10 fevereiro 2013

Berlinale 2013 - Shirley, visions of reality

(foto)

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Não é boa ideia ir ver este filme muito depois do jantar, tendo dormido menos de quatro horas na noite anterior. Eu que o diga. E não fui a única que bateu uma sonequinha - ou andam todos na mesma vida atribulada, ou então este filme devia ser vendido como tratamento para a insónia. Pelo menos para o tramento da insónia de filisteus como eu. 

Era a première mundial do filme, até estava presente uma ministra austríaca (palmas para a ministra). A produtora estava muito nervosa, porque aquele era o momento que culminava oito anos de trabalho, porque o écrã do cinema era descomunal (23,5 x 12,7m), e portanto enfim (palmas para a produtora).

O filme começou, eu comecei a lutar contra o sono, os dois espectadores à minha esquerda perderam rapidamente o combate. Os da fila atrás também. Eu dormia aqui e ali, mas só por uns momentos - quando acordava, ainda estava na mesma cena, apenas duas ou três frases à frente.

Quando chegou ao fim, as palmas tardaram. Não me parece que este vá ganhar o prémio do público.

Shirley - Visions of Reality tem um extraordinário trabalho de iluminação, reproduzindo tão bem a geometria dos quadros de Hopper que cheguei a pensar que teriam pintado as próprias sombras no cenário. O mobiliário, feito em papier maché (segundo me pareceu), acentua o carácter de quadro vivo. As cenas vão-se sucedendo, quadro após quadro, antecedidas pelo anúncio da data (sempre o dia 28 de Agosto de algum ano entre 1928 e 1963) e um noticiário radiofónico do dia.
Ao longo desses trinta anos, a actriz praticamente não envelhece - o que me fez sorrir, lembrando que a modelo de Hopper era a sua própria mulher, e nos seus quadros atravessa as décadas com um um corpo à margem do tempo.

Escolhi esse filme porque a ideia me pareceu muito boa e as fotografias eram apelativas. Uma vez lá dentro, arrependi-me: Hopper é um pintor da solidão e do inalcançável. Ao dar voz aos habitantes dos seus quadros, destrói-se a irremediável solidão que é a sua marca. Ao inventar-lhes uma história, banalizam-se.  

3 comentários:

Carla R. disse...

Quando fui ver a tal exposição-retrospectiva, o audio-guia referia muitas vezes que a critica e o publico procuravam sempre dar uma interpretação aos quadros. Interpretações que Hopper negava quase sempre.
E durante a exposição ouvi varias pessoas à frente de um quadro, a tentar dar um significado a uma postura.
Andaremos assim tão desesperados por explicações, que não podemos aceitar a arte "apenas" como ela é ?

Carla R. disse...

Mas mesmo assim quero ver este filme. Agora sei que tenho que beber um café antes. Sempre a aprender neste blogue...

Helena Araújo disse...

Não vás para lá muito tarde e com apenas 4 horas de sono...
O filme é um extraordinário exercício estético. Vale muito por isso.
Mas "profana" os quadros do Hopper, o que é pena. E é lento, leeeeeeeeento.

Talvez tivesse sido melhor fazê-lo bem mais curto, e sem palavras. Simplesmente animar aqueles quadros, dando-lhes um antes e um depois igualmente misteriosos e inacessíveis. Aehm... esta ideia só me custou 10 segundos de neurónios - talvez não seja genial. (hihihi)