23 outubro 2013

esta manhã em Berlim

Esta manhã dei uma voltinha por Berlim com o meu telemóvel jurássico:



 

Este talho da empresa Neuland deixa-me deslumbrada. A carne é apresentada quase como peça de ourivesaria. Algo muito valioso. Não custa o preço do ouro, mas para lá caminha...
E nem é carne biológica. Os animais comem ração normal, mas são criados em condições aceitáveis: com espaço para se mexerem e saídas para correrem em liberdade; vivem em grupos de tamanho aceitável, sem demasiado stress. Se eu fosse capaz de levar os meus próprios discursos às suas últimas consequências, reduzia o nosso consumo de carne para 1/3, e passava a comprar aqui. 



 

"A responsabilidade morreu"
Pequeno contributo de um vizinho para o civismo na nossa rua. As pessoas irritam-se com os donos dos cães que recolhem o cocó do bicho mas o deixam dentro de um saco plástico nos canteiros das árvores. 
Parece muito estúpido, não é? Perguntei a uma das pessoas que faz isso porque é que não põe o saco no caixote do lixo que fica a uns metros da árvore, e ela explicou-me que é por respeito aos sem-abrigo. Para que eles não sujem as mãos com os detritos caninos quando procuram no lixo garrafas para vender. Pergunto-me o que é a responsabilidade. Que responsabilidade? Porque morreu, quando morreu?
Nem sei que dizer sobre isto: num dos bairros mais caros da capital de um dos países mais ricos do mundo há pessoas a remexer nos caixotes de lixo, e outras que se preocupam com as mãos sujas dos pobres, e outras que se chateiam com o mau aspecto dos passeios.

No entretanto, parece que sobre o novo habemus governum não há nada de muito original para dizer:


 


Já no que diz respeito ao habemus oposiçãum há comentários muito interessantes: o partido Die Linke é o líder da oposição, mas de pouco lhes serve: os partidos do governo têm 504 deputados no Parlamento, os da oposição têm 127. Como o "tempo de antena" depende do número de lugares, o Parlamento corre o risco de se tornar um belo lugar de monólogo dos poderosos - os Linke podem falar seis minutos por hora, os Verdes outros tantos. Pior ainda: a oposição tem cerca de 20% dos lugares, mas a Constituição exige um quórum de 25% dos deputados para se poder pedir uma investigação parlamentar, enviar um projecto de lei para o tribunal constitucional, ou, de um modo geral, fazer valer outros direitos das minorias parlamentares.
Os Verdes falam em levar o caso ao Tribunal Constitucional, e os Linke querem mudar a Constituição.


11 comentários:

jj.amarante disse...

A vida é sempre complicada, mesmo para os fundamentalistas que a querem tornar simples...

Gi disse...

"Num dos bairros mais caros da cidade", há quem não separe o lixo e misture as garrafas com os detritos orgânicos, quando podia facilitar o trabalho dos sem-abrigo....
Desculpa, hoje é dia de humor negro...

Helena Araújo disse...

Gi, eu não quis fazer humor negro quando escrevi, mas eescrevi essa sequência assim de propósito.
É tudo tão complicado.
Num país com tantas instituições para cuidar dos sem-abrigo, ainda os há por aí a revolver caixotes do lixo.
O que é que está a correr mal? Ou será que alguns deles fazem questão de não se meterem em instituições?

Em todo o caso: agora que o dizes, dou-me conta que era mais inteligente deixar as garrafas no chão, e meter o cocó nos caixotes...

Anónimo disse...

Muito preocupante a anulação da oposição parlamentar.

Quanto ao resto um texto excelente como sempre.

Desculpa o estilo teegráfico mas precisa de um da com 48 horas. Ohmmm.

Helena Araújo disse...

Helena,
a situação é preocupante, mas, se bem conheço os alemães, vão saber resolver o problema muito em breve.
Assim é que não pode ficar, porque transformava o Parlamento numa caricatura.
O meu primeiro impulso foi: a oposição devia ter metade do tempo de antena, para que os debates fossem realmente debates.
Mas depois ocorreu-me que isso se tornaria um problema se um dia a extrema direita entrasse para o Parlamento. Porque eles fazem umas afirmações muito simples, que se dizem em meio minuto, mas exigem respostas de mais de meia hora, para lhes explicar princípios que qualquer adolescente alemão devia saber (o que acontece em Dresden é assustador).

Cristina Torrão disse...

Cá em casa, estamos a ficar cada vez mais vegetarianos, a reduzir muito o consumo de carne, mas admito que é mais fácil sem filhos. Sem marido, seria ainda mais fácil, eu era bem capaz de ousar dar o passo definitivo... Não quero, com isto, despachar o marido, que está primeiro do que os animaizinhos ;)

Quanto ao cocó, pois é, já ouvi falar de iniciativas em que se põem à disposição caixotes próprios para deixar garrafas (que não os "vidrões") para que os sem-abrigo não tenham de remexer o lixo. Agora, deixar os saquinhos com o dito cujo no chão, é que não me parece...

Aqui, em Stade, há outro fenómeno. Intrigava-me muito ver, por vezes, os saquinhos do cocó espalhados nas proximidades de um caixote do lixo, quando, no dia anterior, se encontravam lá dentro! Até que descobri o mistério: são os corvos! Há por aqui muitos corvos (espero que não sejam fãs do Hitchcock), até já vi um corvo disputar um ratito com um gato, num dos meus passeios com a Lucy. E são eles que, à procura de comida, nos caixotes do lixo, tiram os sacos do cocó cá para fora! Já vi. E esta, hein?

Conde de Oeiras e Mq de Pombal disse...



O que é que acontece em Dresden?

Helena Araújo disse...

Um floclore triste.
Os deputados do NPD levam ao Parlamento questões que já estavam resolvidas há muito tempo (por exemplo: os alemães não se podem armar em vítimas no que diz respeito à II GM, tendo em conta que foram eles quem começou e tendo em conta o que fizeram) e depois os outros deputados gastam imenso tempo a explicar-lhes porque é que a proposta deles não pode ser aceite.
Outro dia os do NPD entraram no parlamento de fato, mas por baixo tinham camisolas de uma marca muito apreciada pelos neonazis (Thor Steiner), e que não é permitido usar no Parlamento - era uma manifestação contra a proibição do uso de certas marcas. Foram postos na rua, ficaram impedidos de frequentar as 3 sessões seguintes. Mas só saíram depois de se chamar a Polícia.
E é assim que vai a vidinha...

Conde de Oeiras e Mq de Pombal disse...



Obrigado, Helena.

Será que proibir é mesmo a melhor estratégia para este tipo de sensibilidades?

Por que é que essa marca é proibida?

O eterno problema do proibir é que o fruto proibido...

Envergar um tipo de roupa pode causar algum mal?

PS: Não te sintas obrigada a responder-me, são apenas desabafos de quem tenta educar bem e tem dúvidas...

Helena Araújo disse...

Os símbolos do nazismo são proibidos na Alemanha. Não querem que as pessoas se habituem a conviver com isso. Essa marca tinha um símbolo de uma força paramilitar nazi.
Se houvesse um partido político cujos deputados fizessem questão de entrar no Parlamento com roupa e símbolos associados à PIDE, o que achas que se devia fazer?

Conde de Oeiras e Mq de Pombal disse...


Pois, é verdade. No entanto, o facto de não ser proibido retirava logo força a essa forma de "protesto"! E se fosse, por exemplo, ridicularizado por uma marca com um símbolo semelhante, a parodiá-la, sei lá...

Usar a simbologia nazi é chocante num regime anti-democrático. No atual regime alemão, com todas as garantias que dá de respeito pelos Direitos Humanos e pelo Direito, não sei que mal real pode fazer uma camisola com um duplo S, ou algo assim. Até pode chamar mais a atenção para a irracionalidade e a aberração desse tipo de regimes.

Claro que pode ferir susceptibilidades, sobretudo as das vítimas e seus descendentes, eu compreendo bem isso. Não sei é se o balanço de ganhos e perdas desse tipo de proibições estará bem contabilizado...

Será que a foice e o martelo estão também proibidos na Rússia?

Bom fim-de-semana...