28 fevereiro 2013

a Democracia em chamas

(foto)

Foi há oitenta anos que o incêndio de um edifício acelerou a História.
Do muito material existente sobre este momento, escolhi este filme de 4 minutos com imagens históricas, cuja tradução (rápida, com cortes e anotações) se segue. 
(se me disserem como passar isto para o youtube, eu ponho as legendas)

Na noite de 27 para 28 de Fevereiro de 1933, alguém deitou fogo ao edifício do Reichstag, o Parlamento alemão. As chamas não destruíram apenas o edifício com mais de 60 m de altura, mas também o símbolo mais importante da Democracia alemã, que o Kaiser Wilhelm I mandara construir em 1884. O incêndio dá-se quatro semanas após a chegada ao poder de um novo personagem: Adolf Hitler. Depois de meses de árdua disputa do poder, o presidente Hindenburg acaba por nomeá-lo chanceler. [O Parlamento é dissolvido e] Hitler espera que as eleições de 5 de Março resultem no reforço da sua posição.
O povo alemão está esgotado e desmoralizado. A depressão económica e os longos anos de disputas políticas atingiram-no profundamente. Hitler promete renovação e resolução de todos os problemas económicos. Aliou-se ao sectores mais conservadores - os chefes do exército e os representantes do sector financeiro acreditam que com um governo nacional-socialista será possível restaurar a sua antiga grandeza e acabar definitivamente com os movimentos políticos da esquerda. 

Sobre o Parlamento, Hitler terá dito que se trata de um "antro de Nathan" que é necessário destruir rapidamente [nota: não consigo entender o texto com toda a certeza, e não encontrei outras citações na internet, mas parece-me que se refere a Nathan, o sábio, personagem humanista e tolerante de uma peça de teatro de Lessing, proibida pelos nazis]. Agora que o edifício está a arder, o recém-nomeado chanceler aparece no local do crime no papel de um horrorizado guardião da calma e da ordem. Goebbels e Göring também estão presentes. 
Göring grita: "Isto é a revolução comunista!", no que é secundado pelos outros políticos. Um historiador comentaria mais tarde "o modo sinistro como os mais importantes dirigentes nazis estavam subjugados pela sua própria propaganda anticomunista". O chefe da Polícia, manda prender um jovem holandês que parecia completamente desnorteado. Chama-se Martinus van der Lubbe, é pedreiro, pertence a um grupo anarquista de esquerda, e será decapitado após um curto processo, no qual confessa que é o autor do incêndio. Nunca se saberá toda a verdade sobre este caso. Os opositores políticos acusam a SA de, com o conhecimento de Göring, ter incendiado o edifício entrando nele por um túnel - mas também eles foram incapazes de apresentar provas da acusação. 

Facto é que o incêndio do Reichstag permitiu aos nazis neutralizar os comunistas antes das eleições de 5 de Março, e reforçar o autoritarismo da governação por recurso a medidas legais. Dão início a uma campanha brutal, com confrontos nos quais morrem muitos comunistas, e são presos os seus dirigentes, tais como Dimitrov (que acabará por ser libertado, por falta de provas).
Este acontecimento permite que Hitler dê o passo decisivo para a sua ditadura sem limites. Pressionado pelos acontecimentos, o velho presidente Hindenburg assina no próprio dia 28 de Fevereiro o Decreto de Emergência para Protecção do Povo e do Estado, que suspende os direitos fundamentais da antiga Constituição: os direitos de protestar, de controlar e de se associar [nota: noutra fonte encontro: liberdade de expressão, liberdade da imprensa, liberdade individual, liberdade de associação, sigilo postal] e permite perseguições, confiscos e censura. Os alemães terão de esperar doze sangrentos anos para começarem a regressar à Democracia. 

***

Curiosamente, ao ver as imagens do Reichstag em chamas lembrei-me do 11 de Setembro. Outro incêndio que acelerou a História. Junto um cartoon, com cujo texto não concordo inteiramente, mas que é importante para nos lembrar que isto não são meras "histórias antigas lá desses alemães". É fundamental conhecermos bem a História, para não nos deixarmos embrulhar nas mesmas armadilhas dos poderosos. 

(foto)

7 comentários:

Conde de Oeiras e Mq de Pombal disse...



Excelente Documentário e magnífica Tradução, muito obrigado!

Algumas notas (secundárias) para eventual discussão:

1ª - não sei se Hitler o sabia (ou se apenas conheceria a peça de Lessing...), mas Nathan, o Profeta, é um personagem bíblico; não conheço a narrativa em pormenor, mas sei que vem referida numa célebre Oratória de Händel - a tal de onde o "outro" (bolas, 'tou com uma "branca") roubou a melodia do hino da Liga dos Campeões... -, cuja letra reza assim: "Zadok, the Priest, and Nathan, the Prophet, annointed Salomon King! And all the People rejoiced...";

2ª - não vejo nenhum paralelo, em termos de relevância histórica, entre o incêndio do Reichstag e o "11 de Setembro" (tirando a cor das chamas...), nem vislumbro de todo onde é que este último "acelerou a História" (só se for a história da morte das vítimas e do Bin Laden...); só serão comparáveis num aspecto circunstancial: é perfeitamente credível que ambos os atentados tenham sido fruto das Administrações nacionais dos respectivos Países, por intermédio dos seus Serviços (super-)Secretos! Um dia certamente o saberemos. Nesse aspecto, adorei o "cartoon"!...

Helena Araújo disse...

Olá,
também me perguntei se este Nathan seria o profeta ou o de Lessing. Mas penso que é o de Lessing: um judeu sábio que advoga a tolerância é mais do que um Hitler podia aguentar...

Quanto ao 11 de Setembro: os ataques foram usados para justificar duas guerras (Afeganistão e Iraque) e um extraordinário ataque às liberdades individuais - o "PATRIOT ACT".

Quando disse que não concordava com tudo no cartoon referia-me exactamente a essa insinuação a haver o dedo dos serviços secretos americanos no ataque. Se não me custa acreditar que foram os nazis quem deitou fogo ao Reichstag, não consigo acreditar que os próprios USA tenham planeado ou sequer deliberadamente facilitado alguma coisa para tornar o 11 de Setembro possível.

Conde de Oeiras e Mq de Pombal disse...

Helena,

não foi certamente o Povo americano que provocou o 11 de Setembro, claro, como também não foi o Povo alemão que incendiou o Reichstag...

Isso não invalida, porém, que não me custe mesmo nada a crer, depois de tudo o que sabemos sobre os procedimentos dos serviços secretos dos E. U. A. noutras situações (Pearl Harbour, assassinato(s) do(s) Kennedy, Guerra do Vietname, Watergate, etc.), que os vários atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001 tenham gozado não apenas da "tolerância" da CIA, ou do FBI (ou de ambos, ou de sectores de algum, ou de ambos), como da própria colaboração empenhada destes Serviços na sua organização e na criação dos alibis e da narrativa mediática subsequente (perfeitamente comparável, aliás, ao mediático "processo" relâmpago do van der Lubbe...).

Não é simplesmente possível conceber que um avião civil tresmalhado possa ir embater no Pentágono (nem sequer pilotado pelo aventureiro que aterrou no Kremlin do Gorbi...); como não é crível que um avião de passageiros enorme e com dois motores Rolls Royce embata no Pentágono e não se aproveite nem um pedaço de osso humano, nem de bagagem, nem de fuselagem, nem sequer uma pecinha dos dois motores para amostra; não é nem pouco mais ou menos provável que dois edifícios mastodônticos, em estrutura porticada de aço, atingidos do meio para cima, sofram um colapso estrutural instantâneo e de alto a baixo, para mais IDÊNTICO, com uma diferença de menos de uma hora; nem é explicável que os destroços dessas implosões (porque só podem ter sido implosões) destruam completamente um edifício da CIA situado três ou quatro quarteirões (intactos) para além do limite do perímetro urbano afectado.

Não viste o "Zeitgeist" e outros documentários, bem elucidativos das dúvidas gigantescas que a narrativa oficial nunca conseguiu explicar? Então deves ver.

E concordo plenamente contigo quando às vezes dizes que há "pecados" históricos que todos julgam exclusivos dos alemães, esses malandros, mas que muitos outros Países ocidentais livres e democráticos também por vezes cometem. Ó, se cometem (alô, Portugal? Daqui fala Irangate...). Apenas o terão feito mais discretamente (até ver)...


Quanto às guerras que o 11 de Setembro precipitou e aos outros efeitos internos, o facto é que de "histórico" têm muito pouco (um parágrafo?) - o Mundo hoje é práticamente o mesmo que teria sido sem o 11 de Setembro (se vires bem, até no Iraque e no Afeganistão nada de "histórico" se alterou...), enquanto que o futuro da Humanidade inteira, após o incêndio do Reichstag, não foi nada mesmo do que poderia ter sido se o Sr. Adolfo Hitler na Alemanha tivesse demcráticamente sido corrido do Poder nas eleições livres seguintes...

Helena Araújo disse...

Sobre as teorias da conspiração: tens aqui um link para um dossier no Spiegel que desmonta esses argumentos um a um. É em alemão, mas com o alemão que sabes e o google translator é possível que fiques com uma ideia.
http://www.spiegel.de/spiegelspecial/a-435547.html

O 11 de Setembro mudou imenso a nossa vida. Por exemplo, o sigilo e o direito à privacidade - o Estado pode recolher e enviar a outros Estados os nossos dados privados. Por causa do medo do terrorismo estamos dispostos a deixar que os Estados controlem mais as nossas vidas. Os EUA inventaram o conceito de guerra preventiva, e levaram-no avante, com o resto do mundo a assistir. O Iraque, que tinha um ditador mas era o único país daquela região onde as mulheres tinham autonomia e eram respeitadas, está a fazer retrocessos civilizacionais de séculos, para além de estar sempre no limiar da guerra civil.

Quanto à diferença entre o que aconteceu no mundo depois de Hitler se ter apoderado do poder em 28 de Fevereiro de 1933, e o que aconteceria se tivesse sido corrido nas eleições seguintes, parece-me que está à vista - mesmo para toda a Humanidade. Foi por causa dessa catástrofe que se começou a falar de genocídio, de direitos humanos, e que se criou a ONU. Duvido até que hoje houvesse uma União Europeia se não tivesse havido aquela guerra.

Cristina Gomes da Silva disse...

Gracias, amiga, pela aula de história. Havia o Cam(e)ilo Lourenço de a ler também, para ver se aprende alguma coisita. Beijitos de 2 de Março

Helena Araújo disse...

Foi apenas uma tradução, Cristina. :)
Mas está um resumo muito interessante. Tem tanto pano para mangas, que era capaz de render dois doutoramentos ao Relvas.
O Camilo Lourenço, coitado, era capaz de olhar para este texto e não entender nada. Textos não puxam carroça... ;-)

Conde de Oeiras e Mq de Pombal disse...



Obrigado pelo Artigo no «Spiegel», que contudo está muito longe de "rebater" quaisquer argumentos, não apresentando mais do que meras teorias explicativas. As dúvidas permanecem intactas, todas, como aliás o próprio Artigo reconhece.

Há sim quem acredite que a teoria oficial é credível e há quem não creia nela, pelo menos até ver provas inequívocas, que não houve, nem nunca haverá, estou certo (porque se as houvesse, seriam de pronto publicadas!).

Também muitos alemães terão acreditado piamente na tese oficial do "pirómano" anarquista van der Lubbe, como muitos americanos acreditam na tese oficial do Lee Oswald e muitos portugueses acreditaram que os "comunas" é que mataram o Humberto Delgado...