08 janeiro 2016

uma análise do que aconteceu em Colónia na passagem de ano

Trago do mural de facebook da Helena Ferro de Gouveia:

1. Vi os vídeos, li tudo o que a imprensa alemã e a polícia publicaram, ouvi as declarações da chanceler e demais políticos.
Os ataques de Colónia, Hamburgo, Estugarda e Frankfurt suscitaram-me diversas questões. O que aconteceu ainda tem contornos por definir e a investigação decorre, há porém alguns factos sobre os quais importa reflectir.

2. Há aqui uma questão de género: a da violência e abuso sobre a mulher que é mais frequente e tolerada do que a sociedade alemã gosta e costuma admitir.
Quando um homem agride uma mulher comete um crime, isso é claro e indiscutível e a justiça funciona bem na Alemanha.
Existe todavia uma violência que não deixa hematomas: a que desqualifica o apalpão nas nádegas, ou a "esfrega". Colónia (mas também Hamburgo e Frankfurt) é uma cidade onde o abuso se desculpa sob a capa do "liberalismo".
Ouvi o depoimento de uma jovem de 15 anos que chorava copiosamente depois de ter sido abusada, se dirigiu à polícia que se encontrava na praça em frente à Hauptbahnhof e ouviu como resposta "não podemos fazer nada". Foi acompanhada ao interior da estação por dois universitários.
Aliás, a polícia esteve mal, muito mal. Embora tenham reconhecido o "caos" e uma situação da "qual poderiam ter resultado mortos" (citações do protocolo policial), não houve uma intervenção "musculada" comum noutras ocasiões. As queixas foram desvalorizadas, mesmo a duma agente. Só quando o número se avolumou tocaram os alarmes.
Igual lógica de desqualificação seguem as declarações ignóbeis da presidente da Câmara de Colónia que sustentam que as mulheres são responsáveis pela violência que sofreram porque não estariam à distância de "um braço" dos homens. (*)
Pior é passar pelo Facebook e ler quem ponha em causa as (pelo menos duas) violações ocorridas com a argumentação "estava muito frio e elas tinham muita roupa além disso estava muita gente na rua". Há provas forenses das violações. Mas, mesmo que não as houvesse, na noite de Ano Novo, mesmo com frio, muitas mulheres vestem vestidos com sobretudos por cima ( não andam de fato de esqui) e há vários lugares recônditos na praça onde é possível consumar uma violação.

3. Entre os atacantes há segundo o GdP (sindicato da polícia) homens do norte de África, de países árabes e refugiados sírios. Reuniram-se na praça frente à estação para procurarem "prazer sexual" e realizaram-no usando um método comum na cultura árabe. Quem se recorda das violações da praça Tahir no Egipto? É o mesmo método: cercar a vítima e atirá-la de um lado para o outro.
As chefias da polícia de Colónia tentaram abafar este dado, foram todavia desmentidas por vários agentes no terreno que confirmam terem identificado vários refugiados e terem sido vítimas desrespeito à autoridade e até mesmo violência esporádica. Um dos refugiados terá dito "a chanceler convidou-me" e terá rasgado a identificação em frente aos agentes.
Entre as palavras das chefias policiais e a dos agentes no terreno vão mundos. Interessa clarificar porquê ( a minha tese é a da incompetência e rivalidades internas entre a polícia federal e a local e claro a proverbial negligência da "italiana" Colónia)
A comprovar-se tudo isto há que rever a política de deportação, punir exemplarmente os envolvidos, mas sobretido apostar no explicar das regras de um Estado de Direito ( entre elas o respeito pela mulher e o seu corpo) aos 1,1 milhões de refugiados que chegaram à Alemanha até ao momento. Importa ressalvar que falamos em cerca de 16 atacantes identificados ( número que poderá chegar aos 30 ou quarenta) em 1,1 milhões.
Não punir exemplarmente os envolvidos é dar terreno arável ao extremismo de direita e a movimentos xenófobos. Isso diz respeito não apenas aos refugiados mas todos os estrangeiros (incluindo portugueses ) residentes na Alemanha.

4. Os media só tiveram a percepção da dimensão do sucedido após a conferência da polícia de Colónia que teve lugar 4 de Janeiro. Não houve nenhuma tentativa de "silenciar" os acontecimentos.

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(*) Só uma pequena nota de discórdia em relação a este ponto: parece-me que a presidente da Cãmara não estava a dizer que as mulheres são responsáveis pela violência, estaria apenas a responder (muito erradamente, diga-se de passagem) a uma pergunta do género "como é que as mulheres se podem defender?"
Em vez de dizer claramente que não compete às mulheres ter determinados comportamentos, cabe aos homens evitar o comportamento agressivo, ela caiu na asneira de fazer uma sugestão de mero bom senso, que para mais não serve para nada numa situação como aquela. É certo que eu também faço sugestões deste género à minha filha, e ela fica furiosa, porque diz que tem o direito de andar nas ruas que quiser à hora que lhe apetecer. E tem razão. São mulheres como ela que pressionam para que o nosso mundo mude para melhor. E à presidente da Câmara de Colónia compete fazer tudo para que estas mulheres possam andar na rua em segurança, sem precisarem de se guardarem em relação aos homens a distância de um braço - ou sequer a de um pontapé.


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