.
(fotos: Manuela Schneider)
tens uma bela coleção de colares (não sei se é o nome certo)
ResponderEliminarAnabela's Kitchen. Está registado! :)
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