24 abril 2015

a equipa que produziu, realizou e bla bla bla [ARtMENIANS, estreia hoje na RTP2, por volta das onze da noite]


Já contei que o nome do documentário é uma criação da Ana Vieira. A Ana, que vale o seu peso em ouro - e podia pesar o dobro. Também é dela um momento extraordinário do filme, quando se fala das crianças orfãs, e do trauma que é herdado pelas gerações seguintes. Gostava muito de saber o que é que a Ana toma no café da manhã, que lhe permite continuar criativa, calma e bem disposta 24 horas mais tarde. Ou 36. Ou 48, que eu vi.

Podia contar muito sobre o Pedro Magano, mas fico-me apenas por dois apontamentos: o ar tão contente dele quando, no fim da nossa primeira viagem à Arménia, me dizia que tinha ali material de que o Ricardo ia gostar muito. E o que lhe custou a segunda viagem, o trabalho intenso durante mais de quatro semanas, as saudades da filhinha, que nessa altura tinha meia dúzia de meses.

O Pedro Ferreira, a sua enorme competência e a sua ainda maior paciência. Os seus olhos brilhantes ao passar-me com orgulho o filme já quase terminado, avisando-me que depois do tratamento de cor e de som aí é que ia ser. O seu entusiasmo - talvez lhe possa até chamar amor - por alguns momentos do filme, a alegria que nem a maratona da montagem conseguiu abafar. 

E o José Pedro Rosado (mais um Pedro! será que o Ricardo escolhe pelo nome as pessoas com quem trabalha?) que fez algumas animações extraordinárias. Que me faz sorrir com a sua animação para ilustrar o mito da origem dos arménios (digam vocês: que vos ocorreria como animação para um texto como o que se segue? "A arca da Noé pousou no monte Ararat, Noé e os seus filhos desceram para o vale e começaram a fazer o primeiro vinho do mundo. Noé falava com Deus na mesma língua em que falava com os seus filhos."), e que, depois de me aturar muitas variações de "este mapa mais assim, aquele mapa mais assado", fez uma animação que sintetiza muito bem as andanças de quase três mil anos de História dos arménios. 

A Elke Hartmann, a historiadora que nos ajudou imenso com os textos históricos e aparece várias vezes ao longo do filme. Ela fala, para além dos corriqueiros alemão, inglês e francês, o arménio, o árabe e o turco (e russo, se bem me lembro). Fala e escreve. Mostrava-me fotografias de comícios dos Jovens Turcos, "olha para isto, os cartazes dizem o mesmo, só que o dos turcos está escrito com letras árabes e o dos arménios está escrito em turco com letras arménias", e logo a seguir comentava a actualidade, falava-me do IS e dos primeiros salafitas, que começaram por ser uma espécie de Martinho Lutero no contexto muçulmano, e eu a ouvir, pensando que adoraria ser sua aluna. A Elke, com quem gravámos uma entrevista de quase duas horas, que nos deixou fascinados e ao mesmo tempo preocupados, sem saber o que cortar de todos aqueles tesouros. 

E, last because first, o Ricardo Espírito Santo. O ar emocionado com que me olhou em silêncio quando entrei na sala onde ele estava a ver pela primeira vez o filme completo.
O Ricardo, apanhado entre dois fogos terríveis: eu, e as Finanças.
Eu, que comecei a carburar demasiado tarde criando um stress terrível à equipa, eu que não conseguia cortar nada, e que dizia em tom tétrico "ai! despedaças-me o coração!" de cada vez que ele sugeria tirar uma ou outra coisa.
E as Finanças, que resolveram perseguir impiedosamente a Terra Líquida Filmes como se se tratasse de terríveis criminosos. Não sei como é que o Ricardo conseguiu a força para lutar tendo contra si a máquina poderosíssima e cega do Estado. Por trás do documentário sobre os arménios, que tentámos fazer o melhor que soubemos, há a história de um milagre de resistência quotidiana: um homem que encontra em si a força que lhe permite continuar a fazer o seu trabalho, aguentar a sua empresa viva e manter os empregos dos colaboradores, apesar de essa empresa estar a ser perseguida pelo Estado.


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