31 março 2021

a cidade a bem-querer



1.
Entrei no autocarro, descobri que não tinha bilhetes e fui comprar um ao condutor.
- Minha senhora, há mais de um ano que não vendemos bilhetes no autocarro.
- Ai! Então deixa-me ir sem bilhete até à próxima paragem com automático?
- Com certeza.
Saí na tal paragem. O ecrã da máquina apanhava o sol em cheio, não dava para ver nada. Comecei a tentar fazer sombra com a mão para escolher o bilhete que queria, e às tantas ouvi uma voz:
- Se eu me puser assim aqui, tem a sombra de que precisa?
Era uma senhora que viu a minha atrapalhação e veio logo ajudar.
Depois não se admirem por eu andar de cara alegre nesta minha vida.

2.
Mais adiante, o autocarro que me interessava passou por mim, mas a paragem era demasiado longe para tentar apanhá-lo. Contudo, o autocarro ficou tanto tempo parado que ganhei ousadia e apressei-me ligeiramente nos últimos dez metros. Quando estava a chegar à porta de trás, ele arrancou. Não me chateei. Afinal de contas, já estava parado há demasiado tempo.
Logo a seguir o autocarro parou porque o semáforo estava vermelho, e o condutor abriu a porta para eu entrar.
(Será que tenho algo escrito na testa?)

3. Cheguei ao Consulado à hora a que estava quase a fechar. Toquei à campainha, e o funcionário avisou-me logo que não sabia se me ia poder atender. Daí a bocado veio buscar a senhora que estava antes de mim, e avisou de novo: "está a ficar tarde". A que entretanto tinha saído deu-me uma piscadela de olho, "não se preocupe, ele vai atendê-la". Atendeu. Voltei para casa com o meu CC novinho em folha (e a fotografia ficou muito melhor que a de há 10 anos - é uma sorte o CC não ser vitalício, não queria nada andar com a foto de há 10 anos agarrada a mim até que a morte nos separe).

4. Quase a chegar a casa, e por já estar com a mão na massa (quer dizer: com os sapatos da rua calçados) resolvi fazer um desvio pelo lago. Estava cheio de nudistas a gozar o belo dia de sol que se pôs hoje. Passaredo, isso é que quase nenhum. Dois cisnes, um galeirão. Mas no tronco onde habitualmente há uma garça encontrei três tartarugas (há quantos anos não as via neste lago!) a aproveitar o sol como os nudistas. Perto de mim, duas crianças esperavam que a sua acompanhante acabasse o telefonema. Disse-lhes: "viram ali as tartarugas?" O rapazinho respondeu: "vimos. E tu hoje escolheste uma roupa muito bonita!" (garanto que não, mas pronto)

Conclusão. Um dia que precisem de sentir que toda a cidade vos quer bem, apanhem o autocarro e vão ao consulado de Portugal. Eu, para falar verdade, não precisava. Mas foi muito bom na mesma.
🙂


1 comentário:

José Augusto Macedo do Couto disse...

Muito Bom.
Obrigado pela partilha.