03 maio 2014

em casa de Tigran Mansurian

O compositor Tigran Mansurian abriu-nos a sua casa para uma entrevista. Enquanto se dava um jeitinho ao cenário, ele começou a trabalhar numas pautas e esqueceu-se que estávamos ali a meio metro dele, a mexer ora os livros para a direita ora um retrato para a esquerda. Ri-me um bocadinho do seu alheamento, mas no fundo estava muito impressionada com tamanha capacidade de concentração. Deixou-se filmar à mesa, a trabalhar, e depois tocou para nós uma peça que tem andado a compor, e repetiu pacientemente as vezes que foi preciso.

Na parede em frente à mesa de trabalho tem um quadro do Aragats, que imediatamente me lembrou um comentário de Alexander Liebreich, o maestro da Münchener Kammerorchester: "os seus trabalhos combinam leveza e solidez de forma extraordinária". Aragats, o ponto mais alto da Arménia.

No fim, queria convidar-nos para tomar chá com ele. Mas era tarde, tínhamos de sair a correr para o próximo ponto da agenda - e saímos, levando num saco os bolos que tinha preparado para nós.

Em Berlim, um violista português que foi aluno da Kim Kashkashian tinha-me dito que Tigran Mansurian é um dos compositores mais interessantes do nosso tempo. Acreditei, que nestas coisas sou muito de emprenhar pelos ouvidos e além disso estou completamente rendida ao seu Requiem. Gostei de saber que este ano, para festejar o seu 75º aniversário, fizeram vários concertos na Europa e nos EUA, e publicaram inúmeros artigos (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, etc.) em sua homenagem. Vale muito mais elogiar e apoiar os artistas em vida, que encher o facebook e os jornais com exclamações, quando já pouco lhes adianta.

Mansurian é uma espécie de "super star" da Arménia: conhecido por todos, e muito estimado. Tanto os condutores de táxi como os jovens com quem se cruza na rua, todos o cumprimentam com deferência e alegria. Assisti a uma cena de adolescentes a fazer fila para se fotografarem com ele, para o facebook. Dizia que sim a todos, com o mesmo sorriso acolhedor com que nos deixou mudar móveis e livros na sua sala. Via-os por trás: depois da foto, a sua mão continuava pousada no ombro do outro por uns momentos, enquanto trocavam algumas frases.
Não conheço nenhum outro compositor de música erudita que goze desta celebridade. E não conheço nenhum "super star" que se mostre tão acessível.
Mesmo sabendo que esta é a sua forma natural de estar com as pessoas, sinto-me muito honrada e grata pela forma como soube fazer-nos sentir acolhidos, e como nos ajudou.
E dado que quero acabar este post ainda hoje, não vou dizer nada sobre a sua formidável assistente, a Chaghig, que na Arménia é ainda mais que a minha sorte grande, o totoloto e o euromilhões, tudo numa pessoa só.






5 comentários:

snowgaze disse...

<3 Lindo.

Gi disse...

Uma viagem muito interessante. Vou ter de googlar e youtubar muita coisa.

Helena Araújo disse...

Youtuba o Requiem, vais ver!

Paulo disse...

Não seria de todo má ideia termos o Requiem na próxima temporada, a acompanhar o lançamento do filme.

Helena Araújo disse...

Falei disso na Gulbenkian, e também ao RIAS. Mas nessa semana o RIAS está em digressão por outros lados, e quem vai a Lisboa mostrar a música arménia vai ser o Jordi Savall. Sabes que esta música o tem ajudado muito a fazer o luto da Montserrat?
Em todo o caso: o Requiem tem de ser mostrado em Portugal. Aquilo é lindo, do outro mundo.