No fim de uma festa nos arredores de Berlim, uma senhora que me vira a chegar de táxi ofereceu-me boleia (depois admiram-se de eu andar na vida com esta cara alegre). Palavra puxa palavra, daí a nada estava a contar-me que tinha fugido da Polónia em 1985. Era a manager de um grupo de desporto que participava num campeonato no Ocidente. Pedira o passaporte para acompanhar o grupo, mas só lho davam se ela assinasse um papel a dizer que aceitava espiar os outros. Ela recusou-se.
- Mas porque não? - perguntei eu, e acrescentei: assinava, e tratava de fugir antes de começar a dar informações.
- Era o meu bom nome! Nem pensar em deixar lá um registo que o conspurcasse!
Encontrou um funcionário da Polícia que a troco de bom dinheiro lhe tirou o passaporte da gaveta onde estava retido, dando-lhe seis horas para sair do Bloco de Leste. Fugiu para Berlim Ocidental o mais depressa que pôde, sem levar quase nada para não levantar suspeitas, e sem saber quando voltaria a ver a mãe, os familiares, os amigos.
Teve sorte: a mãe foi para a reforma passado um ano, e sendo reformada não era tão importante para o Estado - pelo contrário. Foi-lhe possível ir visitar a filha todas as vezes que quis.
Esta história é boa, mas ainda está muito longe da da velhinha que no supermercado me pediu ajuda para encontrar um produto, e a seguir agradeceu a ajuda e comentou que tinha muita sorte na vida, porque encontrava sempre quem a ajudasse, por exemplo no fim da guerra tinha conseguido arranjar um oficial russo que a protegia de ser violada pelos outros. Era só por ele...
As histórias vêm ter comigo de tal maneira que se calhar ainda pergunto ao Brandon Stanton se não quer abrir uma filial dos Humans of New York aqui em Berlim. Mas tenho de me organizar melhor, porque muitas vezes me esqueço dos detalhes mais importantes. Por exemplo: há tempos jantei com a filha do fotógrafo alemão que acompanhou o Mário Soares quando ele criou o Partido Socialista, e depois quando regressou a Portugal. Diz que a casa do pai está cheia de fotos históricas dessa época. E aqui a artista esqueceu-se do nome da rapariga, do sítio onde a encontrou, e de quem estava com ela.
[Ou seja: as histórias vêm ter comigo, mas às vezes dão com a porta fechada e ninguém em casa.]
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