26 fevereiro 2014

para o Nuno Abrantes Ferreira, que num momento de introspecção descobriu que vive num esgoto


Sobre esta interessante crónica do Nuno Abrantes Ferreira, tenho uma pergunta e um apontamento:

A pergunta: quanto é que o P3 paga por estes textos? É que - como dizia aquele político brasileiro honesto no slogan com o qual concorria às eleições - também quero mamar desta vaquinha!

O apontamento: há alguns anos, quando a Alemanha se deu conta de que estava a viver acima das possibilidades do tratado de Maastricht, e se viu obrigada a pôr um forte travão nas despesas públicas, houve três rubricas que não foram afectadas pelos cortes: a Educação, a Investigação e o apoio às crianças das famílias com menores rendimentos, para poderem escapar ao círculo vicioso da pobreza.
"A nossa única riqueza são as pessoas", disse-se. "Não podemos desperdiçar capacidades - cada um deve ter a possibilidade de dar o melhor de si."
E ainda: "não nos podemos dar ao luxo de ter pobres."

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Gosto muito da ideia de os pobres serem um travão ao enriquecimento de um país (infelizmente a história alemã recente, desde Schröder, tem dado passos preocupantes noutra direcção), mas vou concentrar-me na questão do desperdício de capacidades, e da Educação como elemento fundamental de criação de riqueza. O esgoto no qual o Nuno Abrantes Ferreira vive é uma self-fulfilling prophecy que se alimenta da sua mentalidade, tão diferente da dos países europeus mais ricos. Em certas regiões da Alemanha a escolaridade já era obrigatória, para rapazes e raparigas, em finais do século XVI. O exemplo foi alastrando, e a Constituição da República de Weimar instituiu a escolaridade obrigatória para todo o país em 1919. Por essa altura, já havia pedagogos um pouco por toda a Europa a olhar para o Ensino como forma de promover e realizar o ser humano, muito para lá da mera transmissão de informação. Enquanto isso, no Parlamento português discutia-se se era realmente importante que as pessoas soubessem ler, e até se invocavam os lírios do campo e os passarinhos dos montes para provar que é possível ser feliz sem essas modernices. A propósito: pouco depois do 25 de Abril, uma empregada da minha avó, uma velhinha analfabeta muito imbuída da sabedoria do bom povo, comentava que a Igreja tinha aberto os seus seminários a rapazes pobres que lá aprenderam a ler, e para quê? para agora serem todos comunistas.

Em suma, senhores do P3: quanto me pagam para eu largar no vosso espaço um belo naco de liberdade de expressão? Gostava muito de desenvolver esta tese:

O português quando nasce, nasce sempre para ser grande. Mas por qualquer razão nunca passa de mais um pequenino. E a culpa nunca é dele. Nem é da crise, dos mercados, da Europa ou do azar. A culpa é de Topo Gigios que insistem em pensar como o Nuno Abrantes Ferreira, por muito que a experiência de outros países demonstre que o que os faz avançar é a ousadia e a teimosia de quererem ser grandes.


12 comentários:

jj.amarante disse...

É este tipo de pensamento que devia ser objecto de transformação (supressão) pelas verdadeiras reformas estruturais que o país precisa em vez das reduções de salários, pensões e serviços do Estado que actualmente são abusivamente chamadas de "reformas estruturais".

A. disse...

É o texto mais cretino que li nos últimos tempos.
Mas ainda bem que a Deolinda não conseguiu acabar os estudos, senão quem é que haveria de limpar a casa do sr. Nuno e ainda lhe agradecer a oportunidade?

Helena Araújo disse...

jj.amarante, sem dúvida!

Luna, tens a certeza que é o texto mais cretino que leste nos últimos tempos? Não foi a ti que disseram que as bolsas de investigação são ajudas dadas a preguiçosos que querem viver do Estado sme trablahar?
Cretinice por cretinice...

(isto está tudo louco, é o que é)

Ant.º das Neves Castanho disse...



Se o Messi tivesse lido este sr. Nuno quando era pequenino e "deficiente físico", a esta hora poderia estar, muito útilmente, a limpar as mini-retretes de algum infantário dos arredores de Buenos Aires!

E os paizinhos dos alunos agradecer-lhe-iam a sua dedicação com palmadinhas nas costas e dar-lhe-iam porventura uma gorjeta, de vez em quando, para ele ao final do dia lhes dançar o Tango - assim com uns passos muito belos, originais e inconfundíveis, pelo menos para um humilde contínuo (quiçá analfabeto)...

Ant.º das Neves Castanho disse...


Já agora, Helena, fiquei muito curioso com esta tua afirmação: «há alguns anos, quando a Alemanha se deu conta de que estava a viver acima das possibilidades do Tratado de Maastricht e se viu obrigada a pôr um forte travão nas despesas públicas, houve três rubricas que não foram afectadas pelos cortes».

Quando falas em "forte travão" (como se isso fosse do domínio do senso comum, ou da cultura geral...), isso representa aproximadamente QUANTO, por exemplo em termos percentuais do PIB alemão (à época, digamos)?

E quando mencionas esses "cortes" - os tais que pouparam as referidas três rubricas -, estás a falar concretamente de QUÊ?

Dá-nos só os "grandes números" para leigos, claro. Deixa lá os "trocos" para os especialistas...

Acredito que esta clarificação essencial - o que foram os cortes na despesa pública alemã e qual a sua verdadeira intensidade relativa - ajudaria muito a pôr em ordem e a contextualizar devidamente a conversa sobre austeridade aqui em Portugal.

Obrigado e BOM CARNAVAL!

Helena Araújo disse...

Olá,
agora não tenho tempo para ir atrás desses números, mas tens aqui um gráfico da evolução do peso da dívida pública alemã no PIB:
http://de.wikipedia.org/w/index.php?title=Datei:Staatsschuldenquote_in_DE.pdf&filetimestamp=20130323105249&

Não me lembro dos detalhes, excepto que congelaram os projectos de obras grandes (como o Humboldt Forum, que é um edifício no centro de Berlim no lugar do antigo palácio do Kaiser, reconstituindo a sua fachada) e, uns anos mais tarde, que uma colega minha do coro do MNE se queixava que não sabiam como é que o consulado alemão em Xangai ia pagar a renda daí a dois meses, porque o dinheiro do ano se tinha acabado e Berlim não mandava mais.

Ant.º das Neves Castanho disse...



Obrigado, Helena. Não havia pressa nenhuma...

Depois de ler o que envias voltarei ao assunto, porque assim de repente vais decerto concordar comigo que só cancelar um centro comercial - por mais "faraónico" que ele fosse - e não pagar a renda de alguns consulados - e mesmo que fossem todos! -, para um PIB colossal como o alemão, não sustenta de todo uma afirmação tão potente como "forte travão na despesa pública" nem valoriza os tais três items que foram poupados pelos cortes, pelos vistos no meio de outros trinta ou trezentos semelhantes que também terão sido poupados...

Se isso é "austeridade", então uma chispalhada à portuguesa é um prato dietético!

Helena Araújo disse...

Viste que cortou 2% do PIB logo no primeiro ano? E neste momento o peso da dívida pública no PIB está mais de 4% mais baixo do que na altura em que começaram a travar?
Achas isso pouco?

Helena Araújo disse...

Dei-te dois meros exemplos avulsos. Não te falei das escolas de Berlim sem professores, por exemplo. Das turmas com trinta alunos, o que é considerado normalíssimo. Etc.

Helena Araújo disse...

http://www.bundesfinanzministerium.de/Content/DE/Bilder/Bildstrecken/Mediathek/Infografiken/Bundeshaushalt/Stabile-Haushalte/stabile-haushalte-haushaltsentwicklung-03.jpg?__blob=normal&v=14

Encontrei um gráfico curioso: a laranja é o quadro actual do endividamento público alemão segundo os critérios de Maastricht. A azul claro é o que seria se não tivesse havido crise financeira. E a azul escuro é o que seria se não tivesse havido crise financeira e crise do Euro. A diferença entre as duas linhas azuis mostra o volume do endividamento público alemão para os fundos de estabilização do euro.

Ant.º das Neves Castanho disse...

H., muito obrigado.

Hei-de ir ver tudo com atenção, assim que puder. Este assunto é muito importante. O tempo é que não estica mais...

E mto obrgdo tb pela tradução do W. K. lá em riba, sobre a nossa Ucrânia (também lá temos bons amigos, entre os quais uma antiga empregada e ama do César...).

Ant.º das Neves Castanho disse...

Obrigado, Helena.

Hei-de ver com muita atenção, assim que puder. Este assunto é importante...