22 janeiro 2013

sete pecados mortais




Dizem muito bem do sistema escolar do antigamente, pois dizem, mas eu ainda fiz a quarta classe no tempo da outra senhora e nem isso me impediu de chegar a mais de metade da vida sem conhecer os Sete Pecados Mortais de Brecht/Weill. Conhecia os do catecismo, vá lá, até os aprendi de cor quando tinha seis anos: gula, avareza, ira, luxúria, preguiça, vaidade e qual era o sétimo? ah, a inveja. Não percebia metade das palavras, mas sabia papagueá-las. E ontem, finalmente, descobri-lhes o avesso, nessa extraordinária peça de Bertold Brecht e Kurt Weill, levada a cena por uma Dagmar Manzel que me deixou rendida.

Brecht e Weill disparam em todas as direcções: contra a igreja católica que impõe às pessoas ideais morais que as alienam de si próprias, contra o capitalismo que transforma a pessoa em mercadoria, e contra a exigência moral da família, tão alheia ao sofrimento.

Dagmar Manzel compõe uma Anna I / Anna II magnífica(s): uma Anna que dança e mima sete cenas de descida aos infernos, enquanto outra Anna a tenta convencer de que esse é um caminho de virtude - esta Anna que canta e fala, e tão bem sabe transmitir ao público as tensões da música de Weill. Optou-se por ter o coro fora do palco, o que aumenta ainda mais a distância da família, o seu "falar de cor" quando pressiona a filha e lhe lembra os seus deveres. E incluiu-se um actor mudo: o foco de luz, que persegue a Anna e lhe foge, dialoga com ela ou a acusa.

À saída só me apetecia louvar a inteligência humana - a de alguns humanos - que produziu tal espectáculo.

[Aviso aos berlinenses: esta peça será repetida amanhã, quarta-feira, na Komische Oper. Ainda deve haver bilhetes. Podem tentar comprar os mais baratos e sentar-se nos lugares melhores - ontem havia muitos livres. Eu não disse isto. Nas cadeiras há ecrãs para ler o texto em alemão, inglês, francês ou turco.]

Sem comentários: