09 outubro 2015

"onda"

Houve um momento na minha vida em que, por uma vez sem exemplo, soube perfeitamente o que queria quando me perguntaram que presente me haviam de dar. Estava a umas semanas de festejar o cinquentenário (ei! não era cinquentenário, era só 50 anos, apenas um mais que 49) e queria algo realmente especial: a Rachel's Wave do Matthew Cusik.


Tinha visto a fotografia - dessa e de outras ondas semelhantes - numa galeria na Fasanenstrasse, e estava fascinada. O Matthew Cusik fez uma colagem a partir de um mapa-múndi, e depois fotografou. Em tamanho grande, via-se bem que na espuma da onda se juntavam bocadinhos da Antárctida e do Árctico, do Pacífico e da Índia, alguma areia do Saara, coral das ilhas.

Queria uma onda. Essa. Mas custava 300 euros (entretanto duplicou o preço, triste vida) e o Joachim perguntou-me se não seria mais razoável pedir a um pintor amigo nosso que pintasse uma onda. Gosto muito dos seus trabalhos, e é verdade que uma fotografia cem vezes repetida não é o mesmo que uma tela original, e se os amigos já estavam a fazer uma vaquinha... Como eu na altura era muito nova, concordei. Encomendámos a onda ao nosso amigo, que se sentiu capaz de meter o meu Atlântico numa tela. Começou a pintar, fomos ver o seu trabalho: era tudo muito bom mas nenhuma daquelas ondas era a minha. Suspeitei que ela não saberia o que é lutar contra ondas gigantescas, com tamanha carga de adrenalina e gozo que nem se repara que são geladas. Além disso, aquele azul não era o meu azul, e aquela areia não era a minha areia.  


Entretanto, os anos passaram e trouxeram com eles uma espécie de doçura. Olho para estas ondas e penso que a de baixo não está nada mal, não senhor, e talvez fosse boa ideia ir falar de novo com ele.

Mas ontem vi que a Maria Leonardo publicou uma onda no facebook dela, e é muito melhor que qualquer mar do Gerhard Richter. Fiquei a olhar para essa onda poderosa e surda pensando "agarrem-me, que..." 



E assim vai a vida.
Vai e vem, vai e vem, rebenta e recomeça. Sem sair do sítio, sempre renovada, sempre bela.


(A palavra de ontem na nossa enciclopédia era "onda")


4 comentários:

Rita Maria disse...

Tens de levar o senhor a Viana, se calhar acha que ondas são aquelas pontas mais espigadas da sopa báltica.

(não tens nada, tens de não escolher second best quando sabes exactamente o que queres - é sempre mau negócio, depois já temos a coisa mas ainda não temos a coisa e é uma incompletude)
(Queridos outros comentadores: quem alinha numa Onda Crowdsourcing? Ainda temos algum tempo até ao próximo aniversário!)

Helena Araújo disse...

Olha que pensei mesmo nisso! Ele só vai saber pintar a minha onda depois de ter visto (e combatido) o meu mar.

E és muito querida, mas nada de crowd founding. Ainda não gastei esse dinheiro que me deram nos anos, por não saber escolher entre qual das ondas!

Pus a do Cusik como screen saver, e fiquei com a sensação que já me chegava. Entretanto vendem as fotografias (1 de 100, acho eu) a mais de 600 euros. Não sei, não sei. A Maria Leonardo é fantástica e (por enquanto) bastante mais acessível.

De modo que: não façam nada! Ficamos aqui a conversar, conversa vai conversa bem, sem decidir nada e sem sair do sítio. Adoro. :)

snowgaze disse...

Eu alinho no crowdsourcing.

Helena Araújo disse...

:)
Vocês são é tontas!