27 janeiro 2015

27 de Janeiro de 1945 - libertação de Auschwitz










 A ARD escolheu Esther Bejarano, uma prisioneira que tocava na orquestra de Auschwitz, para assinalar este dia. Uma mulher com uma vitalidade impressionante, que conta que em Auschwitz decidiu sobreviver para se vingar. E vinga-se bem, diz ela: vai às escolas contar o que viu e viveu.

Traduzo (rapidamente) partes de uma entrevista que deu à ARD. As fotografias são do mesmo site.

Esther Bejarano era uma jovem mulher quando foi deportada para Auschwitz. Um lugar na orquestra feminina salvou-lhe a vida. Em conversa com o tagesschau.de conta o que sofreu no campo e como viveu a libertação. 


- O que significa o 27 de Janeiro para si?
- É o dia da libertação de Auschwitz, e do princípio do fim do fascismo de Hitler. Mas nesse dia em Auschwitz não havia muitos prisioneiros. Apenas os que não podiam andar, ou estavam demasiado doentes para sair nas marchas da morte. Os que estavam nas marchas não foram libertados nesse dia. Foi um grande dia, mas não foi ainda a libertação completa.

- Onde estava a 27 de Janeiro de 1945?
- Já não estava em Auschwitz. Os nazis tinham seleccionado os chamados „Mestiços" – e eu tinha uma avó cristã. Por isso, depois de sete meses em Auschwitz, fui enviada para o campo de Ravensbrück com 70 mulheres que também tinham pais ou avós “arianos”. Era um campo de concentração para mulheres horroroso, mas não era um campo de extermínio. Fui libertada em Maio de 1945. Estávamos numa marcha da morte, em Mecklenburg, eu e sete mulheres que também tinham vindo de Auschwitz para Ravensbrück. Não sabíamos para onde nos levavam, e ouvimos um SS dizer a outro que já não podiam disparar. Foi aí que decidimos abandonar a marcha. Uma após a outra fugimos para a floresta. Vagueámos pela região e acabámos por chegar a uma quinta. Deixaram-nos dormir num palheiro. No dia seguinte o lavrador veio ter connosco e disse „Se forem para a esquerda encontram os americanos, se forem para a direita encontram os russos.” Mas não tivemos de tomar nenhuma decisão, porque nesse momento apareceram dois tanques americanos. Mostrámos aos soldados os números tatuados no braço. Os soldados içaram-nos para os tanques e levaram-nos para Lübz, onde nos convidaram para ir a um restaurante. Eu e uma amiga minha sabíamos inglês e contámos o que tínhamos vivido – inclusivamente sobre a orquestra de raparigas de Auschwitz. Daí a pouco entrou um soldado com um acordeão e disse que era altura de cantar. A seguir ouvimos uma grande barulheira na rua: soldados do Exército Vermelho tinham entrado na aldeia e anunciavam que o Hitler estava morto e a guerra tinha terminado. Os soldados americanos e russos festejaram juntos e queimaram uma grande fotografia do Hitler, enquanto eu tocava acordeão. Foi fantástico.

- Antes da libertação, das marchas da morte e de Ravensbrück, esteve em Auschwitz. Havia lá algo parecido com uma normalidade quotidiana?
- Naturalmente, havia um quotidiano, e era horroroso. Trabalho – no princípio tinha de carregar pedras. Das sete da manhã às sete da noite. As pedras eram imensamente pesadas e eu era uma miúda pequena e frágil. Tinha mesmo de sair dali – e tive sorte. Uma noite um dos prisioneiros veio em busca de mulheres que tocassem algum instrumento. Disse logo que sabia tocar piano. Mas não havia pianos Auschwitz. Ele disse que havia um acordeão, e eu devia tocar nele "Du hast Glück bei den Frauen Bel Ami". Nunca tinha tocado um acordeão, mas menti e disse que já não tocava há muito e precisava de alguns minutos para me habituar de novo. Fui para um canto da barraca experimentar. A mão direita não tinha problema, porque é como no piano. Mas o acompanhamento na mão esquerda – não fazia a menor ideia. Um dos botões estava marcado, era o dó maior. A partir daí, descobri os outros. Finalmente, toquei a música que queriam, e aceitaram-me na orquestra. Caso contrário, teria sido o meu fim.

- Quando é que os SS de Auschwitz deixavam tocar uma orquestra?
- Punham-nos ao portão a tocar quando as colunas de trabalho saíam de manhã e regressavam à noite. Mais tarde, ocorreu-lhes que também devíamos tocar quando chegavam os transportes da Europa, em cais diferentes. Nós sabíamos que estas pessoas iam directamente para as câmaras de gás. Elas acenavam-nos. Provavelmente pensavam que um lugar onde há música não pode ser muito mau.

- 70 anos mais tarde, a música ainda é muito importante para si. Faz parte da banda Microphone Mafia. O que há de especial nesta banda de rap?
- Na Microphone Mafia encontram-se três gerações e três religiões num palco. Entre outros temos um muçulmano, um católico – e eu e o meu filho, que somos judeus. Queremos ser um exemplo para todos os que pensam que as pessoas que têm raízes diferentes não podem viver em harmonia umas com as outras. Nós entendemo-nos lindamente.


1 comentário:

bettips disse...

Fico... sem comentário comum: a vingança assim, serve-se quente. A todos e a mais gente, quanto possível. Extraordinário!
Abç