08 fevereiro 2017

isto dava um filme

 (fonte)

Os EUA têm armas nucleares apontadas a 900 alvos na Rússia (dos quais, 100 em Moscovo), 500 na China, 60 na Coreia do Norte, 50 no Irão. O presidente dos EUA decide sozinho que alvos devem ser atingidos - alguns, em alguns países, ou todos ao mesmo tempo. Nem o próprio ministro da Defesa tem poder de veto. A partir do momento em que o presidente dá a ordem, tudo acontece muito depressa: a central reenvia-a para os centros militares secretos, que estão preparados para lançar as bombas em menos de um minuto. Com o presidente anda sempre um militar que carrega a "mala nuclear". Trata-se de uma maleta com documentos sobre a localização dos centros secretos de armas atómicas, a lista dos alvos previstos, e as várias opções que o presidente pode escolher em caso de emergência (a pedido de Jimmy Carter, foi feita uma folha tipo cartoon para explicar essas opções de forma simplificada - se fizessem este filme em desenhos animados, era: opção 1: BOOOOOM! / opção 2: KABOOOOOM! / opção 3: KATRABOOOOM!). Também tem - e isso é muito importante - os códigos pessoais para o Pentágono ter a certeza de que a pessoa que está ao telefone a dar a ordem urgente de activação das armas nucleares é mesmo o presidente dos EUA (se fosse um filme de humor negro, contava os casos em que os presidentes perderam a folhinha: Clinton guardou-a na carteira, junto aos cartões de crédito, de onde desapareceu misteriosamente; Carter esqueceu-se dela num fato que mandou para a lavandaria da Casa Branca; Reagan tinha-a no casaco que lhe tiraram quando foi atingido por um tiro, e o casaco andou uns tempos num saco plástico sem se saber de quem era). O processo, concebido para permitir uma reacção imediata e eficiente, tem como consequência que um homem só - o presidente dos EUA - pode decidir em pouquíssimos minutos sobre uma guerra nuclear absolutamente assustadora. Sem ter de prestar contas a ninguém, e sem haver nenhum mecanismo que o possa travar.  

Hollywood deve estar a dormir - que esperam eles para fazer o filme? Podia ser assim:

Nos EUA é eleito presidente um homem impulsivo, agressivo, avesso a informações e briefings, ignorante no que diz respeito a armas nucleares e relações internacionais. Um colérico incapaz de reflectir, e avesso a aprender. Um tipo que divide o mundo em vencedores e perdedores, em nós e eles. Um casca-fina, capaz de perder a cabeça por despeito. No Pentágono o ambiente torna-se muito tenso. Teme-se uma precipitação do presidente e uma guerra tão terrível quanto absurda. Um oficial (preto e muçulmano) que apela à não obediência e começa a juntar alguns adeptos é envenenado por um loiro ultraconservador do NSA. A bonitinha que simpatizava com a vítima começa a desinteressar-se das futilidades da sua vida e a politizar-se cada vez mais, e decide continuar esse trabalho, mas de forma discreta. Descobre que o colega homossexual que parece muito obediente lidera um grupo secreto de resistência. Contactam os engenheiros da VW para alterar os programas informáticos de activação dos mísseis. Entretanto o homossexual descobre que afinal é bi, e apaixona-se pela bonitinha, mas não lhe diz nada. Discutem por uma palermice, e zangam-se valentemente. Por sua vez o presidente dos EUA criou um trinta e um com a Coreia do Norte, esta dispara um míssil para a Coreia do Sul, que por sorte cai no mar. A China toma partido pela Coreia do Norte e o presidente dos EUA impõe que se virem todos os mísseis para as cidades chinesas. Enquanto o conselho de segurança discute o assunto e o presidente faz finca-pé e birra ("eu é que ganhei as eleições!"), os informáticos da VW metem-se numa directa de 4 dias a carburar com café Transfair, e enviam no último momento o programa à bonitinha. Quando esta pega na pen com o vírus destinado a alterar o programa de software e o vai meter no computador central, aparece o loiro nazi que já andava desconfiado. Lutam. O homossexual entra em cena. O presidente já está a pegar no telefone para ligar ao Pentágono. A luta fica cada vez mais aguerrida, o presidente já está a dizer "Hellooooo!", o nazi dá um tiro na pen e destrói-a, o oficial ao telefone pergunta ao presidente "que número vem a seguir a 1234?" e o presidente responde "5678". A bonitinha tira a pistola ao nazi e mata-o, mas sabe que já é tarde demais. O homossexual beija-a como se não houvesse amanhã, o que ambos sabem muito bem. O oficial, ao telefone, diz: "tem a certeza? por favor, veja bem". O presidente repete. O código continua errado. Tentam todos os códigos da lista. Todos errados.
Ao fundo da sala oval, uma estagiária sorri misteriosamente.

Enquanto Hollywood não faz o filme, deixem-me sonhar: que cada agente da cadeia de comando seja capaz de pensar qual é o grão de areia que pode meter na engrenagem. 

(As informações sobre o processo de accionamento do arsenal nuclear americano foram tiradas de uma entrevista a Bruce Blair, que nos anos setenta foi o responsável pelo seu funcionamento e depois se tornou um dos mais famosos críticos da política nuclear dos EUA. A maior parte daquela caracterização do presidente também é dele, nessa entrevista. O título da entrevista é: Trump e os códigos nucleares: "a ideia do seu dedo na mala nuclear provoca-me medo.")


1 comentário:

Júlio de Matos disse...



Só falta saber quando é que esse magnífico Filme irá estrear em Lisboa! Ou no Porto, pois não perderia esse Filme nem por trezentos quilómetros (mesmo que a A1 já tivesse sido totalmente destruída por bombas atómicas russas, sírias, somalis e iraquianas)...