Num último esforço (diria: quase póstumo) de pedagogia, Cavaco Silva escolheu Carlos Barahona Possollo para pintar o seu retrato como presidente. "Deixe-se lá dessas modernices amalucadas, que eu bem sei que não há rapazes maus", ter-lhe-á dito, "e pinte-me antes uma natureza morta".
Meu dito, meu feito. O artista podia ter-se atrevido a mais. Podia inspirar-se no retrato do Gerhard Schröder feito por Jörg Immendorff, com o chanceler rodeado por macacos e teias de aranha - as teias de aranha podiam ficar, trocava os macacos por vaquinha e cagarras, ficava um retrato muito catita.
(fonte: Welt)
Ou podia, em homenagem ao recuperado "dia da raça" (sim, esta ficou-me atravessada para sempre) retomar a estética triunfante da Leni Riefenstahl (aposto que o Cavaco Silva ia gostar de tão castiço retrato).
(fonte: faheykleingallery)
Mas não. Em vez disso compõe um presidente amarrado à Constituição, com a bandeira da República a fazer as vezes do leão nas imagens da Santa Eufémia. Um presidente emparedado vivo entre os limites democráticos.
(fonte: Expresso)
Já a história de ter mandado fazer dois retratos para escolher um deixa-me uma sensação dolorosa de um presidente que vive acima das possibilidades dos portugueses. Desde que o vi a mandar uma mensagem de Natal com um cenário de vários pinheirinhos de Natal, todos enormes e sobrecarregados de tralha, suspeito que pensa que é a reencarnação do D. João V.
Segundo a tradição, a mando d'El- Rei o Marquês de Abrantes procurou informar-se do preço de um carrilhão tendo-lhe sido indicado o valor de 400.000$00 réis, quantia tida como demasiado elevada para um país tão pequeno. Ao que D. João V, ofendido - era o monarca mais rico do seu tempo - terá respondido: “Não supunha que fosse tão barato; quero dois!” Assim, foi executado em Liége, nas oficinas de Nicolau Levache, o carrilhão da torre norte e, em Antuérpia, na fundição de Willem Witlockx, o da torre sul.
5 comentários:
"Um presidente emparedado vivo entre os limites democráticos"
Muito bem, é isso mesmo.
Engana-se minha cara; o que os dois retratos encomendados representam são as tais duas vidas que ele tem e os outros precisavam ter para ser como ele.
Luís,
também gosto da natureza morta... ;)
José Neves,
pois, pois. Para serem honestos como ele.
Pois eu digo-te, Helena, que o presidente correu um risco de que eu não o imaginaria capaz ao escolher este pintor.
Vai ver o site dele, espreita a galeria e vê se não tenho razão.
Admito que tenha dito ao pintor que tipo de retrato não queria ter... :)
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