15 dezembro 2013

a minha vida dava duas ou três



Ontem levantei-me de madrugada para trabalhar. Trabalhei. Fui fazer de taxista a um simpático que me ia fazer de pombo-correio (atenção, Rita e amigos que estão à espera dos tais calendários: Santa Claus is coming to town).
Aproveitei estar em Schönefeld para ir à Ikea que é lá perto. Imaginei que, sendo tão longe do centro da cidade, estaria mais vazia - o que me convinha, porque preciso de alguma calma para me começar a orientar sobre uma cozinha para a casa nova. Aquela Ikea é pequena e com um estranho gosto, pelo que não me orientei, e por isso fui à Ikea de Schöneberg, feita com muito mais espaço e dinheiro. Outra clientela, outra loja, sem dúvida. Se me voltarem a perguntar se ainda há diferenças entre Berlim Ocidental e Berlim Leste, já sei o que responder: vão às Ikeas. Para este meu estudo comparativo ser completo, devia ter ido também à terceira loja em Berlim, mas o tempo não chegava porque tinha muito trabalhinho em casa à minha espera.
Fui para casa, trabalhei.
À noite fui a um concerto em Neukölln: "Extravagante, música portuguesa", feita por não portugueses, com uma interessante mistura de ritmos, instrumentos e técnicas vocais. Ora é em feita, e que nos sirva de lição: pusemo-nos com aquilo da globalização cinco séculos antes dos outros, a miscigenação, isso tudo, e depois os outros vão e ultrapassam-nos pela direita - põem-se a cantar o Milho Verde em canto difónico, lá dos confins da Mongólia, e em espanhol. E que bem cantaram esse Milho Verde!
Entre muita conversa e um workshop muito rápido com o Daniel Pircher sobre como cantar simultaneamente dois tons diferentes, já passava da meia-noite. A Christina, à nossa espera na Russendisko, mandou um sms a perguntar onde é que eu estava. "Vamos a caminho, guarda um lugar na pista para nós", essemessámos rapidamente. Primeiro veio um "hahahaha, OK" e logo a seguir "Mãe! A Russendisko está a acabar!"  Não era bem a Russendisko, era só o Wladimir Kaminer que ia para casa, e ia podre de cansaço: no dia anterior tinha tido um show no Norte da Alemanha (as leituras dele são shows de kabarett: ele é capaz de falar meia hora sem olhar para papel algum, e manter o público a rir às gargalhadas durante todo esse tempo), e nesse dia já tinha ido a Viena fazer um programa de televisão, após o regresso fora entrevistado para uma revista alemã, a seguir teve uma leitura, e acabou na Russendisko a fazer de DJ. Um dia destes começa a não dar vazão, e vai ter de delegar. Às tantas ainda se vê obrigado a arranjar alguém que lhe escreva os livros, enquanto ele faz o resto do trabalho.

Esta manhã levantei-me de madrugada para fazer um servicinho de táxi, e agora estou aqui a trabalhar.
Daqui a nada vou a um concerto da Mitsuko Uchida. Mais valia que fosse um do Evgeny Kissin, porque a Mitsuko Uchida toca de uma forma muito suave, e eu a dormir cinco horas por dia há quase uma semana, isto ainda vai dar mau resultado.

Precisava de duas ou três vidas para acomodar o que ultimamente tenho andado a fazer nesta minha.

2 comentários:

CCF disse...

Sei como é. No entanto, sempre que penso em não ter trabalho, vejo como seria pior do que esta vida espalhada por vários trabalhos e extremamente cansativa.
~CC~

Helena Araújo disse...

Pois é.
Mas eu não estava propriamente a queixar-me. Era apenas um relatório de actividades. Relatório de maratonas... ;-)