27 fevereiro 2016

Jewgeni Onegin


Roubei a fotografia a um post do Wladimir Kaminer, que passo a traduzir:

Foi com alegria que me dei conta de que, graças à ópera moderna, as velhas tradições russas não desaparecem. A minha mãe e eu quase chorámos quando vimos o poster do Onegin na estação de metro. Pois qual é o russo que não gosta de nadar com um samovar? Eu prefiro nadar de costas, pois permite-me simultaneamente fazer desporto e observar a vida a acontecer à minha volta. Por regra, nado com o samovar em cima da barriga, e sorvo o chá do pires. A minha mãe leva sempre a compota para a piscina. 

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Fui ontem ver o Jewgeni Onegin à Komische Oper. Do que vi, quase só se aproveita este texto do Kaminer.

Há tempos, fomos à Komische Oper numa madrugada de domingo. Era o dia de venda das roupas e dos adereços de produções antigas, que fazem de dois em dois anos. Abria às dez, mas nós chegámos às nove, e a fila já estava bem comprida. Estava lá a Barbara (ou teria outro nome? Já me esqueci. Em todo o caso: é a pessoa na primeira fotografia. Vinha com um vestido de seda levíssimo, muito elegante, e fartou-se de apanhar frio apesar do casaco de pele. Rimos um bom bocado, porque disse que vinha preparada para arrancar das mãos de toda a gente - olhou para mim de soslaio, temos o mesmo tamanho - os vestidos que lhe agradassem). Meti conversa com as pessoas à volta, fiz aquelas perguntas sem importância nenhuma ("vêm cá comprar coisas para o Carnaval?") mas pelo modo evasivo como responderam, pareceu-me que não seria bem para o Carnaval. Deve haver por aí muitos mundos que desconheço.

Os que chegaram pouco antes de abrir foram obrigados a esperar várias horas ao frio, até que os gulosos como nós se achassem servidos. Foi um fartote: o Ring completo com cantores formidáveis, vários vinil de música clássica, uma colecção de Bossa Nova e Samba de ouvir e chorar por mais - tudo junto por vinte euros, que era o que eu tinha na carteira. Também comprei um chapéu lindíssimo de papoila. Já me podem convidar para um casamento qualquer, vou arrasar.

De modo que ontem estava a ver a ópera, e pelo meio dos tercetos e quartetos que o Tchaikovsky compôs tão bem, olhava para os vestidinhos e os cadeirões, e pensava se na próxima venda quero algum daqueles.




(o meu chapéu de papoila)


(uma senhora na fila para a caixa, com um chapéu de girassol)


Estavam a vender um tutu do Bolshoi. Vinte metros de tule, bordados à mão. 444 euros. Não comprei porque, digamos assim, tive medo que me estivesse muito largo... 







6 comentários:

Paulo disse...

Uma ópera tão bonita... Estragaram-na? Conseguiram dar cabo dela?

Esse chapéu de papoila deve ser de uma rapariga-flor do "Parsifal".

Helena Araújo disse...

Não é que a tenham estragado. Não souberam foi fazê-la brilhar. Houve alguns tercetos e quartetos muito bem interpretados, mas de um modo geral era apenas uma ópera bem cantada, sem momentos extasiantes. E nem sequer os vestidos estavam a pedir que eu vá para a próxima fila num domingo de madrugada... ;)

Não sabia, mas fui procurar. O chapéu foi usado na ópera "Schneekönigin" - os miúdos do coro infantil eram flores. Olha:
http://www.treffpunkt-berlin.eu/bilder/news-bilder/6/schnee-1.jpg

Paulo disse...

Que pena. O Onegin é suposto levar-nos às lágrimas.

Por outro lado, que cabeça a minha, as Blumenmädchen são televisões.
http://youtu.be/-n9E7kSYOT0

Paulo disse...

Não encontrei a cena toda, apenas o final e o que vem a seguir, que é o melhor. Desta encenação do Harry Kupfer gosto de tudo menos das televisões. Agora não consigo, mas se quiseres, depois envio-te links para veres tudo.

Helena Araújo disse...

Envia! Por favor.
Isto é lindíssimo.
E a Waltraud Meier está impressionante.

Paulo disse...

http://youtu.be/W4Xslpp6874
http://youtu.be/GEPDvuf8NQk

O Elming cantou cá o Parsifal por volta do ano 2000 e a Waltraud cantou cá várias vezes. Regressa por estes dias para concertar na Gulbenkian.