07 fevereiro 2017

25 anos do Tratado de Maastricht








(fonte

Quando em 1989 vim viver para a Alemanha, os pais do meu namorado escreveram à polícia de estrangeiros a pedir autorização para receberem em sua casa uma au-pair que vinha ajudar a tomar conta dos seus filhos (a funcionária que leu o pedido tinha andado com um dos filhos na escola, fartou-se de rir, mas deixou passar e concedeu-me a autorização temporária de residência). Quando arranjei trabalho, foi preciso provar que não havia nenhum alemão desempregado capaz de desempenhar aquelas funções. Quando ia a Portugal de carro, levava 4 porta-moedas: um para marcos, outro para francos, outro para pesetas, outro para escudos. A travessia da fronteira podia durar mais ou menos tempo, conforme a disposição dos polícias. Fazer uma transferência bancária internacional era complicado e caro. E basta de exemplos para mostrar como Maastricht simplificou a vida dos europeus.

No entanto, em minha opinião, a maior conquista deste Tratado não foi ao nível económico mas ao nível da cidadania. De tal modo que quando os nossos filhos nasceram apenas os registámos como alemães. Para quê darmo-nos ao trabalho de ir ao Consulado português, se somos todos europeus, e a nacionalidade é um mero detalhe pitoresco? Em meados dos anos noventa, era assim que sentíamos.

O mais tardar com a crise do Euro o edifício começou a mostrar as suas contradições e armadilhas, e começaram a multiplicar-se as críticas à moeda única. Pergunto-me, como tantos, se a criação tão acelerada da moeda única foi positiva ou negativa. Ou se devia ter vindo bem mais tarde, como queria a Alemanha. Ou se podia ter sido adiada sine die. Não sei.

Também me pergunto como se teria desenvolvido Portugal sem o euro. Onde estaríamos hoje se ainda tivéssemos o escudo, em vez de termos aderido ao euro? Será que os mercados teriam cumprido a sua função de controlo, impedindo o endividamento excessivo? Com menos crédito, o Estado teria gerido melhor o dinheiro, ou teria investido menos? E como estaria a economia e a população portuguesa num cenário de mais nacionalismo intra-europeu e gigantes económicos à porta?

25 anos depois de Maastricht, temos o que temos, e estamos aqui. Há quem proponha uma tabula rasa: voltar atrás e recomeçar noutros moldes. Tenho dúvidas sobre isso. Acredito muito mais numa Europa capaz de aprender com os erros e corrigi-los, cada vez mais unida e solidária, do que num continente esquartejado em países a debater-se com as convulsões de uma brutal mudança de rumo. No 25º aniversário do Tratado de Maastricht, penso que o grande desafio é unir o continente em solidariedade e respeito pelos valores comuns. Amadurecer a União - que já tem bem idade para isso.


3 comentários:

jj.amarante disse...

Palavras sensatas, a Europa vai sempre de crise em crise porque fazer a união dum continente com esta História e dimensão não é tarefa fácil. Preferível a ir de vitória em vitória até à derrota final como aconteceu ao PCP no PREC pós-25 de Abril. Embora ao conhecer o funcionamento das instituições comunitárias seja preciso muita fé (neste caso na Europa), como dizia o embaixador José Cutileiro que referia uma necessidade semelhante para os católicos que iam trabalhar no Vaticano.

Faz-me voltar a pensar nos comentários sobre Portugal nos últimos 60 anos em que estivemos constantemente a caminho do abismo e porém estamos muito melhor do que há 60 anos. Claro que poderíamos estar muito melhor, como gosta de alvitrar o sábio António Barreto. E se a minha avó tivesse 4 rodas seria um automóvel.

E não acredito que estivéssems melhor com o escudo. O que me lembro é do Estado, que chamava "crawling peg" à manobra de estar constantemente a mexer no dinheiro no meu bolso sem sequer pedir licença. Agora querem baixar os salários e as reformas e chamam à manobra "reformas estruturais". Estas lutas devem fazer parte da vida senão já estávamos todos no Paraíso.

Helena Araújo disse...

A vantagem de ter mais de 50 anos é que ainda me lembro bem da miséria de onde viemos. No tempo em que éramos donos do nosso mar e da nossa terra o FMI foi chamado duas vezes para acudir a Portugal. Lembro-me dos anos de "apertar o cinto", e de termos as divisas contadas para viajar no estrangeiro, porque o país pura e simplesmente não tinha divisas.

Também tenho alguma dificuldade em acreditar que estaríamos melhor sem Maastricht. Apesar das muitas asneiras que foram feitas.

Júlio de Matos disse...



Pois eu tenho muitas dúvidas sobre isso tudo...

Mas para mim a questão essencial não é saber se estamos melhor com Maastricht, ou se estaríamos melhor se nem sequer tivéssemos aderido à CEE. Há vantagens e desvantagens em ambas as situações e fazer o balanço global é duma dificuldade intransponível.

Concordo mais com o teu "temos o que temos e estamos aqui" e, sobretudo, com o "aprender com os erros e corrigi-los" - é nisso que eu acredito, é por isso que me bato!

E aprender significa analisar, ouvir, comparar, melhorar, mas também inovar, ousar e, humildemente, aceitar errar outra vez.

Só que nada disto é possível em permanente berraria, em clima de intolerância, rigidez mental e desconfiança para com opiniões contrárias.

Infelizmente, é este o clima mental no Portugal de hoje, é este o triste panorama que se vive no espaço de opinião pública, nos fóruns académicos e intelectuais e, acima de tudo, nos meios de comunicação de massas.

Neste ambiente de guerra fria civil que se vive em Portugal desde 2008 e fortemente impulsionado pela reeleição presidencial de 2011, nada disto será possível e o País continuará a arrastar-se penosamente a reboque dos ciclos e contra-ciclos económicos e dos imprevisíveis caprichos da situação internacional, sem qualquer capacidade de auto-análise, de discussão fecunda e de actuação eficaz.

Oscilando à deriva, entre "tróicas" e baldróicas, como um elefante trôpego saltitando, desgraciosamente, de nenúfar em nenúfar...