21 março 2013

"paga o justo pelo pecador"

Tenho estado a tentar compreender porque é que não me choquei tanto com a condição imposta ao Chipre, de ser o próprio país a arranjar 1/3 do montante pedido ao grupo euro. Não vou chover no molhado sobre tirarem quase 7% às pequenas poupanças, e não vou averiguar se a ideia de taxar os depósitos foi imposição europeia ou proposta do governo cipriota. O que me interessa agora é perceber porque é que a mim, pessoalmente, não incomoda a ideia de parte da solução ser encontrada no próprio país, e de taxarem as poupanças dos particulares. Mais: porque é que, quando ouvi falar sobre a medida para o Chipre, não fiquei com medo de que a seguir vão taxar as minhas próprias poupanças? É fácil: porque já antes sabia que isso me pode acontecer - corrijo: que provavelmente isso me vai acontecer. Desde a falência dos bancos islandeses que sei que nada é seguro no sistema bancário. Até antes disso: na primeira vaga da crise financeira, quando vários bancos alemães estavam prestes a falir, o governo foi às caixas de poupança (as Sparkassen) buscar todas as suas reservas. Quem me contou foi um amigo, director numa Sparkasse: "Andámos nós estes anos todos a trabalhar com critérios e responsabilidade, enquanto os outros usaram o dinheiro como se estivessem no casino;  agora viu-se o resultado, e a Merkel veio-nos extorquir as nossas reservas de segurança, dois mil milhões de euros, dizendo que temos de ser solidários. Paga o justo pelo pecador, e não há nada a fazer."
Uma pessoa ouve isto, ouve repetidamente a história de que as poupanças dos particulares têm sensivelmente a mesma dimensão da dívida do Estado e que em algum momento vai ser necessário fazer um reajustamento, e vai-se habituando mesmo à ideia de que, neste país, "intocável" não é um atributo absoluto da propriedade privada. Se for necessário, para evitar um mal ainda maior, irão com certeza taxar-me as poupanças, e o que mais se lembrarem.

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