03 junho 2012

dia de festa na Filarmonia de Berlim

Na segunda-feira passada a Filarmonia de Berlim abriu as portas ao público. Eu não pude ir (será que já falei do meu velho problema de não dar vazão?) mas o cjs - um amigo, e comentador deste blogue - foi, fez fotografias e contou. Aqui vai o seu relato - com os meus agradecimentos, e as mãos já roxas de tanto as esfregar de satisfação por este momento de qualidade no 2 dedos de conversa.







Cheguei às 14:30 e estive vinte minutos na fila para entrar, porque a lotação era limitada a 4.000 pessoas e já só entrávamos a conta-gotas, consoante o ritmo das saídas.

Fui logo para o Foyer ouvir o resto de "Berliner Philarmoniker spielen Jazz". Adorei! Grandes clássicos intemporais, tocados por músicos que estavam a ter um gozo enorme naquilo e que, em quase todos os temas, nos brindavam com solos, principalmente de sopro.





Felizmente que se esticaram no horário previsto, pelo que, quando acabaram, deu à justa para ir a correr para o Streicherzimmer, ouvir o "Kontrabassisten-Quartett der Berliner Philarmoniker". Mais um show fabuloso, cujo ponto alto foi um medley (aposto que este termo será uma heresia na música clássica, onde terá um equivalente qualquer mais apropriado) que começava e acabava na Cavalaria Rusticana, passando pelo Hino da Alegria. O entusiasmo era tanto, que às tantas já os músicos davam gritos à cowboy e o público batia palmas a compasso.

À saída, fui ver zonas habitualmente vedadas ao público, entre elas a sala dos maestros!





Depois fui aos jardins, que eram a zona mais concorrida, não tanto pela actuação do "Trio des Konservatoriums für turkische Musik", mas porque estava um belo dia e havia tendas a vender Bratwurst, cerveja, bretzel e gelados.

De volta ao interior e no Foyer tinhamos "Trio Alwan spielt arabischen Jazz".





O programa dizia que a Grosser Saal, entre as 16:00 e as 17:30 estava fechada ao público, mas eu, como bom Português, cerca das cinco horas decidi ir lá espreitar. E em boa hora o fiz, pois só voltei a sair de lá às 20:00!
Não só estava a porta aberta, como o Simon Rattle e a Osquesta estavam a ensaiar. Sentei-me na sétima fila do bloco A, em posição central, mas suficientemente desviado para ainda ver o maestro não apenas de costas.

O ensaio durou até às 17:30 e na meia hora seguinte abriram-se as portas e a marabunta invadiu todos os cantinhos disponíveis, havendo pessoas que tentavam ficar de pé, mas que foram devolvidas à proveniência pelos seguranças.

Às 18:00 regressaram, desceu um ecrã gigante sobre o palco e começou uma estreia absoluta na Philharmonie: a orquestra tocava a Carmen enquanto no foyer, 120 jovens (Sasha Waltz & Guests) dançavam uma interpretação da mesma, havendo mesmo alturas em que a osquestra parava de tocar e até os músicos se viravam para o ecrã para acompanhar a performance dos jovens.







Findo o espectáculo, vieram os discursos que precederam o leilão do piano de cauda de Alfred Brendel: o da introdução ao tema e ao homenageado; o do próprio, que disse que estava ali, mais do que uma parte da vida dele, uma parte dele próprio; e uma longa conversa feita pelo Director da Unicef, a favor de quem o leilão revertia, e que a todos tentou sensibilizar, alertar, convencer, arregimentar e levar a contribuir para ajudar as criancinhas da Somália, do Darfur e do Quénia. Veio então o Director da Christie`s amenizar a coisa, dizendo que todos podíamos participar no leilão e quiçá, levar o piano para casa por mil euros, mas que tomássemos bem conta das criancinhas, pois qualquer movimento braçal seria entendido como uma licitação e eles sabiam onde nós morávamos, estavam a filmar tudo e não abriam as portas sem se passar o cheque. Desanuviado o ambiente, começou o leilão propriamente dito, que não durou nem cinco minutos: a partir dos € 50.000 as licitações passaram a ser só entre o comprador final e alguém que estava do outro lado de uma linha telefónica, mas como o cavalheiro presente cobria imediatamente todas as ofertas telefónicas, rapidamente se chegou aos € 80.000 finais.

 

E o grande final foi com uma sandwich de Edvard Grieg em Antonín Dvorák, mas sem direito a standing ovation, que já era tarde e a malta no dia seguinte trabalhava.

Eu, que não tenho problemas desses, ainda fiquei a deambular mais um bocado pela Philharmonie enquanto esta esvaziava, de maneiras que, quando saí, já não havia ninguém a pedir que devolvesse a chapinha que recebi à entrada. De modos que, sendo sabido que eu não percebo uma única palavra de alemão, optei por fazer uma tradução livre de "die Einlasskarte bitte beim Verlassen das Hauses am Ausgang zurückgeben" por "guarda-me religiosamente durante um ano e vais ver que, como recompensa, não precisarás de fazer fila em 2013", pelo que a enfiei logo no cofre assim que regressei a casa.






E pronto, não é o mesmo que ir ao Vaticano, mas também não se pode esperar mais de uma viagem de dez minutos de bicicleta e por este preço.






ADENDA (a partir de um comentário do cjs, que bem merece vir completar o texto):


Já que se tornou um post, importa realçar que o mais agradável e interessante de tudo, foi ver todos aqueles fantásticos músicos ali disponíveis, descontraídos e informais, em perfeita comunhão com os visitantes. Desde a "farda", ao gozo evidente com que tocavam - acabando sempre as actuações a rirem-se e a abraçarem-se, até à disponibilidade para interagir connosco, tudo contribuiu para criar uma empatia extraordinária.

Eis o exemplo perfeito, daquele que foi o momento mais original e delicioso de todo o dia: numa das pausas da orquestra, um bebé começou a chorar. O primeiro violino virou-se para o público com um sorriso cúmplice e começou a tocar - muito baixinho - a mais famosa e internacional das canções de embalar. E o bebé calou-se...

15 comentários:

Paulo disse...

Obrigado ao cjs. Reportou tudo a preceito. Grande festa!

Lucy disse...

Ah! mas "nós" também vamos cá ter a Filarmonia de Berlim com Simon Rattle, em novembro, na Gulbenkian... Quer dizer, vão lá estar mas o preço dos bilhetes não vai permitir o "nós"...

Helena Araújo disse...

Lucy,
às vezes conseguem-se milagres. Por exemplo: autorização para assistir ao ensaio geral da orquestra. Por exemplo: levar lá uma turma de alunos de música não-sei-quê. É questão de preparar isso com tempo, e resulta.
Se precisarem de uma mãozinha aqui deste lado, digam.

cjs disse...

Já que se tornou um post, importa realçar que o mais agradável e interessante de tudo, foi ver todos aqueles fantásticos músicos ali disponíveis, descontraídos e informais, em perfeita comunhão com os visitantes. Desde a "farda", ao gozo evidente com que tocavam - acabando sempre as actuações a rirem-se e a abraçarem-se, até à disponibilidade para interagir connosco, tudo contribuiu para criar uma empatia extraordinária.

Eis o exemplo perfeito, daquele que foi o momento mais original e delicioso de todo o dia: numa das pausas da orquestra, um bebé começou a chorar. O primeiro violino virou-se para o público com um sorriso cúmplice e começou a tocar - muito baixinho - a mais famosa e internacional das canções de embalar. E o bebé calou-se...

Paulo, terias gostado. Um abraço.

Paulo disse...

Decerto, cjs. Já tenho saudades.
Um abraço.

Rita Maria disse...

Temos blogger, cjs ao poder!

(que saudades, e que post fantástico!)

Helena Araújo disse...

Estou com a Rita, e não abro!

(e viste, Rita, que também faz fotografias? viste que o sol se pôs a jeito no Tiergarten, só para ele? o homem é poderooooooso, cuidado lá com ele! Fazemos um brain storming para inventar um nome giro para o novo blogue dele?)

cjs disse...

Pois, pois, suas bajuladoras descaradas!
Cá para mim, já descobriram que saiu o novo Barca Velha 2004...

Mas se para o ano a Helena estiver ocupada a receber o Papa, eu vou lá com o meu cartão de cliente frequente e conto-vos tudo.

Paulo disse...

Boa.

Helena Araújo disse...

Ai o Barca Velha já saiu!??? Tem graça, olha que não fazia ideia...

(chiu, difarça, Rita, que ele já percebeu tudo. Só ainda não reparou que a Inês também está metida na tramóia. Não digas nada, chiu! E ajuda-me aqui a disfarçar.)

Helena Araújo disse...

cjs,
se no próximo ano eu estiver ocupada com os alazeres do costume, tu vai e conta na Berlinda! (que eu ainda vou arranjar um trinta-e-um para aqueles lados se açambarco o melhor cronista berlinense)

Helena Araújo disse...

(e quantas garrafinhas compraste?)
(hihihi)

(o que me apetecia agora estarmos na minha cozinha a rir destes disparates e doutros com a Rita, enquanto ela dormita em pé a fritar pataniscas)

cjs disse...

. O que é que a Philharmonie tem a ver com a Lusofonia (Berlinda)?
. Eu digo "ocupada a receber o Papa" e tu respondes "ocupada com os aFazeres do costume": ÉS A MAIOR!
. E que tal encontrarmo-nos com a Rita e o Barca Velha, em Lisboa, daqui a 3 semanas?
E já agora, irmos juntos amanhã ao Dia de Portugal, da TAP e da Comunidade Portuguesa?

Helena Araújo disse...

. Tudo tem a ver com tudo quando a alma não é pequena. A lusofonia também é uma lusovistoria. Secção "Olhares".

. eu disse "com os aLazeres do costume" - era isso que querias escrever? (mas aceito o elogio na mesma, obrigada, obrigada)
. Isso era em que dia de Junho? Cheira-me que é na altura em que estaremos a apanhar iodo na praia da Amorosa, e a ligar o fio terra ao areal. (mas obrigada pela lembrança) (e nem fazes anos nem nada!)
. Como vais? O Joachim tem que dar uma aula, vai sair muito em cima da hora. Eu estava a pensar ir indo antes. Tu tens um plano?

cjs disse...

Tenho, tenho um plano secreto: combinarmos por e-mail. Até já.